Topo

Argentina, Brasil, um time que se nega a perder e outro que não soube ganhar

Fábio Balassiano

14/08/2016 02h01

Nesta altura dos acontecimentos você já sabe que neste sábado houve um dos melhores e mais emocionantes jogos de basquete da história da Olimpíada. Brasil e Argentina deixaram a alma na Arena Carioca I, foram a duas prorrogações, tiveram muitas chances de vencer, desperdiçaram muitas chances de ganhar e no final os platenses ficaram com a vitória por 111-107.

Nos outros jogos do dia a Espanha massacrou a Lituânia por 50 pontos e a Nigéria superou a Croácia. Com isso, ao Brasil, que agora tem decepcionantes 1-3 na Olimpíada do Rio de Janeiro, só resta vencer a Nigéria na segunda-feira às 14h15 e torcer para a Espanha PERDER da Argentina a partir das 19h para avançar às quartas-de-final, onde enfrentaria provavelmente os EUA (ou seja, eliminação batendo na janela já…). Croácia e Lituânia medem forças às 22h30 no último jogo da fase de classificação No final do texto coloco todos os cenários possíveis para a seleção de Rubén Magnano.

Sobre o jogo em si alguns pontos importantes:

1) Seria leviano dizer que o Brasil jogou mal. Não jogou mal. O Brasil fez uma belíssima partida. Defendeu bem em boa parte do duelo, atacou com consistência no garrafão e, embora com muitas dificuldades no jogo de cinco contra cinco de perímetro, conseguiu arremessos equilibrados. Se não foi um primor de execução, foi bem nas leituras de jogo em boa parte do embate.

2) Para variar o Brasil começou mal (como ocorreu contra Lituânia e Croácia também), correu atrás da virada, virou o jogo e teve muitas chances pra ganhar. Vencia de oito pontos a três minutos do final do tempo regulamentar. Vencia de seis a três minutos e de 4 a 90 segundos do final da primeira prorrogação. Não cometeu falta no final do tempo normal quando tinha três pontos de vantagem, permitindo que Manu Ginóbili, primeiro, e depois Andres Nocioni tentassem empatar a partida (o segundo conseguiu). Jogar pro lado psicológico é muito fácil, embora verdadeiro. Mas a verdade, a verdade mesmo, é que o basquete é um jogo de detalhes. E todos os detalhes são treinados. Desde os começos até os finais de jogos. E o Brasil tem se mostrado pouco preparado tanto para iniciar bem quanto para finalizar as partidas. Teve chance de virar contra Lituânia e Croácia e não conseguiu. Precisou matar a partida contra a Argentina e não foi feliz. Isso não é só mental. Faz parte do bom treinamento (ou da falta dele).

3) Acho que o segundo ponto é o mais emblemático de tudo o que eu vi no sábado. A Argentina jogou 30 minutos entre o segundo e o último períodos atrás do placar. Tinha dificuldades imensas para conter Nenê (brilhante com 24 pontos e castigando a Luis Scola), Ginóbili e o próprio Scola estavam em tarde ruim (para os padrões deles), convertendo apenas 27 pontos (somados) e em vários momentos do jogo parecia presa fácil perto da cesta. Mesmo com tudo isso (ou contra tudo isso) a equipe de Sergio Hernandez não desistiu em nenhum segundo. Correu, correu, correu e negava-se a entregar os pontos. Do outro lado havia uma equipe que não sabia como fechar o jogo. No encontro do rio com o mar, a equipe que se negava a perder teve uma janela para vencer. E a equipe que não soube fechar o jogo teve uma janela para perder. Quem estava para perder venceu. Quem estava para vencer perdeu. Nos EUA há um ditado muito comum: "Times bons sempre encontram formas de vencer. E times não tão bons sempre encontram formas de deixar de vencer". Foi o que aconteceu no sábado. A Argentina tem um time muito bom. O Brasil tem jogadores muito bons, mas não um time acima da média. Fiquei extremamente inconformado, incomodado, chateado mesmo, não com a derrota, mas sim em como ela (a derrota) veio – cruel e recheada de erros brasileiros.

