Balanço Financeiro da CBB - Minha Análise: 'Muita dívida e nenhum projeto'
Você leu aqui na segunda-feira um breve histórico das contas da Confederação Brasileira. Na terça-feira, detalhes do balanço financeiro de 2013 em si (aqui). O sangue vermelho de dívida, como vocês devem ter percebido, corre nas veias da turma da Avenida Rio Branco com muito, muito gosto. Então vamos à minha análise econômica de Carlos Nunes e companhia:
1) Mais do que as contas, me espanta um pouco a maneira como as coisas têm sido "administradas" na Confederação Brasileira. Como o Professor Scarpin, que estará por aqui amanhã dissecando o balanço de forma brilhante, costuma dizer: o problema não é ter dívida. Empresas grandes, imensas, possuem dívidas. O problema é você ter muita dívida, poucos ativos, zero de alternativa para sair do buraco e nenhum projeto de basquete. A grande dúvida é: como a CBB gastou, em 2013, R$ 28,3 milhões? Isso pra mim é inexplicável. Diria que bastante inexplicável.
2) Não houve 300 clínicas para técnicos e jogadores pelo país, não houve investimento maciço em capacitação de técnicos, não houve aumento excessivo de competições nacionais de base (a Liga de Desenvolvimento para jovens, sonho antigo de quem acompanha o esporte no país, saiu, mas via Liga Nacional, que tem trabalhado MUITO sério desde sua fundação), não houve 415 camps para jogadores em todas as regiões do Brasil, não houve derramamento de grana nas Federações, para que elas investissem na modalidade localmente, não houve grandes peças de comunicação e/ou ações de marketing para popularizar a modalidade. Alguém consegue, minimamente, explicar como estes R$ 28,3 milhões (mais de R$ 2 milhões/mês, portanto) foram utilizados? Insisto: isso é MUITO inexplicável.
3) Recentemente o presidente Carlos Nunes deu uma entrevista (aqui) ao Estadão. Nela, ele disse: "Nós estamos cientes das nossas dificuldades, das dívidas, mas temos administrado tudo isso. Não fizemos mais dívidas e o valor diminuiu. Não sanamos, mas diminuiu. O departamento financeiro da CBB está trabalhado no balanço, que deve sair em breve porque temos assembleia no dia 26 de março, mas eles já me acenaram que eu terei uma surpresa agradável. Com o aporte financeiro de um novo parceiro, com certeza, ficaremos tranquilos. A gestão hoje da CBB é toda profissional. Uma coisa é administrar com dinheiro, outra é sem. E temos sabido administrar sem dinheiro". Como se pode ver, no Balanço Financeiro da CBB, a entidade fechou o ano com dívida de quase R$ 900 mil e o valor da dívida aumentou em R$ 700 mil. Ou o presidente Nunes gosta de contar piadas ou ele precisa de ajuda para analisar as contas.
4) Quando Nunes afirma que "uma coisa é administrar com dinheiro, outra é sem", o que ele pode nos contar sobre o aumento das despesas? A linha de despesa da CBB subiu de R$ 25,8 milhões em 2012 para R$ 28,3 milhões em 2013. Abrindo um pouco da linha de despesa consegue-se verificar algo BEM interessante: a entidade máxima do basquete brasileiro conseguiu aumentar de R$ 3,1 para R$ 3,7 milhões seus custos com pessoal (gente, pessoas, profissionais que receberam grana da entidade). Tipo: mesmo com dívidas de R$ 8,8 milhões em 2012 a Confederação seguiu contratando. Não é formidável? Uma reflexão: se a entidade máxima estava sem dinheiro (e não estava, sabemos desde sempre), como Nunes diz (equivocadamente), não seria recomendável encurtar as despesas? Pelo menos aqui em casa funciona assim: se entra menos dinheiro, sai menos dinheiro também. Sobre a parte em que ele diz "A gestão da CBB hoje é toda profissional" eu juro que não vou comentar, ok.
