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ENTREVISTA: Giovannoni fala sobre confusão do NBB, Associação de Atletas e muito mais

Fábio Balassiano

15/12/2012 11h47

Depois da confusão ocorrida entre Flamengo e Brasília, no jogo 1.000 do NBB na quinta-feira, fui correndo entrevistar Guilherme Giovannoni, ala do time brasiliense e um dos mais esclarecidos atletas do país. No hall do hotel em que ele se concentra no Rio de Janeiro para o jogo deste sábado contra o Tijuca (17h, e os atuais tricampeões virão sem Alex, Nezinho e o técnico José Carlos Vidal, todos suspensos) batemos um papo franco, de quase 40 minutos, sobre o ocorrido, Associação de Atletas e muito mais. Preferi não cortar absolutamente nada da entrevista. Ficou longa, mas acho bacana compartilhar tudo com vocês. Divirtam-se!

BALA NA CESTA: A primeira pergunta é bem previsível. O que aconteceu no jogo de quinta-feira contra o Flamengo, o que vocês, de Brasília, conversaram e o que estão esperando pra frente?
GUILHERME GIOVANNONI: Ah, muito provavelmente nós teremos o Alex, o Nezinho e o técnico José Carlos Vidal em julgamento, até por fazer parte do regulamento do campeonato. Suspensos do jogo de hoje (contra o Tijuca) eles já estão, não há muito o que fazer. Não sei o que esperar desse julgamento, pra falar bem a verdade, não sei se houve mais alguma coisa no relatório dos árbitros pra ver o que vai acontecer. Eu mesmo já fui a julgamento sem ter sido expulso em jogo. Não sei o que esperar. E de verdade não há muito o que comentar, não. Isso aí seria entrar em polêmica, e não gostaria. Deixarei as providências para a Liga, para a diretoria do Brasília e vamos esperar os resultados. Só acho que poderia ter sido uma festa mais bonita. Sempre será um jogo tenso entre Flamengo e Brasília, e essas coisas infelizmente aconteceram. Mas temos que virar a página, pois jogamos contra o Tijuca bem desfalcados.

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BNC: Você não quer entrar em polêmica, eu entendo, mas queria que você falasse um pouco sobre arbitragem aqui no Brasil de um modo mais amplo, não especificamente do jogo de quinta-feira. Minha opinião é que eles estão travando demais o jogo e há um lado de prepotência e arrogância muito forte. Concorda comigo?
GG: Olha, os árbitros estão sempre protegidos pela regra. Não tem muito jeito e não vai mudar nunca isso aí. Algumas vezes exageram, sim, assim como nós exageramos também. Isso é uma coisa que acaba gerando uma tensão muito grande nos jogos, mas a gente pede um pouco que as coisas que são ditas antes do campeonato sejam passadas para a prática. Por exemplo: em relação à postura. Se eles pedem uma coisa pra gente, e não agem como combinaram, fica difícil pra nós ter a mesma postura. Mas isso, lógico, não justifica o que aconteceu na quinta-feira. Jogadores, técnicos e árbitros temos alguns vícios que são difíceis de serem tirados. Isso a gente, como um todo, precisa melhorar, evoluir, pelo bem do basquete brasileiro. Não vai ser do dia pra noite, mas no longo prazo.

BNC: Vocês, técnicos e jogadores, estão reclamando demais?
GG: A gente sempre reclamou demais, sempre reclamou demais mesmo. Isso é um fato. Se eu falar que não aqui eu vou passar por bobo, por alguém que está falando mentira pra você. É uma coisa que um pouco é permitida, um pouco que a gente passa do ponto. Tem, também, um pouco da cultura dos esportes brasileiros também. Existe sempre essa pressão em cima de arbitragem na luta pela vitória. É um vício que vai além do basquete mesmo. É cultural, e temos que mudar pra melhorar. Não tem muito jeito.

BNC: Você saiu envergonhado pelo que aconteceu na quinta-feira? Jogo de festa, jogo 1.000, todo mundo vendo…
GG: Envergonhado, não. Saí triste pela derrota e por alguns fatos que não gostei. Tristeza passa, também. Acredito que o melhor é, ao invés de ficarmos nos lamentando, tomarmos esse tipo de jogo como lição. Sem ser da boca pra fora mesmo, com ações. Havia dirigentes da Liga Nacional lá ontem, e eles viram tudo o que aconteceu. Quando falo 'viram tudo o que aconteceu' é em relação a árbitros, técnicos e jogadores. Não quero apontar o dedo só para uma parte, não. Com todo o respeito, vou usar uma expressão feia aqui, mas não tiro o meu da reta, não. Que sirva de lição.