4) Ainda sobre o jogo em si, quero chamar a atenção para a partida extraordinária de Facunco Campazzo. O armador baixinho dos hermanos terminou o primeiro tempo com 2 míseros pontos. Fechou o jogo com 33 e 11 assistências. "Só" isso. Quero dizer a vocês que Campazzo não é protagonista em seu clube (era do Real Madrid, ficava no banco, foi emprestado ao Murcia e mesmo lá não era o "dono" do time), nunca foi protagonista na seleção (papel de Scola, Nocioni e Ginóbili principalmente) e em seus três primeiros jogos nesta Olimpíada tinha SOMADO 39 pontos (seis a mais do que ele conseguiu neste sábado contra o Brasil). Foi a melhor partida da vida dele com a camisa da seleção. Foi a partida em que ele teve mais liberdade para fazer seus drives em direção a cesta e foi a partida em que NINGUÉM o incomodou jogando perto da cesta e explorando a sua estatura (outro erro crasso brasileiro).

5) Que jogador extraordinário é Andres Nocioni. Sempre admirei bastante a sua luta, a sua entrega em quadra, mas neste sábado ele esteve soberbo. Primeiro ao explorar o desequilíbrio na marcação quando ele caiu com Nenê (mais alto e mais lento) e depois com Marquinhos (pouco hábil na defesa), anotando seguidas bolas de três no primeiro período. Depois por ter o sangue frio de, mesmo quente, segurar a onda para dar protagonismo a Campazzo, que enfileirava a defesa brasileira com infiltrações perfeitas. Por fim, cerebral para matar uma bola no perímetro mesmo sendo quase derrubado por Guilherme Giovannoni, levando o jogo à prorrogação. Fechou o jogo com 37 pontos e 11 rebotes, uma atuação magnífica de um atleta incrível.

6) O que dizer de Nenê? Fez a sua melhor partida com a camisa da seleção brasileira (24 pontos em 11/17 nos arremessos e 11 rebotes), usou e abusou de Luis Scola no garrafão (algo que a gente desejava que tivesse acontecido pelo menos umas 750 vezes contra o hermano nos últimos 15 anos) e mostrou-se em um estado físico brilhante. Foi muito bem também na entrevista pós-jogo à TV Globo quando afirmou que não faltou vontade, mas sim sobrou inteligência ao time argentino para sair vencedor do duelo de sábado. O basquete, como Nenê sabe bem, é uma partida em que a bola é arremessada com as mãos. Mas que se vence com a cabeça. E os argentinos mais uma vez foram muito superiores – não arremessando, mas pensando o jogo.

Queria deixar pra lá, mas acho importante escrever sobre Rubén Magnano, o técnico da seleção brasileira. Não falarei agora sobre o trabalho completo de Magnano, pois escreverei um texto inteiro sobre isso proximamente (embora já o tenha iniciado no Facebook). Gostaria, neste momento, de listar, pela ordem dos acontecimentos, os erros crassos que ele cometeu em uma partida decisiva como a deste sábado:

1) Começou o jogo com Nenê marcando a Andres Nocioni, algo inadmissível (foram duas bolas de três logo de cara para o número 13 platense). Tentou corrigir colocando Marquinhos logo depois. Era tarde. Nocioni já estava pegando fogo naquela altura dos acontecimentos.

2) Magnano pediu dois tempos seguidos logo no primeiro quarto. Se o Brasil não fosse bem no segundo período, não teria como brecar o jogo.

3) No segundo período, o melhor do Brasil em toda partida (33-16, um baile de bola), a formação que deu certo tinha Raulzinho, Benite, Alex, Giovannoni e Nenê. Benite fez 13 pontos. Giovannoni, 10. No basquete não há time titular. Não há time ideal. Há time que se encaixa melhor em uma determinada partida, contra um determinado rival. Contra aquela Argentina, estes cinco atletas eram os que estavam se dando melhor. Como volta Magnano para o segundo tempo? Com Huertas (no lugar de Raulzinho), o zerado Leandrinho (no lugar de Benite), Marquinhos, Hettsheimeir e Nenê, justamente o time que perdera o primeiro período por 28-19. Por que não manter o time que havia fechado bem a primeira etapa? Que insistência com algo que não estava indo bem foi aquela?