5) Há um outro ponto que me chama muita atenção. Na semana passada, Edio Alves (foto à direita), dirigente da CBB, afirmou o seguinte ao ótimo site AHE (aqui): "A receita da CBB não aumentou, muito pelo contrário. Ela foi muito reduzida em relação ao ano anterior. Há uma confusão muito grande quando colocamos na linha de receita o dinheiro que vem do governo. A receita caiu de 75% de recursos próprios em 2012 para 25%. Na verdade, houve uma redução violenta na receita com a saída da Eletrobrás". Há outra grandíssima 'confusão', para usar um termo que Édio usou, nisso também. A receita da CBB não diminuiu, como os números estão aí para provar. A receita da CBB aumentou de R$ 25,7 para R$ 27,4 milhões (acréscimo de R$ 1,7mi). A questão toda é que mais da metade deste bolo (no mínimo R$ 14,8 milhões – veja mais aqui) veio do Ministério do Esporte. O dinheiro, portanto, só mudou de linha (de recurso próprio para federal). Que problema há nisso? Nenhum, né. Insisto neste ponto: é grana, é dinheiro, é feito para usar. Ele só está "carimbado", e é necessário usá-lo em projetos previamente analisados pelo Ministério. Se não queria o dinheiro, ou se não sabe como usá-lo, era mais recomendável a entidade máxima não ter aceito o aporte do ME. Só lembrando: é verba pública, federal. Uma pergunta: como será que o Ministério analisa uma declaração assim? Fico curioso…
6) Sobre a grana investida pelo Ministério do Esporte, um detalhe interessante: será que o Ministério, entidade federal, sabe que a CBB deve R$ 1,9mi ao INSS, também da esfera federal? Pega bem a Secretaria de Alto Rendimento despejar tanta grana assim em uma entidade que não consegue pagar ao Instituto Nacional de Seguro Social? Não me parece interessante isso…
7) Outro ponto merece ser levantado. Como administra bizarramente mal a grana, a CBB pagou, em 2013, mais de R$ 2,5 milhões em juros bancários devido aos seus inúmeros empréstimos. Empréstimos estes contraídos em Itau (que inclusive processou a entidade máxima, como divulguei aqui com exclusividade) e Bradesco, que PATROCINA a Confederação. Ou seja: o banco que coloca dinheiro na entidade máxima vê a entidade máxima pedindo dinheiro emprestado ao próprio banco. Para o mundo que eu quero descer…
8) O rombo pode ser ainda maior caso a Champion, que pede R$ 4,1 milhões na Justiça, vencer o processo. Caso ganhe, será uma catástrofe de proporções gigantescas nas contas da CBB.
9) No Balanço Financeiro consta verba de quase R$ 600 mil reais em Nacionais Femininos por dois anos seguidos. Fui analisar o projeto, e era para o Nacional de 2010 (veja mais aqui). Não consigo entender muito bem como o valor segue aparecendo tanto no balanço de 2012 quanto no de 2013. Alguma explicação plausível?
A conclusão é bem óbvia, né, pessoal: a CBB está quebrada, falida, em situação de insolvência total – insolvência moral, financeira, administrativa e de ideias. O principal ponto é: existe MUITA grana (principalmente pública) para os dirigentes da Avenida Rio Branco administrar. Mas desde 2010 (quando comecei a analisar os Balanços Financeiros) é muito claro que eles não têm sabido muito bem o que fazer com tanta receita. O basquete está sendo administrado de maneira, com todo o respeito, muito, muito ruim, amadora (para usar um termo contrário ao 'profissional' descrito por Nunes). Tão ruim que (isso vocês verão amanhã), os Auditores, que deveriam APENAS verificar os números, colocam um alerta para a Confederação (algo raríssimo).
Dizer, portanto, que não tem dinheiro é uma inverdade terrível, uma conversa para boi dormir (e impressiona-me que grandíssima parte da imprensa não sufoque o presidente com indagações). São mais de R$ 100 milhões de receita nos últimos 5 anos sem NENHUM projeto de basquete no país, sem nenhum planejamento para que a modalidade volte a ser o que já foi. Insisto neste item: não é falta de grana, é falta de saber o que fazer com ela (e como também).
Mais do que isso. Impressiona, tanto quanto a falta de habilidade administrativa, organizacional e financeira da CBB, a desfaçatez do Carlos Nunes, que afirma que "não fizemos mais dívidas e o valor (das dívidas) diminuiu". Que "surpresa agradável" é essa que o senhor afirma que teria do departamento financeiro, presidente? Nunca tive uma festa surpresa na vida, mas confesso que se tiver espero que os organizadores utilizem um conceito diferente do termo 'surpresa' que você utilizou. Acho bem prudente.
Por fim, quatro pontos para reflexão: a) Federações e Associação de Atletas, que aprovaram as contas (mais aqui), têm noção que chancelaram este escárnio? Eles dormem tranquilos quanto a isso?; b) O Ministério do Esporte, que despejou MUITA grana na CBB de uns tempos pra cá, continuará colocando dinheiro (PÚBLICO) em uma entidade que não têm noção alguma de como administrá-lo? O Ministério não irá cobrar a tal "gestão profissional" que exigiu meses atrás?; c) Ministério Público e Tribunal de Contas não deveriam dar uma olhadinha nestas contas com mais atenção? Há, para dizer o mínimo, péssimo uso de dinheiro (em grande parte público) dentro da Confederação Brasileira de Basketball; e d) Como a CBB fará para sair do buraco financeiro em que se meteu? Como ela fará para sanar os quase R$ 10 milhões de dívida nos próximos anos?
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