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Bala na Cesta

O problema de sempre: NBB tem todos os jogos exibidos, mas público não chega a mil pessoas

Fábio Balassiano

06/01/2020 05h01

Há cerca de 4 anos escrevi aqui sobre a média de público do NBB (mais aqui). É um tema crítico, um problema crônico e em minha opinião o maior abacaxi da Liga Nacional no momento.

Se por um lado o campeonato que tem 100% dos jogos exibidos no conceito de multiplataforma começou 2020 com boa presença de torcedores nos ginásios devido a Copa Super8 (no total, mais de 10 mil pessoas para Flamengo x Corinthians no RJ, São Paulo x Minas em SP, Franca x Unifacisa no Pedrocão e Mogi x Pinheiros em Mogi das Cruzes), a realidade é que este primeiro final de semana do ano é muito mais um ponto fora da curva do que algo recorrente por aqui.

Abaixo o cenário até o primeiro turno de 2015/2016:

Agora coloco dois índices importantes em relação a atual temporada – média de público e taxa de ocupação dos ginásios (média de público dividido pela capacidade da arena do time mandante). Os números estão abaixo em ordem do menor pro maior:

Vamos a minha análise dos números com alguns pontos:

1) O público nos ginásios não cresce por aqui. Para nada. A média de pessoas na fase de classificação chegou a 1.001 em 2012/2013, retornou para o patamar de três dígitos e de lá não saiu desde então. Há, obviamente, um crescimento de 17% em relação ao turno de 2016, mas de verdade são 150 pessoas a mais por partida em três anos, algo ínfimo e praticamente irrelevante;

2) A decantada presença dos "times de futebol" tampouco fez com que o "poder de arrastão" desses clubes aumentasse a presença de público nas partidas do NBB. A gente ouvia muito dos dirigentes da Liga Nacional que "quando essa turma entrar o NBB explode". Não explodiu. Pelo contrário. Flamengo e Botafogo estão entre os cinco piores de média de público. Flamengo e Corinthians, as duas maiores torcidas do país, entre os cinco piores de taxa de ocupação. Se somarmos as médias de Flamengo, Botafogo, Corinthians e São Paulo o total dá 3.000 pessoas/jogo, apenas 25% a mais que Franca, uma cidade de 400 mil habitantes, consegue fazer sozinha. Desculpe, mas isso é vergonhoso;

3) Vou me ater ao Flamengo, que fez duas partidas como mandante em Brasília sem distorção na média final (287 e 420 pessoas contra Paulistano e São Paulo), neste tópico e muito embora a questão não seja exclusividade sua eu acho que vale (mais aqui). A razão é bem simples: trata-se do maior campeão do NBB, da maior torcida do país, de um dos elencos mais caros da competição, com atletas renomados e vindo de título. Em que pese o fato de ontem contra o Corinthians o público tenha sido de mais de 2.500 pessoas, recorde da temporada, é inconcebível que um time desse tamanho tenha surreais 546 pessoas de média e 16% de taxa de ocupação de ginásio. O rubro-negro é, ao lado de Rio Claro, o único time que está entre os cinco piores em público e taxa de ocupação. E isso não é de hoje, que fique claro. O cenário nos últimos campeonatos é idêntico. Que conformismo é esse?;

4) Do lado positivo é possível citar a Unifacisa (mais aqui), que em seu ano de estreia na elite do basquete brasileiro possui a melhor taxa de ocupação de ginásio (81%). O time de Campina Grande (PB) tem conseguido fazer um barulho na cidade, envolver comunidade local e trabalhar muito bem suas redes sociais para fazer sucesso;

5) Me parece bem surreal que em um campeonato com 16 times apenas 5 tenham média superior a mil pessoas. Me parece ainda mais surreal que neste grupo de cinco times só tenhamos um, o Corinthians, da turma do futebol. Cada clube tem, ou deveria ter, o seu diagnóstico, mas a realidade é que mesmo para Franca, que tem a maior média de público, há inúmeras coisas para serem feitas (a taxa de ocupação do Pedrocão na Cidade do Basquete fica em 40% e isso é baixíssimo).

