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Bala na Cesta

Entendendo a surpreendente troca que levou Kristaps Porzingis do Knicks ao Mavs

Fábio Balassiano

01/02/2019 05h44

No Draft de 2015 a torcida do New York Knicks recepcionou assim a quarta escolha daquela noite:

Naquela que provavelmente foi a única ação boa da gestão Phil Jackson, então gerente-geral do Knicks, a franquia selecionou o letão Kristaps Porzingis para ser o parceiro ideal de Carmelo Anthony. Porzingis chegou com uma desconfiança incrível, mas aos poucos reverteu as vaias em aplausos graças ao seu talento e ao seu carisma. Tornou-se querido por crianças e também pelos mais críticos jornalistas locais (um abração, Stephen A. Smith…). Foram 14 pontos de média no primeiro ano, 18 no segundo e 22 na temporada passada, quando se lesionou com gravidade no joelho.

Fora de todo campeonato até agora para se recuperar, foi com estranheza que comecei a ler os rumores de uma possível troca dele no começo da tarde de ontem porque "Porzingis estaria insatisfeito com os rumos da franquia", de acordo com o renomado Marc Stein, do New York Times. O letão, que NUNCA foi All-Star, que não tem 25 anos na cara, fez beiço. A reunião em que ele reclamou foi na quarta-feira. Ontem à tarde a franquia da Big Apple agiu: o trocou para o Dallas Mavs (Dallas Mavs com quem havia jogado na noite de… quarta-feira). O pacote completo ficou assim:

Knicks envia: Porzingis, Tim Hardaway Jr., Trey Burke (contrato expirante) e Courtney Lee
Dallas envia: Dennis Smith Jr., dois picks de primeiro round e os expirantes de DeAndre Jordan e Wes Matthews (ambos devem ser cortados e disponíveis no mercado em muito breve para equipes de playoff…)

Vamos tentar entender um pouco disso por cada um dos lados?

Pelo lado do Dallas -> Mais do que a aquisição de um ótimo jogador, que anunciou que ficará no time já na próxima temporada, tornando-se agente-livre irrestrito em 2020, a franquia do Texas deixou um belo recado às demais peças do elenco: "O time é de Luka Doncic e quem mexer com ele estará no olho da rua". As três gracinhas que foram despachadas sem dó (Matthews, DeAndre e Smith Jr.) foram os que boicotaram a jovem estrela eslovena do Mavs e fizeram com que o sinal de alerta fosse ligado internamente. Ninguém quer ver a sua futura estrela rodeada de tontos, e então os texanos optaram por se livrar destes (tontos e malas) rapidamente. Sensacional. Eu faria o mesmo. Que sirva de lição para o trio (de tontos e malas), diminuindo seus respectivos egos e sobretudo aumentando o respeito por quem chega de longe (da Europa) e que pode, sim, jogar mais bola que eles (no caso, mais que os três juntos…).

O Dallas, então, encontrou um bom negócio quando coloca lado a lado Doncic e Porzingis, mas ao mesmo tempo pega contratos não tão bons assim (Hardaway Jr., com US$ 36mi nos próximos dois anos, e Lee, com US$ 12 mi na próxima temporada), embora administráveis já que o de Doncic ainda estará na escala de calouro até 2022, e desperdiça dois picks de Draft com um cara, o ala letão, que no final das contas pode ficar apenas um ano por lá.

O Mavs conta com a evolução monstruosa de Doncic (20 pontos de média em seu ano de calouro) e com o fato de Dirk Nowitzki ser um dos ídolos de Porzingis para renovar com o letão por um longo período já neste verão ou em 2020.

