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Bala na Cesta

Apesar da vitória, o sinal amarelo no Pinheiros

Fábio Balassiano

05/11/2015 01h15

ecp1No dia 8 de agosto escrevi aqui que o Pinheiros entraria em uma nova fase de sua história no NBB. Sem o aporte financeiro da Sky, o tradicional clube de São Paulo voltaria "às origens", ou seja, investiria na base e daria tempo de quadra aos garotos formados em sua ótima divisão de base. Por isso ontem à noite voltei pra casa animado. Era a hora da estreia da molecada contra o (também jovem elenco do) Minas e que colocaria frente a frente dois dos melhores trabalhos de formação do país.

ecp3Pelo time mineiro, o técnico Cristiano Grama (há anos na base) colocou pra jogar Henrique Coelho (foto), Danilo Fuzaro e Léo Demétrio (todos com pelo menos 20 minutos na estreia desta quarta-feira). Os jogadores com menos de 23 anos somaram 84 minutos, 42% dos 200 disponíveis. Um número expressivo e que mostra qual filosofia será adotada pelo clube de Belo Horizonte nesta temporada (algo que já acontecera em 2014/2015 com Demétrius também). É bacana acompanhar um time recheado de jovens assim.

ecp4Pelo lado pinheirense não foi nada disso que aconteceu apesar da boa vitória por 75-63. O trio de jovens formado por Georginho, Lucas Dias e Humberto (foto), cantado em verso e prosa como um dos mais promissores do país, teve módicos 45 minutos (somado). Pior do que isso: além de Holloway, ala norte-americano autor de 18 pontos em 30 minutos, assumiram o protagonismo da equipe o também recém-chegado armador Corderro Bennett com 17 pontos em 26 minutos (ex-América de São José do Rio Preto e de 27 anos), o pivô Renan (25 anos), o que mais jogou com 34 minutos, Arthur (23 e 19 minutos) e Andrezão (24 anos e 14 minutos em quadra). Lucas Dias, mesmo indo muito bem com 15 pontos e cinco rebotes, teve apenas 22 minutos…

ecp2E aí eu não entendi nada. Uma coisa, ao meu ver, é mesclar jovens peças a jogadores mais experientes, fazendo com que os garotos sintam menos a pressão de uma competição adulta como é o NBB. A outra é relegá-los novamente a um espaço diminuto na rotação de uma equipe que, com orçamento dito enxuto, não chegará a lugar algum com estes veteranos. É o famoso meio do caminho do meio – não abre tempo de quadra pros atletas formados na base e tampouco vai longe no torneio porque os mais velhos não são tão bons assim. Afinal de contas, qual era a filosofia do Pinheiros? Não era investir na molecada? O que mudou de dois, três meses pra cá?

trioecpCabe mais questionamento, aliás. Qual o objetivo disso? Quando Georginho, Wesley, Lucas Dias e Humberto irão jogar? Será que eles não merecem uma chance para ao menos serem testados e, aí sim, avaliados realmente? O que o clube está fazendo para DESENVOLVÊ-LOS? Está realizando trabalhos específicos com Lucas para tirar seu vício de basear seu jogo ofensivo apenas nas bolas de três pontos? Como está a evolução física de Georginho, cotado este ano para entrar no Draft da NBA inclusive? E Humberto, que depois de aparecer muito bem duas temporadas atrás na Liga das Américas, será que não crescerá mais?

felicioQuerem mais perguntas? Então vamos lá, porque creio que vale. Quando o exemplo de Cristiano Felício, reserva do Flamengo e hoje na NBA, será aprendido por aqui? Onde está exatamente o nosso problema? Nos técnicos, que muitas vezes não têm coragem de colocar os jovens por medo de os garotos errarem e eles (treinadores) perderem partidas (e consequentemente seus empregos)? Nos clubes como um todo, que não possuem a menor aptidão para desenvolver, lapidar, transformar esses talentos que aparecem em atletas melhores? Nos dirigentes, que pensam apenas no presente, em vencer jogos, e não no futuro? Nos atletas, que se acomodam em não "chutar a porta" para entrar na elite do esporte rápido? No conjunto disso tudo? Confesso não saber responder. No caso do Pinheiros, se o negócio é investir nos mais velhos (que não levar a equipe a lugar algum), qual o sentido de ter uma formação tão forte assim? Não é, no mínimo, desperdício de dinheiro (times de base custam muito caro…) e um contrassenso?

fiba1Recentemente a FIBA divulgou um estudo extenso sobre o esporte. Nele está lá para quem quiser ver (clique na imagem para ampliar): no Brasil, apesar de 24,7% do elenco estar preenchido com jovens abaixo de 21 anos, esses garotos atuaram, na média, em 3,8 minutos por jogo na temporada 2014/2015 do NBB . A média mundial nas 16 ligas estudadas está 18,8% de Sub-21 e em 5,3 minutos/jogo. Dos 10 primeiros times que mais utilizaram os garotos, não há NENHUM brasileiro (o décimo, o polonês Prokom Trefl Sopot, deu 13,8'/jogo aos garotos). Pouco animador, não?

Este texto termina com muito mais perguntas do que com conclusões. São indagações que, creio, devam ser respondidas não pelo Pinheiros, que não está sozinho neste problema de utilização de jovens no Brasil, mas sim por toda Liga Nacional e pelo basquete brasileiro de forma mais ampla. Que isso fique bem claro: este não é um problema (ou uma questão) de um outro clube, mas sim da modalidade como um todo. O tema, creio, merece ser refletido em todas as esferas, encontrando a melhor solução possível o quanto antes.

duvida1Vale lembrar, aliás, que uma das melhores gerações do país (esta de Nenê, Varejão, Tiago, Leandrinho, Huertas etc.) deve sair de cena da equipe nacional exatamente daqui a um ano, quando acabar as Olimpíadas. Não sei se as pessoas ficam atentas a isso, mas a sustentabilidade (e a vitalidade) do basquete brasileiro só será enxergada quando os jovens tiverem espaço e notoriedade nos times de cima, algo que não vemos nos dias atuais.

Será que não vale repensar um pouco o modelo atual? Será mesmo que não vale parar para analisar o que está acontecendo com essa molecada que, via de regra, sai do juvenil e quase nunca tem espaço nos times profissionais? Em cinco anos, quão bom o produto NBB será se hoje 90% dos que brilham na competição têm mais de 30 anos (Giovannoni, Machado, Marquinhos, Shamell, Alex, Nezinho etc.)? Quantos jovens com menos de 25 anos brilham atualmente no NBB com regularidade? Ricardo Fischer, Leo Meindl, Henrique Coelho, quem mais?

caminhoSão questões que, creio eu, deveriam ser pensadas por quem dirige e comanda no basquete daqui, né? Da CBB sabemos que não sairá nada mesmo, mas será que a turma da Liga Nacional não poderia entrar nessa? Por enquanto eu não vejo nenhum movimento (nem o de ideias) para mudar o panorama. Se nem no campo da discussão do problema a modalidade está, quanto tempo demorará para colocar algum plano de mudança em prática? O cenário, pouco animador no presente, é bem preocupante para o futuro.

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