4) Facundo Campazzo é um armador de 1,80m (se tanto). Em NENHUM momento Magnano explorou o jogo de costas para a cesta de Raulzinho ou Huertas contra um cara deste tamanho. Em nenhum momento Magnano optou por colocar Alex, Benite ou Leandrinho, mais altos e fortes que Campazzo, em cima do 7 argentino. Foi totalmente incompreensível, também, a entrada de Rafael Luz (frio, totalmente fora de sintonia) no começo do último período. Luz entrou, Campazzo acertou duas bombas de três e saiu levando bronca de Magnano. Quem mandou mal não foi o atleta, mas sim quem colocou o jogador nesta situação, não?

5) Nos segundos finais o Brasil não fez falta em Manu Ginóbili e nem em Andres Nocioni. A decisão é do atleta, mas é inadmissível que o comando técnico da seleção não tenha dado a ordem expressa (e firme!) de que, quando a bola saísse no fundo da argentina, deveria ser cometida uma falta pelo Brasil (que naquela altura só tinha feito três coletivas) imediatamente depois que o hermano com a posse da bola passasse do meio da quadra. Fez falta isso, não?

6) Na segunda prorrogação, Nenê, com apenas três faltas, começou no banco. Qual o motivo? A Argentina abriu vantagem ali. O jogo foi pro ralo ali. Quais os critérios que ele utiliza para as substituições? Alguém compreende realmente? Os atletas compreendem realmente? Ou é só trocar por trocar?

7) Ei, quer lembrar de uma coisinha? Vitor Benite fez 13 pontos no segundo período, correto? Sabem quantos minutos mais ele jogou até o final da segunda prorrogação? Apenas mais quatro. Isso mesmo. Fechou com módicos 15:28 de jogo e 13 pontos. Qual o motivo para Magnano tê-lo esquecido no banco mesmo com rendimento excepcional?

Foram 7 erros crassos em um jogo de 50 minutos, motivo pelo qual ele foi absurdamente criticado pela imprensa internacional (no Twitter os norte-americanos que acompanham a Olimpíada pareciam impressionados com a quantidade de erros nas tomadas de decisão do treinador brasileiro). Eu particularmente acho um índice muito alto para um técnico que se acha acima do bem e do mal. Para um técnico que coloca milhões de regras na seleção, que blinda o time de qualquer contato com o público e que dá declarações estapafúrdias a torto e a direito. Poucos o criticarão por aqui, mas eu me sinto na obrigação de fazê-lo.

Abaixo coloco os cenários possíveis para o Brasil:

1) Derrota pra Nigéria – Brasil Cai Fora
2) Vitória contra Nigéria, Derrota da Croácia, Vitória da Espanha – Brasil FORA, ESP em P2, Argentina, P3, Croácia em P4
3) Vitória contra Nigéria, Derrotas da Croácia e Espanha – Brasil em P4, Croácia, P3, Espanha FORA
4) Vitória contra Nigéria, Vitórias de Croácia e Espanha – Brasil FORA, empate entre Croácia, Espanha e Argentina. Saldo define (Argentina bateu Croácia, que bateu Espanha, que bateria Argentina).
5) Vitória contra Nigéria, Vitória da Croácia e derrota da Espanha – Brasil em P4, Argentina em P1, Croácia em P2 e Lituânia em P3

Em Resumo: Pro Brasil, é vencer a Nigéria. Se ganhar, Espanha NÃO pode vencer a Argentina. Se Espanha VENCE Argentina, Brasil FORA. Que fique claro também. O Brasil NÃO tem como ficar em terceiro. Ou é quarto, ou é eliminado. E quarto é pegar os EUA (que deve ganhar da França amanhã). Não é eliminação neste sábado. Mas é quase isso…

Concordam comigo? O que acharam do jogo deste sábado na Arena Carioca I? Muita frustração, né?

Comunicar erro

Comunique à Redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:

Argentina, Brasil, um time que se nega a perder e outro que não soube ganhar - UOL

Obs: Link e título da página são enviados automaticamente ao UOL

Ao prosseguir você concorda com nossa Política de Privacidade

Sobre o blog

Por aqui você verá a análise crítica sobre tudo o que acontece no basquete mundial (NBB, NBA, seleções, Euroliga e feminino), entrevistas, vídeos, bate-papo e muito mais.


Bala na Cesta