Um detalhe que mostra bem como a NBA é profissional e liga ZERO pra sentimentos é que Dennis Smith Jr. foi escolhido pela franquia ano passado na nona posição (a oitava escolha, aliás, foi do Knicks, que deixou Smith passar pra selecionar o insosso Frank Ntilikina, que mal joga por lá aliás). O simpático Dennis não gostou quando Doncic veio, reclamou uma vez, se ausentou dos jogos no começo do mês de janeiro com outro beiço e logo em seguida foi despachado. DeAndre Jordan, anos atrás, fez que ia assinar com o Dallas como agente-livre, avisou a franquia disso, se mandou para o Los Angeles Clippers deixando a TODOS no Texas irritados e nessa temporada, aí sim, fechou com o Mavs. O que o Mavs fez depois de SEIS meses de conseguir, enfim, o seu pivô sonhado anos antes? Trocou-o sem a menor piedade. Você quer profissionalismo até a última gota? É assim na NBA.

No final das contas, é um movimento que eu sinceramente gostei. Trazer uma possível estrela (Porzingis) para se juntar a uma potencialmente estrela (Doncic) e aí sim montar o elenco ao redor dessas duas me parece interessante e com ótimas chances de encaixe técnico e tático (e duas peças europeias, o que não deixa de ser diferente). Caso consiga convencer Dirk Nowitzki a ficar na franquia por mais um ano, mesmo que seja apenas como uma espécie de orientador dos dois jovens astros, o cenário melhora ainda mais – não só em termos de desenvolvimento, mas em unidade de vestiário e em chance de convencer os dois a ficar em Dallas por muito, muito tempo.

Pelo lado do Knicks -> Ficou muito óbvio o que o Knicks fez. Limpou a sua folha de salário COMPLETAMENTE e deixou o espaço livre para, no verão deste ano, ir com tudo em cima de agentes-livres que estarão dando sopa. Sobretudo depois de Anthony Davis dizer que prefere jogar no Lakers, Steve Mills (foto abaixo), o gerente-geral da Big Apple, mandou brasa na famosa limpeza salarial. No cenário de agora, a franquia de Nova Iorque tem a chance de contratar dois jogadores com contratos máximos. Estão nessa situação Kawhi Leonard, Kevin Durant, Kyrie Irving, Nikola Vucevic, Klay Thompson, Tobias Harris e essa lista toda aqui.

Além disso, o Knicks fica cada vez mais "forte" pra ter o primeiro pick (ou algum dos cinco, seis primeiros picks) do próximo Draft. Com a pior campanha da NBA na temporada atual (10 vitórias em 50 jogos), o cenário desejado é que dois grandes jogadores sejam contratados no mercado e em seguida sejam cercados com uma fera do Draft.

Eu só não consigo entender que confiança é essa de Mills, visto que os dirigentes de Nova Iorque não conseguem trazer grandes estrelas no mercado de agentes-livres há tempos (Amare Stoudemire, há mais de uma década, foi o último?). A franquia, que tampouco acerta a mão nos Drafts com frequência, deixou de ser atraente para os grandes jogadores a partir do momento em que se tornou um pandemônio organizacional. Nenhuma estrela já consagrada na liga parece querer trocar a segurança de brigar fundo em playoff por um lugar, embora muito midiático e com os holofotes absurdamente gigantescos, zoneado e sem perspectiva de grandes vitórias. Em um mundo globalizado, a diferença entre o quanto você é visto jogando em um disfuncional Knicks e um organizado Bucks é bem pequena – só ver o quanto de sucesso está fazendo o Giannis, o Greek Freak, nesta temporada e nas anteriores também. Não custa lembrar que em 2010 o Knicks fez a mesma coisa pra tentar assinar com LeBron James e Chris Bosh. A dupla foi pra Flórida e o Knicks ficou realmente sem nada.

Meu medo, vendo de longe, é a franquia buscar Kevin Durant e Kyrie Irving, por exemplo, não conseguir nenhum dos dois e fazer contratações, como fez recentemente, de jogadores medianos com salários altíssimos (o famoso pagar acima do que vale). Em julho pode acontecer do Knicks ter perdido um ídolo local, como Porzingis se tornou, e acordar apenas com um pick alto de Draft tendo só atleta razoável em volta.

No fim das contas, eu consigo entender bem os dois movimentos, embora ache o do Knicks um absurdo de arriscado. Um absurdo MESMO. Gigantesco. E vocês, o que acharam?

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