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Diretor da Federação dos EUA exalta: 'Hoje todos querem jogar pela seleção'

Fábio Balassiano

11/03/2014 01h08

* O blogueiro viajou a convite do Canal Space

O educadíssimo Jerry Colangelo é um destes caras que transpira basquete. Aos 75 anos e dono de um perfil conciliador, ele poderia estar em casa depois de vender quase todos os seus negócios (o Phoenix Suns, por exemplo, por módicos US$ 401 milhões), mas preferiu aceitar o desafio proposto a ele pela USA Basketball.

Depois do fiasco que foi a participação americana nas Olimpíadas de 2004, quando ficou com o terceiro lugar, Jerry foi convidado para reformular o projeto de basquete da seleção adulta, dando a uma nova roupagem. Conversei com ele sobre tudo isso em Nova Orleans, depois da cerimônia do Hall da Fama. Sem querer incomodá-lo, perguntei ao assessor se poderia entrevistá-lo. Jerry apontou o dedo para uma mesa, recebeu um belo sanduíche ("Você quer comer algo? Não se acanhe, pode pedir") e deu algumas lições para o blogueiro.

BALA NA CESTA: O senhor é conhecido como um dos responsáveis por ter colocado os Estados Unidos de novo no topo do basquete depois daquele fiasco das Olimpíadas de Atenas, em 2004. Como foi todo o processo para a montagem dos times dos Jogos de 2008 e de 2012?
JERRY COLANGELO: Quando fui chamado para ser diretor da USA Basketball, estava muito claro para todos que precisávamos mudar a cultura. E mudar a cultura significava entender e respeitar o basquete que estava sendo jogado e pensado ao redor do mundo. No começo do meu trabalho eu viajei para três países para estudar e entender como eles planejavam o trabalho de suas seleções adultas e de base. Fui para Argentina, Espanha e Lituânia, onde ouvi, vi e aprendi muito antes de formatar o projeto de basquete para o ciclo que começaria em 2006 no Mundial do Japão. O que tinha muito na minha cabeça é que, mesmo sendo os Estados Unidos, país com maior número de títulos mundiais e medalhas olímpicas, estávamos em uma fase não muito boa. Reconhecer que há um problema é o primeiro passo para solucioná-lo. Se estivesse tudo bem eu não precisava ter sido chamado, não é mesmo? E precisávamos reconhecer isso. Tínhamos que respeitar o basquete mundial e compreendê-lo para voltarmos a ser respeitados. Foi o que fiz desde o meu primeiro dia no cargo.

BNC: Eu imagino que o processo de convencimento dos jogadores da NBA para atuar pela seleção não deva ter sido fácil…
COLANGELO: Não, não foi fácil, mas quando eu apresentei o projeto para os atletas todos se colocaram a disposição. Eu conversei com um a um, mostrei o que a USA Basketball pensava e todos se mostraram animados. Não houve uma recusa sequer, posso lhe garantir. Quando eles entenderam que se tratava de algo maior, de uma recuperação da imagem do país, todos embarcaram no mesmo barco. Lembro de uma conversa que tive com o Kobe Bryant em 2005. Kobe jamais havia defendido um time norte-americano. Ele me disse que poderia contar com ele a partir de 2006, pois teria alguns problemas pessoais para resolver. Depois daquele ano, Kobe me ligou duas ou três vezes para dizer para não esquecer dele, pois tinha o sonho de jogar uma Olimpíada pelo seu país. E estamos falando de um dos melhores jogadores de todos os tempos.

O interesse dele e dos demais atletas em defender a camisa dos Estados Unidos trouxe, além do talento incrível que eles possuem dentro de quadra, uma outra forma de pensar, uma outra forma de ver o Mundial e a Olimpíada. Todos vieram felizes, sem vaidade alguma, por um bem maior, algo que eles sabiam que só eles poderiam mudar. Nunca houve má vontade no grupo, os atletas sempre mantiveram o clima mais agradável possível. Com esta mudança de filosofia o mundo passou a nos olhar diferente, nos respeitando mais por saber que estávamos ali para jogar sério, jogar duro. E o mais importante de tudo: os meninos da base passaram a olhar para a seleção adulta e sentir um orgulho danado também. Hoje, dos jovens que estão começando aos craques da NBA, todos querem jogar pela seleção. Quando lançamos uma lista de convocados para a Copa do Mundo, como fizemos recentemente (veja mais aqui), todos estão dispostos a vir. Mas que fique claro: antes de sair a convocação eu converso pessoalmente com todos eles, de modo a não expor ninguém. É uma filosofia minha e sigo desde que assumi o cargo. Kobe me disse, por exemplo, que neste ano de 2014 não poderia jogar. Convocá-lo, portanto, seria desrespeitoso com ele depois de tudo aquilo que ele desempenhou conosco em 2008 e 2012 nas Olimpíadas. Por isso somos campeões de tudo, em todas as categorias, tanto no masculino quanto no feminino. Isso é o que mais me enche de orgulho.