Coisas que penso do ponto de vista de gestão agora:

1) Sinto-me muito à vontade para comentar sobre este assunto porque acompanhei TODOS os NBB's desde sua criação (sempre com independência e senso crítico, vocês sabem bem), trabalho com marketing há quase uma década e com o perdão da palavra o que se faz por aqui no basquete brasileiro, nos clubes, em relação a marketing esportivo é triste, lamentável, de qualidade baixíssima quando falamos no tema (com raríssimas exceções – raríssimas!). Se estou usando palavras fortes é porque meu nível de exigência é alto, o potencial que o basquete tem por aqui é gigantesco e há marcas monumentais dentro do NBB para serem trabalhadas. Os números são péssimos e não dá pra dourar a pílula;

2) Os clubes têm a maior parcela de culpa, sim, em relação ao problema do público em seus ginásios, é muito claro isso para mim, mas a Liga Nacional de Basquete precisa urgentemente tratar do tema – nem que seja "apenas" cobrando dos clubes com mais afinco e com mais seriedade em relação a forma de cuidar do produto final. É óbvio que o assunto é endereçado em suas reuniões, está na pauta dos encontros do Conselho de Administração, é algo que não tenho dúvida mexe com o dia a dia de quem toca a LNB, mas os números falam por si e os resultados das ações não têm surtido efeito;

3) Sobre os times, uma pergunta básica: quantos deles possuem um departamento de marketing? Marketing NÃO é uma pessoa de Comunicação que faz release para imprensa e mexe em rede social. Marketing é a arte de atrair e reter clientes, e USA a comunicação em alguns momentos para isso. Perguntar se os clubes possuem uma área de Inteligência de Mercado (a famosa Business Intelligence – BI) me parece devaneio, certo?;

3.1) Sobre a questão do público, existe uma expressão atualmente muito comum chamada de "experiência do usuário" (UX para os íntimos). Os clubes e a Liga Nacional têm se preocupado com isso? Têm tratado bem o seu consumidor em todos os pontos de sua jornada? Da compra de ingresso ao momento em que ele deixa o ginásio? A resposta me parece clara: não.

4) Sobre este ponto de BI, o mesmo vale para a Liga Nacional de Basquete. Quem por lá está consolidando o manancial de dados que há por aí no momento? Quem está fazendo o cruzamento dos números com o perfil dos consumidores do campeonato? Como essas informações são transmitidas para os clubes conseguirem fazer seus trabalhos de fomento ao público?;

4.1) Qual, aliás, é o perfil do consumidor do NBB? Existe um mapeamento de personas (mais aqui) detalhado e em constante atualização? Qualquer empresa para direcionar seus esforços de comunicação e marketing precisa disso. Isso está sendo endereçado?;

A conclusão, em minha modesta opinião, é bem óbvia: ou clubes e Liga Nacional arregaçam as mangas, fazem testes, traçam um diagnóstico e trabalham exaustiva e inteligentemente nisso ou o futuro será nebuloso. Nenhum negócio se sustenta para mais 10 anos dando uma média de mil pessoas por partida em ginásio. E é ruim pra todo mundo – clubes, atletas, dirigentes, técnicos, jornalistas, patrocinadores, meios de comunicação etc.

Minha singela sugestão é que todos os envolvidos sentem o quanto antes, contratem uma consultoria bacana para trabalhar nos pontos mais críticos a partir de ontem e tenham metas claras de onde e como querem chegar. Isso tudo vai custar dinheiro, toma tempo, é estressante, vai mexer em inúmeros vespeiros, abrirá inúmeras caixas-pretas, colocará muita gente contra a parede, mas o cenário é crítico, quase de guerra, e algo precisa ser feito.

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