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Vale a pena continuar 'odiando' Nenê?

Fábio Balassiano

05/05/2014 14h40

O Washington Wizards começa a disputar hoje (20h, de Brasília) a semifinal da Conferência Leste contra o Indiana Pacers. Não possui o mando de quadra, mas está com muita confiança e tem uma arma fortíssima para chegar à decisão do Leste: Nenê. E é sobre o brasileiro que quero falar por aqui.

Por conta de tudo que envolve seleção brasileira, e seus ídolos do passado, quase toda a análise que se faz de um atleta brasileiro que joga/jogou na NBA enviesa para um lado patriótico terrível, alienante até. É algo tão tosco, tão chucro, que eu me choco, embora não me surpreenda. Infelizmente é uma linha (por vezes editorial até) que convencionou-se fazer por aqui e que é difícil de sair. Mas será que (outro termo convencionado) "os NBA" são os culpados de tudo de ruim que há no basquete brasileiro?

Na semana que o Washington esteve no Brasil, e Nenê levou aquela vaia monstruosa na HSBC Arena no final dela (relembre aqui e aqui o que escrevi a respeito), me impressionou demais a forma como os jogadores, técnicos e profissionais do Wizards trataram o brasileiro nos treinos na Gávea (estive lá três, quatro dias e pude ver tudo com muita calma). Era uma mistura de reverência, respeito e admiração que era muito bacana de ver. Os atletas, quase todos jovens, tinham em Nenê um exemplo de liderança, um exemplo de alguém que há uma década joga na melhor liga de basquete do planeta. Seus técnicos sabiam que o sucesso da turma da capital passava pela experiência dele. E os profissionais da franquia estavam bobos de ver as origens de alguém tão importante (para eles) assim.

Aí veio a temporada e Nenê nunca jogou tão bem. Quando machucou o joelho o Washington viveu um colapso até descobrir que ele voltaria nos playoffs. Na pós-temporada, média de 17 pontos e DOMINAÇÃO completa em Joakim Noah. O melhor termo é este mesmo: Nenê foi DOMINANTE ofensiva, defensiva e psicologicamente em cima do melhor defensor da temporada. Se isso não é coisa pra cacete, eu sinceramente não sei o que é.

Há questões táticas fundamentais, como o fato de o Washington chamar jogadas para ele como NUNCA houve na seleção brasileira para seu melhor jogador há uma década (chega a ser inacreditável dizer isso, mas o melhor atleta do país nunca teve a valorização que merece nem nas estratégias de jogo da seleção, o que é bizarro), mas eu fico me perguntando: será que é normal ver o país inteiro ODIANDO (porque o termo é este mesmo) Nenê do jeito que é feito por aqui, enquanto que lá ele é idolatrado, reverenciado, amado, acarinhado o tempo inteiro? É óbvio que os motivos (de "ódio" e idolatria) são distintos, mas vale a reflexão do mesmo jeito.

Nenê tem falhas, Nenê tem erros, Nenê (sempre insisto nisso) deve/deveria se comunicar melhor com seus fãs/torcedores aqui do Brasil (como foi quando ele deixou de jogar na seleção devido à gestão Grego embora ninguém soubesse do motivo exatamente). E se digo isso não é para que ele seja reverenciado como o grande jogador que é, mas sim para evitar que as interpretações dos fãs/torcedores fiquem baseadas apenas em informações/Notas Oficiais de uma Confederação Brasileira de Basketball que é uma vergonha (uma vergonha, não há outro termo!) e de um técnico que faz questão de convocar atletas que estão sabidamente lesionados (como foi no ano passado com Anderson Varejão e Leandrinho) para depois de um insucesso ainda por cima criticá-los, expondo-os ao ridículo, à pressão popular, invertendo o foco.

O que espanta é Nenê ser tratado como demônio, como um capeta em terras brasileiras. Não há um fórum de discussão de basquete que não termine com xingamentos pouco ortodoxos a um jogador que (só lembrando) já passou por um grave câncer e uma lesão seríssima no joelho. Por que precisamos odiar tanto a alguém a invés de tentar entendê-lo de uma forma mais ampla? Talvez a forma como os atletas são tratados no Brasil (sempre jogados às feras, sempre jogados no olho do furacão sem a menor cerimônia pelos dirigentes/técnicos) explique muita coisa, mas não tudo.

O mundo ideal seria que a CBB desse carinho a Nenê neste tempo todo em que ele tem brilhado nos Estados Unidos. Mas isso deveria ter sido feito desde o começo do século, quando ele foi pra NBA e brilha como nenhum outro brasileiro brilhou. Como isso não aconteceu, era hora do medicamento, dos remédios nos últimos anos.

No mundo real, porém não menos idealizado tendo em vista a entidade máxima que conhecemos, a Confederação deveria TRABALHAR TODOS OS DIAS para tentar reaproximar o público do melhor jogador brasileiro dos últimos 10 anos. Como não o faz, é difícil crer que o quadro de ódio declarado que há por parte da torcida em relação ao cara vá mudar, o que é uma lástima.

Só um alerta desde já: a convocação da seleção brasileira para a Copa do Mundo da Espanha vai sair em breve, e o nome de Nenê certamente estará nela. Há, já anunciado, um amistoso contra a Argentina no Maracanazinho no mês de julho. Vocês já conseguem imaginar como será o clima da torcida para com ele se nada for feito para melhorar a relação, certo?

Um pouco mais de cabeça no lugar, um pouco mais de olhar todos os pontos fariam com que analisássemos a situação inteira com a complexidade que ela merece. Nenê (insisto) poderia se comunicar muito melhor com todos por aqui para expressar o que pensa sobre seleção, CBB, tudo. Mas o basquete brasileiro jogar no lixo, como tem feito há uma década, o seu ativo mais importante fala muito sobre como pensa e age a modalidade (como um todo) por aqui. A seleção e o basquete brasileiros podem mesmo descartar Nenê como se ele fosse um jogador comum? Não valeria a pena uma conversa franca, aberta, envolvendo presidente, técnico, dirigentes, atleta e seus representantes? E conversa não é pegar um avião, ver um jogo em Washington, jantar, tirar uma foto, colocar um #hashtag e achar que está tudo resolvido.

Será que estamos certos em SÓ (porque o tratamento ruim é exclusivo há 10 anos) tratarmos mal a alguém tão importante? Nego-me a crer que a resposta seja positiva. Concorda comigo? Comente!

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