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Todas as faces da jovem Damiris - seleção, WNBA, LBF e dramas familiares

Fábio Balassiano

10/03/2015 06h02

Damiris Dantas do Amaral é uma dessas joias que surgem no esporte brasileiro sem a gente entender muito bem como. Nascida em Ferraz de Vasconcelos (SP) há 22 anos, começou no basquete quase que por acaso no Instituto Janeth Arcain e não parou mais. Foi escolhida a melhor jogadora do Mundial Sub19 de 2011 levando o Brasil ao bronze da competição, jogou sua primeira Olimpíada com 19 anos em Londres-2012, se tornou peça efetiva da seleção adulta desde então, estreou, pelo fortíssimo Minnesota Lynx, na WNBA em 2014 e foi campeã da LBF por Americana na temporada passada como titular.

Esta é a parte, digamos, florida da história. Mas há muito espinho na vida e na carreira da ala-pivô de 1,92m também. Damiris perdeu a mãe quando tinha 9 anos e passou a ser a "dona" da casa que conta com mais duas irmãs – Tauany, que sofre de paralisia cerebral, e Daiany. Há 2 anos, a avó faleceu. Em agosto de 2014, quando estreava como titular da WNBA pelo então atual campeão Lynx, a tia que a criou foi internada. Diante da gravidade da situação a jogadora saiu dos EUA, ficou no hospital, voltou pra Minnesota, mas a tia não resistiu.

Pouco depois do falecimento de sua tia ela jogou o Mundial da Turquia com a seleção, mas sua preparação e a parte psicológica não estavam no lugar. Seu rendimento (3,5 pontos) não foi bom. Nesta temporada, a penúltima antes da Olimpíada de 2016 no Rio de Janeiro (um de seus sonhos), seu jogo volta a dar sinais de melhora (seus arremessos estão caindo com mais frequência, seu físico melhorou e os fundamentos estão mais lapidados) e ela parece cada vez mais preparada para assumir a lacuna que será deixada por Érika de Souza (a melhor jogadora do país e líder da seleção) nos próximos anos.

Conversei com ela sobre seu jogo e sua vida depois do Jogo das Estrelas de sábado em Franca.

BALA NA CESTA: O jogo de vocês, da LBF Brasil, contra a LBF Mundo, foi mais pegado do que o esperado para uma festa ou estou enganado?
DAMIRIS: Foi mesmo. Estava engasgado desde o ano passado, essa é a verdade. Esperávamos ganhar em São José em 2014 e não iríamos deixar passar essa oportunidade aqui em Franca, não. Era uma festa, foi um evento lindo, mas nós queríamos vencer de qualquer maneira. Ainda bem que conseguimos.

BNC: E o evento em si, te chamou a atenção, né?
DAMIRIS: Ah, sim. Muitas pessoas comentando, minhas amigas todas falando disso e assistindo a partida também. Tomara que, depois dessa festa, o basquete feminino do Brasil cresça muito.

BNC: Acabando esta temporada 2014/2015 com Americana na Liga de Basquete Feminino (LBF) você volta para sua segunda temporada com o Minnesota? Ou há algo diferente em vista que você esteja planejando?
DAMIRIS: Não, não. Já está totalmente decidido isso em minha cabeça e com meus agentes. Volto para a WNBA. Só estou esperando a definição de datas em relação ao Sul-Americano Feminino de Clubes que Americana irá disputar para saber exatamente quando voltarei aos EUA.

BNC: Você continua muito novinha, mas já tem muita estrada…
DAMIRIS: (Risos) Faz tempo que eu deixei de ser promessa, né? E tenho consciência disso. Sinto que estou amadurecendo a cada ano e essa ida para os Estados Unidos ano passado ajudou muito também. Lá cresci bastante como pessoa, ganhei bastante responsabilidade e tinha que corresponder. Não havia outra opção. Estava sozinha em um ambiente diferente, não conhecia ninguém. Foi difícil, mas hoje vejo que aquela experiência foi muito benéfica para mim. Tive bastante tempo de quadra, voltei mais confiante e ganhei muito em termos técnicos também.