BNC: Você falou do Kobe. Ele tem contrato com o Lakers até 2016, e disse que não jogará as Olimpíadas no Rio de Janeiro. É o meu país, e posso te garantir que muita gente gostaria de vê-lo por lá. Alguma chance de o senhor demovê-lo desta ideia?
COLANGELO: Ainda está longe para pensar nisso. Eu gosto de pensar ponto a ponto, e na nossa frente agora temos a Copa do Mundo da Espanha. Mas nunca se sabe. Kobe é um competidor. E se a chama de querer conquistar um terceiro ouro olímpico estiver acesa pode ter certeza que meu telefone vai tocar de novo. E do outro lado da linha estará um jogador absurdamente motivado.

BNC: E como foi a escolha do Coach K para comandar a seleção? Pode parecer estranho para quem é do Brasil que um técnico do circuito universitário dirija os melhores jogadores da NBA, a liga profissional de basquete…
COLANGELO: Vou lhe contar uma coisa. Quando eu assumi, em 2005, reuni, em Chicago, mais de 100 campeões mundiais e olímpicos dos Estados Unidos. Coloquei todos dentro de uma sala para ouvi-los, saber o que estavam pensando. A decisão final ia ser minha em relação a todos os aspectos, mas era importante saber o que se passava na cabeça daquela gente que tanto fez pelo basquete do nosso país. Foi um encontro magnífico, e que pouca gente tem noção do que saiu de lá. Em um determinado momento, eu joguei a pergunta na mesa: "Quem vocês acham que deve ser o treinador a partir de agora?".

Ficaram dois nomes entre os mais votados: Gregg Popovich, do San Antonio Spurs, e Mike Krzyzewski, da Universidade de Duke. Mas eu me convenci que Mike seria o melhor técnico quando Dean Smith, treinador de North Carolina (dirigiu Michael Jordan) e um dos maiores rivais de Mike em sua carreira, levantou a voz e disse: "Você, Jerry, elencou todos os requisitos que um comandante do time norte-americano deve ter a partir de agora. Liderança, respeito dos atletas, orgulho em defender o país e conhecimento do basquete mundial. Eu sou de North Carolina, e te digo que ninguém além do Coach K, da minha rival Duke, tem perfil tão apropriado". Se  Dean Smith disse aquilo, quem poderia contestá-lo?

BNC: O senhor era um dos donos do Phoenix Suns quando Leandrinho, um brasileiro, atuou por lá. O que o senhor sabe do basquete do Brasil?
COLANGELO: Olha, em primeiro lugar quero dizer que estou muito feliz com o retorno do (Leandro) Barbosa à NBA. Foi um jogador magnífico que tivemos por lá e sei de tudo o que ele passou para regressar à liga. Passou por uma lesão grave, e posso te garantir que fiquei extremamente emocionado quando ele foi contratado pelo Phoenix, onde é muito querido e tem uma história belíssima. Sobre o basquete brasileiro eu não posso falar muito. Sei que o país tem uma série de conquistas no passado e que tem trabalhado duro para tentar conquistar tudo novamente. O Brasil será a sede da próxima Olimpíada, e sem dúvida ter um time forte em casa o torna um dos grandes favoritos desde já.

BNC: O senhor tem 75 anos e me parece muito disposto, muito animado para seguir dirigindo a USA Basketball por muito tempo. De onde vem tanta força?
COLANGELO: Olha, a primeira vez que eu coloquei a mão em uma bola de basquete foi aos 7 anos. Eu era um menino de Chicago que só queria ficar com ela (a bola) nas mãos e acabei me apaixonando pelo jogo. Fui gerente-geral, técnico, dono e tudo o que você possa imaginar dentro de uma franquia de basquete. E posso te dizer: dentro de um ginásio de basquete é o lugar que mais amei estar em toda a minha vida. Sempre tive meus negócios, minhas empresas, mas jamais deixei o basquete de lado. Hoje é o meu prazer maior poder proporcionar um pouco de alegria às pessoas através do basquete. Quando fui chamado pela USA Basketball não considerei como um trabalho, mas sim como uma missão, como uma chance de colocar os Estados Unidos de volta ao patamar que ele merece. O basquete me motiva, me dá uma energia imensa para seguir lutando por dias melhores com meu país.

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