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Bala na Cesta

É duro dizer isso, mas Gustavo de Conti, bicampeão do NBB, precisa sair do país

Fábio Balassiano

19/06/2019 06h24

Marcelo Cortes / Flamengo

Quase 15 dias se passaram do título do NBB do Flamengo, conquistado de forma brilhante por 81-72 lá em Franca. Foi uma batalha bem legal entre os dois times, com o rubro-negro fechando o duelo em 3-2 para conquistar o seu sexto título. Disso todo mundo já sabe, eu mesmo já escrevi por aqui, mas meu ponto neste texto é falar sobre o técnico Gustavo de Conti, bicampeão nacional de forma consecutiva, com dois times diferentes e com filosofias completamente distintas. E o motivo pelo qual escrevo esse post é simples: Gustavo precisa sair do país. Não agora, não amanhã, mas sim como plano de carreira. Simples assim.

Falo isso com dor no coração, sei que serei apedrejado, sobretudo pela torcida do Flamengo que viu o ótimo trabalho que ele fez nessa temporada, mas para o seu (dele) bem profissional é hora de pensar em voos maiores, voos fora do país. O NBB perderia muito sem a sua figura por aqui, mas o objetivo do texto é ver a vida apenas do profissional – e de como ele poderia manejá-la. Cometerei uma inconfidência, aqui, ao dizer que isso já esteve bem próximo de sair antes da temporada retrasada quando ele recebeu, e recusou, uma proposta do Obras Sanitárias da Argentina. E ele fez bem em refutá-la.

Seu talento, sua capacidade, sua maneira de ver o basquete devem mirar Europa ou Estados Unidos. Ele ainda não tinha vencido nada por aqui. Agora ele já tem dois campeonatos seguidos, e nos dois com vieses completamente distintos, em uma prova camaleônica de um treinador que começou a ver o basquete de uma maneira (mais travado, bem defensivo, totalmente "segurador e furador de bora") e que foi evoluindo na medida que o jogo se transformou (seus times, hoje, são os mais rápidos do Brasil e os que melhor exploram as bolas de três pontos, importante arma do basquete). Falta, claro, um campeonato internacional, algo que ele pode, e deve, conseguir nos próximos anos, mas em nada muda a análise de que um voo pra Europa ou NBA deve ser mapeado e pensado pra sua vida profissional.

Luiz Pires / LNB

Gustavo foi campeão do NBB em 2018 pelo Paulistano com um projeto autoral, dele. Era sua forma de ver o basquete, viver o mundo, e os atletas se adaptavam a ela – e a ele. Não era fácil pros atletas, mas dava certo porque De Conti é excepcional no que faz. Ele entende de tática, entende dos fundamentos, entende de liderança, entende de motivação, entende até mesmo de provocação e como controlar isso em séries finais, onde dominar o ambiente inteiro também ajuda. Assim sendo, todos os jogadores que por ele passaram começaram a temporada de uma maneira e terminaram de forma melhor. Entendendo basquete, fazendo basquete melhor, lendo melhor o basquete, mais intensos, mais confiantes. Durante anos no Paulistano foi assim e não eram raras as vezes que um atleta sob seu comando saía para outro time mega valorizado e, com outro técnico e sendo menos exigido, não performava tão bem quanto no ano anterior. Quando um técnico consegue desenvolver seus jogadores, potencializar as habilidades de sua equipe, ele é um vencedor. Gustavo fez isso e foi além. Com elencos medianos foi duas vezes à final do NBB e venceu em 2018 contra Mogi.

Brilhou, foi valorizado e veio ao Flamengo com uma proposta diferente. Veio para dirigir estrelas, dirigir as famosas "cobras criadas", jogadores veteranos que nem sempre gostam de ser questionados, de ter seus métodos revistos, de ser levados ao limite – como Gustavo sempre fez. Ele mesmo, conforme admitiu depois do jogo 5 em Franca, errou no começo ao tentar impor a filosofia dele a um elenco completamente diferente ao que ele tinha no Paulistano em 2018. Deu um passo atrás, reviu conceitos, abriu um pouco a guarda, confiou em seus atletas, manteve a essência da coisa e foi bem. Ganhou, de novo, o NBB – desta vez não com um projeto, digamos, autoral, mas em um time de camisa, com veteranos, ganhando um jogo 5 fora de casa.

Marcelo Cortes / Flamengo

É óbvio que Gustavo precisa melhorar. E dá pra melhorar absurdamente em tudo, em todas as suas caixinhas. E ele sabe que tem espaço pra isso. Sua gestão de grupo, e de estrelas, precisa de ajuste. Sua sanha "magnânima" de ficar trocando atleta a cada 3 minutos beira a insanidade (em uma partida do NBB ele usou 39 formações diferentes dentro da partida). Seu jeito intempestivo precisa ser azeitado (e se eu falo isso é porque eu, que sou da mesma maneira, consegui manter a mesma essência mas agindo de forma diferente). Eu só acho que aqui ele já bateu no teto, chegou ao limite. No patamar que alcançou, Gustavo fará final ou será campeão de NBB todo ano, todas as temporadas daqui pra frente. Qual o desafio afinal? Sua reserva de conhecimento, porém, não sei se crescerá tanto apesar de os técnicos daqui evoluírem ano após ano e certamente oferecerem a ele mais e mais dificuldades.

Para um próximo passo, para se tornar um técnico cada vez mais completo, talvez o ideal mesmo seja sair do país, ser assistente em Europa ou, sei lá, NBA. Ele tem bons contatos, boas fontes, ótimos conhecimentos ao redor do mundo. Se testar, ser testado, em outro mundo, em outra língua, em um lugar onde ele não está em sua zona de conforto é sempre difícil, complexo, complicado e desafiador. Mas certamente trará um ganho profissional que não sei se ele terá por aqui nos próximos 5, 10 anos.

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