BNC: Aí eu acabo entrando em um tema que queria abordar com você faz tempo, sobre Associação de Atletas. Você é o presidente, pelo que me consta, e queria saber em que pé está a Associação.
GG: Vou contar a história desde o começo, desde quando entrei nessa. A Associação já existia, era comandada pelo Ratto, ex-jogador, dirigente e agora técnico de Suzano. Sendo bem claro, ele não podia continuar nessa classe. A bem da verdade é essa. No Jogo das Estrelas de 2011, o primeiro em Franca, ele me chamou para assumir a Associação. Disponibilizei-me a ajudar, mas quando vi, a questão era bem maior, bem maior do que eu pensava. A questão de estatuto, contabilidade, tudo, ficou com o Marcio Cipriano (de Brasília) e fomos atrás de CNPJ, tudo direitinho. No Jogo das Estrelas deste ano (2012) nós fizemos uma reunião em Franca, mas ainda não estava por dentro da parte burocrática. Pedi ajuda a um advogado de Brasília, o Dr. Sebastião Neto, para toda essa parte jurídica, de contratos, assembleia, porque era uma coisa que não conhecia, não sabia mesmo como fazer. Outro advogado, este de Campinas, que tem nos ajudado muito é o Dr. Felipe Souza e merece ser mencionado. Consegui a assinatura de todos os jogadores, e neste mês a gente está protocolando tudo direitinho em um cartório de Brasília. Agora estou correndo atrás do cadastro dos jogadores do NBB e espero antes do Natal enviar um e-mail aos atletas, pois há uma nova diretoria. Eu como presidente, o Rossi (também de Brasília) como tesoureiro, o Cipriano como vice, o Felipe Ribeiro (do Ceará) também no grupo. Há outros seis que também estão na chapa – Fúlvio, Nezinho, Fiorotto, Nezinho, Alex e Renato.

BNC: Oficialmente, então, essa nova ideia de Associação passar a vigorar.
GG: A Associação já existe, mas em janeiro agora a ideia é termos um site, e a partir daí conversar com jogadores sobre a questão da anuidade dos atletas, pois manter a Associação tem custos. Sai um valor razoável pra todo mundo e aí começamos a trabalhar em cima disso. Vamos costurar alguns acordos para que os associados tenham benefícios, como, por exemplo, a questão da previdência privada. Hoje, pra falar a verdade, é a primeira entrevista que falo sobre isso. Gostaria de fazer mais coisas antes de falar algo, mas, como o Kouros já falou sobre isso com você, é bom dar uma satisfação em relação ao que está acontecendo. Em relação ao Kouros, presidente da LNB, a gente já teve algumas reuniões e gostaríamos de algumas melhorias imediatas. Alguns times não têm contrato de trabalho, por exemplo. E a partir disso a gente dá um respaldo para o atleta, para o clube e consegue fazer um monte de coisa legal para o NBB como um todo. As coisas deixam de ser "de boca" e passa a ser contratuais. Aí conseguimos fazer janela de transferência, seguro, tudo. Alguns dirigentes falam "ah, mas isso não é da cultura do brasileiro". Não é problema. A gente muda a cultura pra melhorar o campeonato. Um bom caso é o do Marcelinho, que se lesionou no primeiro jogo da temporada pelo Flamengo. Caso ele tivesse seguro, a seguradora pagaria o salário dele e o clube poderia contratar outro jogador com a verba que seria investida nele. Ganham todos. O Kouros falou com você sobre a questão dos pisos da quadra, há questões de tabela, tudo isso temos que exigir desde que estejamos organizados. A ideia da Associação não é fazer greve, zona, nada. É pra dialogar e melhorar a situação para todos, tornando o produto NBB melhor. Assim quem está dentro do basquete sai ganhando, os clubes entendem que se pode criar um mercado de jogadores, os investidores veem mais facilidade para investir, entre outras coisas. Ninguém quer briga, que isso fique claro. Estamos caminhando, é o mais importante. Estamos fazendo a AAPB (Associação dos Atletas Profissionais de Basquete) para jogadores do NBB, Paulista, Super-Copa, Feminino, tudo.

BNC: Você acha que atleta brasileiro é muito passivo, ou é passivo porque não existe uma classe organizada?
GG: Não consigo te responder isso. Vamos apenas buscar os nossos direitos. A ideia é que tenhamos um jogador dentro de cada time como representante da Associação, para que eles possam multiplicar o que estaremos pensando na diretoria. Já temos algumas ideias de como isso vai funcionar, mas precisamos acertar os últimos ponteiros antes de divulgar. Precisamos estar todos na mesma página, isso é um fato, e sabemos que não é uma coisa muito rápida, não. A ideia é que, a partir do momento em que tenhamos verba, possamos fazer palestras sobre previdência, planejamento financeiro, entre outras coisas.

