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A vitória de Bauru e a paixão pelo basquete

Fábio Balassiano

26/09/2015 03h06

Quão maravilhoso pode ser um jogo de basquete? Se for pra resumir, vale pegar o que foram os últimos 16 minutos da primeira partida entre Bauru e Real Madrid pela primeira partida da final do Mundial Interclubes. Os bauruenses estavam sendo completamente dominados pelos espanhóis, àquela altura perdiam de 17 pontos (59-42) e estavam nas cordas. O ginásio do Ibirapuera, obviamente, calava-se diante do domínio de um rival claramente mais forte. Não custa lembrar: a equipe de Guerrinha estava diante de um adversário cujo orçamento estimado é de 30 milhões de euros (quase 15 vezes maior que o do time brasileiro), do atual campeão da Europa e cujo elenco é recheado de craques reconhecidos internacionalmente.

Mas aí entra a mágica do esporte, a magia do basquete. Ousado, o técnico Guerrinha optou por tirar Alex e lançar Gui Deodato ao lado de Leo Meindl, Ricardo Fischer, Rafael Mineiro e Rafael Hettsheimeir. Um time leve, com poderio para arremessar de longe e que poderia abrir espaço para as bolas de três pontos mais equilibradas (depois retorno sobre esta parte da estratégia). Poderia dar muito certo. Poderia (até com mais probabilidade) dar mais errado e afundar ainda mais Bauru.

O que se viu, então, foi algo além da compreensão racional. Bauru ESMAGOU o Real Madrid nos últimos quatro minutos do terceiro período, fez 17-3, foi perdendo por apenas três pontos para os dez minutos finais e lá tirou forças sabe-se lá de onde para bater um fortíssimo rival por 91-90 após infiltração de Ricardo Fischer a quatro segundos do fim. Foi uma vitória magnífica, esplendorosa, que contou com 27 pontos de Rafael Hettshemeir (o nome do jogo com 6/9 de fora!), outros 15 de Leo Meindl (ele engoliu o lituano Maciulis) e um esforço coletivo acima do normal por parte da agremiação brasileira.

Vamos a mais alguns detalhes da peleja:

1) No primeiro tempo Bauru chutou 4/15 de três pontos. No segundo, surreais 12/18. E não foi sorte. Perguntei a Jefferson William (foto), que fez ótima partida apesar de sua limitação física (ele volta de grave lesão), qual o motivo de tamanha mudança e ele foi na mosca: "Quando perdíamos por 17 o Guerrinha orientou o Ricardo Fischer a fazer mais de um corta-luz por jogada, e ordenou que os outros jogadores em volta dele não convergissem para o meio do garrafão, mas que abrissem para se posicionar para o chute. Deu certo". Ouvi o técnico a respeito disso também: "Não era uma jogada treinada, mas vi que o Real Madrid estava congestionando o meio e nosso time estava se atrapalhando com isso na primeira etapa. Quando conseguimos sair dessa armadilha tivemos oportunidade de arremessar com mais equilíbrio e as bolas caíram". Está claro que não foi obra do acaso. O apressado ataque que se enrolava e dava espaço para os contra-ataques merengues se ajustou. A marcação, por consequência, não ficou tão pressionada. Tudo fluiu naturalmente e sem loucura. O Real tinha um remédio para deter os chutes longos de Bauru. Não contava era com um antídoto tão rápido assim por parte dos bauruenses. Arremessar de longe NUNCA foi o problema. De forma equilibrada e com as armas no lugar certo foi, é e sempre será uma ótima e letal arma.

2) Alex Garcia (foto) é um fenômeno do basquete brasileiro. Foram 12 pontos, 8 assistências, 7 rebotes e dois arremessos cruciais nos minutos finais. Seus números nem sempre mostram a sua importância para a equipe, e nesta sexta-feira ele foi um leão em quadra ao cobrir as investidas do excepcional Sergio Llull e Sergio Rodriguez ao garrafão bauruense. Irritado em alguns momentos com a falta de cobertura de sua defesa, o Brabo esbraveja pedindo atenção e reforço à marcação de Bauru. Deu certo. O Real Madrid fez apenas 31 pontos nos últimos 14 minutos, algo muito aceitável para uma equipe com padrão ofensivo como é a merengue. Já falei isso aqui algumas vezes e não canso de repetir: atletas como Alex, que se sacrificam pela equipe (pelo bem comum) em detrimento de façanhas individuais devem ser muito valorizados por aqui. O basquete é um jogo coletivo e ter alguém assim no elenco é sempre uma imensa vantagem competitiva.

3) Não achei que Ricardo Fischer (foto) fez uma partida sensacional, mas o que dizer de um cara que precisa marcar Sergio Llull, Rudy Fernandez, Sergio Rodriguez e  tem força para guiar seu time a uma reação histórica e ainda por cima é capaz de matar a bola decisiva para dar a vitória a Bauru? Mais uma prova de força do jovem armador e mais um tijolo que ele coloca em sua "construção" para ser um dos melhores do país em pouquíssimo tempo. Tem muita gente que pega no pé de Ricardo, mas sua personalidade, sua constante evolução e o trabalho que ele tem feito com Guerrinha o credenciam a seguir brilhando por muito tempo.

4) Outro jovem que merece um destaque imenso é Leo Meindl (foto). Recém-chegado a Bauru, o ex-ala de Franca não teve o menor pudor de descascar o lituano Marciulis e detoná-lo em uma sequência de jogadas que deixou o técnico Pablo Laso, do Real Madrid, de boca aberta (estávamos sentados atrás de Laso na área de imprensa). Léo terminou com 15 pontos, sendo 6 no crucial terceiro período e 7 no quarto derradeiro. Vale citar, também, a bravura de Gui Deodato, jogador emprestado por Rio Claro e que na noite anterior havia jogado um jogo 5 de Paulista contra o Pinheiros. Chegou no hotel, dormiu, descansou, treinou de manhã, foi acionado em um grave momento e correspondeu totalmente às expectativas. Uma noite que ele jamais esquecerá certamente.

5) Quer ver a mágica do esporte em ação? Rafael Hettsheimeir pelo Real Madrid na temporada 2012/2013: 106 pontos em 27 jogos. Nesta sexta-feira, 27 pontos em um jogo contra… o Real Madrid.

6) Para ser campeão mundial os bauruenses precisarão vencer o Real Madrid novamente no domingo ao meio-dia. Vitória do Real por um ponto de diferença leva a peleja para a prorrogação. Por mais que isso, título merengue. Qualquer triunfo de Bauru mantém o caneco no país (o Flamengo foi o último vencedor).

Foi uma noite magnífica para quem gosta de esporte, para quem ainda se deixa emocionar pelo jogo, para quem ama basquete poder bater no peito e dizer "cacete, eu vi uma partida espetacular". Curtiu também? Comente o que achou!

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