BNC: E seus próximos passos com a seleção? Temos Pan-Americano e Pré-Olímpico este ano, ano que vem Olimpíadas…
DAMIRIS: Vou te ser muito sincera: não fiquei satisfeita com meu desempenho no Mundial passado. Sei que poderia ter rendido muito mais. Posso ir muito melhor do que fui. Fiquei muito chateada que cheguei e já viajei para o Mundial. É algo que espero que nunca mais aconteça, pois a preparação é fundamental e preciso muito dela (preparação). Espero que no Pan e no Pré-Olímpico a gente possa treinar muito para ir bem. Temos uma boa equipe e tenho certeza que podemos jogar melhor do que jogamos no Mundial do ano passado. Em 2016 há as Olimpíadas, é um sonho que espero alcançar também.

BNC: A gente conversa muito, você teve um período pessoal muito conturbado com o falecimento da sua tia e o Mundial acabou não sendo muito bom como você disse. Você falou em amadurecimento nos Estados Unidos, mas com 22 anos você já passou por muita coisa familiarmente falando, já que sua mãe também faleceu. Há momentos em que você pensa que vai faltar força?
DAMIRIS: De verdade ainda estou me recuperando de tudo aquilo que passei em 2014. Foi muito difícil para mim. É algo pessoal, não gosto de ficar falando, mas foi realmente complicado. Estava no meio de temporada, jogando bem, quando chegou a notícia que minha tia havia sido internada. Foi a pessoa que me criou, um elo familiar importantíssimo para mim. Arrisquei perder meu contrato com a WNBA, mas não vi outra opção que não voltar para ficar um pouco com ela no hospital. O tempo que estive foi ótimo, perfeito, ela melhorou muito enquanto estivemos juntas. Só que aí voltei, passaram dois dias e ela veio a falecer. Não foi só o falecimento da minha tia, mas tudo o que cercou aquele momento. Eu ter que consolar e cuidar dos meus primos, minhas irmãs, meu tio também. Isso foi pesado. Mais uma vez tive que ser muito forte. Quando minha mãe faleceu, tive que cuidar das minhas irmãs. Agora, de meus primos e tios. Nem sei de onde tiro tanta força para te ser sincera. Só sei que tento me manter firme.

BNC: No que você acredita? Algumas pessoas pensam que quando a gente passa por muito sofrimento ao mesmo tempo há coisas boas guardadas…
DAMIRIS: Todos os dias me pergunto: "Por que eu?". Todo dia. Pergunto, principalmente, sobre a morte da minha mãe com a gente tão nova. Depois minha avó. Dois anos depois a minha tia. Olha, quando recebi a notícia da minha tia eu fiquei muito brava com D's. Mal, mal mesmo. Queria saber o motivo pelo qual a minha família estava passando por isso tudo. Mas depois, com mais calma, a gente reflete e agradeço por tudo o que Ele vem fazendo por mim, pelas minhas irmãs. Se está acontecendo isso comigo é por algum motivo. Alguma razão que ainda desconheço há, e sei que está em boas mãos.

BNC: O basquete, então, acabou sendo o seu grande refúgio, sua grande válvula de escape?
DAMIRIS: Disso não tenho a menor dúvida. Quando estou na quadra estou feliz, esqueço de tudo. Não consigo ver problema algum enquanto estou treinando ou jogando. A maioria das alegrias que tive foram dentro da quadra e por causa do esporte consegui dar uma condição melhor para minhas irmãs. Vim de uma comunidade carente de São Paulo, Ferraz de Vasconcelos, tive muita dificuldade na infância e tinha tudo, tudo mesmo para ir para o lugar errado, para o caminho não muito bom. Não sei se já te contei isso, mas convivi com muitas pessoas, quando era criança, que foram pro caminho errado, acabaram morrendo. O esporte me livrou de muitas coisas ruins e me colocou em condição de proporcionar coisas boas para os que me cercam. Principalmente para minha irmã menor, que é a mais especial. Tenho muita sorte em relação a isso.

BNC: Falando um pouco de basquete agora. Você foi MVP do Mundial Sub-19 em 2011, já está na WNBA, é campeã nacional por Americana. Veio e tem vindo tudo muito rápido, mas seu jogo ainda precisa melhorar e você mesma sabe disso. Em que aspectos você considera mais importante evoluir? Parte técnica, física, psicológica?
DAMIRIS: (Risos) Nunca estou satisfeita. Isso é o mais importante. Com nada. O dia que achar que estou bem está errado. Mas na parte física creio que possa ir além, possa evoluir mais. Não só nela, mas meus arremessos de média e longa distância podem cair um pouco mais. Em Americana e Minnesota tenho profissionais muito bons que me ajudam e ajudarão nisso. Torço para que os resultados sejam vistos em breve.

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