BNC: Mudando um pouco de assunto, queria que você falasse sobre Olimpíada. Foi sua primeira experiência lá, a seleção brasileira terminou em quinto lugar e teve um desempenho legal. Você ainda sonha com aquela derrota para a Argentina? Se chateou com as críticas?
GG: Foi uma ótima passagem, e é óbvio que o jogo contra a Argentina fica um pouco na cabeça, sim. Mas vida de esportista não dá pra pensar em derrota, não. Temos que pensar pra frente, só isso. Depois de muito tempo sem jogar uma Olimpíada chegamos em quinto lugar, que é uma posição bacana. Queríamos mais, claro, e tínhamos chance de ir mais longe. Infelizmente não conseguimos ganhar da Argentina, que tinha uma experiência maior e conseguiu ganhar aquele jogo. Mas não dá pra ficar remoendo, porque daqui a pouco tem o Mundial (2014). Sobre as críticas, atleta profissional tem que estar acostumado com isso. Uma vez li uma declaração do ex-jogador e agora técnico Mario Sergio (futebol) que achei sensacional. "Quando jogador perde o jogo não pode abrir jornal no dia seguinte", disse. É bem isso. Já estamos chateados com a derrota, ficar lendo tudo o que sai por aí ajuda a derrubar ainda mais a auto-estima.

BNC: E por que diabos seleção brasileira e time brasileiro acaba sempre perdendo para time argentino, em que pese o Flamengo e Brasília terem vencido Regatas e Peñarol recentemente na Liga Sul-Americana?
GG: Essa é outra coisa que é difícil de mudar do dia pra noite, mas é preciso um ponto de partida. Hoje eles ainda estão na nossa frente em termos táticos, principalmente pelo fato de a gente permanecer nessa maneira de jogar há algum tempo. Maneira, é bom dizer, que muitas equipes do Brasil ainda jogam. Há treinadores que estão estudando mais, que se interessam, que tentam fazer algo diferente. Das equipes que vi recentemente, consigo citar o Paulistano (Gustavo de Conti), Limeira (Demétrius), o Minas (Raul Togni) e o Flamengo mesmo com o José Neto. O buraco para esta mudança é um pouco mais embaixo. Tem a ver com a formação dos atletas. Infelizmente hoje ainda temos treinadores de categorias de base que têm um grandão e colocam o menino pra ficar embaixo da cesta pegando rebote e fazendo bandeja. Isso, claro, sem falar na loucura que é pensar em título de mini, mirim. Isso, sinceramente, não muda nada na vida do técnico e nem na vida do menino. O que muda é o técnico ensinar os fundamentos do jogo de forma correta.

BNC: Você tem uma Escolinha, a GG12, que tem crescido bastante, né
GG: Sim, estamos no segundo ano e estamos crescendo. É uma escolinha particular, em parceria com o CEUB. Usamos a estrutura, o campus deles, e aos poucos estamos evoluindo. Temos dois técnicos (Rodrigo Galego e o Guilherme), cerca de 60 meninos e o que mais prezo lá é a questão de fundamentos para a molecada. Os dois são muito atentos a detalhes, e isso é o mais importante. A gente não tem a preocupação com o resultado. Queremos que eles gostem de jogar basquete e evoluam nesse sentido. É um motivo de orgulho pra mim, motivacional mesmo. Quando começamos, tínhamos dois, três alunos lá. Hoje, um ano e 3 meses depois, temos a certeza que a ideia está funcionando direito.

BNC: Pra fechar: como você tem sentido o basquete brasileiro atualmente? Melhorou com o NBB, mas ainda falta muita coisa para popularizar o esporte no país?
GG: A Liga Nacional deu uma nova cara para o basquete. A gente anda aqui no Rio de Janeiro e as pessoas reconhecem a gente na rua. É uma coisa que veio com o NBB, cada vez mais falado e comentado nas ruas. Está crescendo muito, e os próprios jogadores se preocupam cada vez mais com a imagem. Faz parte da evolução do esporte mesmo. Tem muitas coisas a serem melhoradas, como condição de trabalho, mas sabemos que é uma melhora gradativa nessa parte estrutural do basquete. A criação da segunda divisão também foi fantástica, porque trouxe mais competividade e interesse para todas as equipes. Sobre a questão da popularização, aí pode-se melhorar muito. Do Sudeste pra baixo, generalizando, até que se faz bastante basquete. Precisamos melhorar Centro-Oeste, Norte e Nordeste. Tem um time no Ceará no NBB, outros dois do Nordeste na Liga Feminina (Maranhão e Sport-PE). Olha a margem de crescimento que temos por ali. Quantos talentos podem ter ali e que ainda não apareceram apenas por falta de oportunidade? É lógico que é de responsabilidade da Confederação para que tenhamos mais praticantes nessa região. Precisa massificar urgentemente, mas se você me perguntar como seria feito isso, sinceramente não saberia lhe responder porque não tenho subsídio para tal. De todo modo, está claro que precisa ser feito um projeto nacional para o basquete.

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