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Bala na Cesta

Como Kobe e novo técnico estão fazendo do grego do Bucks candidato a MVP da temporada da NBA

Fábio Balassiano

12/02/2019 05h16

No dia 27 de agosto de 2017 Kobe Bryant respondeu assim a Giannis Antetokounmpo no Twitter quando perguntado qual seria o desafio dele, Kobe, para ele, o grego:

Não foi na temporada passada que o pedido de Kobe para Giannis saiu do papel, mas é, sim, bem possível que o "Greek Freak", a "Besta Grega", como é chamado, consiga garantir o famoso troféu de MVP nesta temporada da NBA. E Bryant tem muito a ver com a campanha incrível do Milwaukee Bucks (41-12 após a vitória de ontem contra o Chicago por 112-99 fora de casa, melhor retrospecto da NBA) e com a performance assustadora de Antetokounmpo, autor de 27,1 pontos, 12,6 rebotes, 5,9 assistências e 58% no aproveitamento de arremessos – todos os índices são os melhores de sua carreira.

Foto: Arquivo Pessoal

Bryant tem relação com isso não só, obviamente, pelo tuíte em direção a Giannis, agora com 24 anos e ainda em fase de crescimento técnico, tático e psicológico. Nas férias dessa temporada o grego, que disse não gostar de treinar com atletas em atividade, prática comum entre as estrelas americanas da NBA, perdeu a timidez, pegou o telefone e ligou para Kobe (já aposentado). Pediu para treinar com ele em Los Angeles e o ex-astro do Lakers topou.

Conhecendo a fama de obcecado de seu "treinador", Giannis, o segundo mais votado para o All-Star Game da próxima semana em Charlotte, chegou 3 horas antes do marcado e quando Kobe entrou em quadra (uma hora antes) disse que já havia acabado de treinar. Incrédulo, Bryant olhou pro grego e perguntou o porquê do convite, então. Antetokunmpo saiu da quadra, abriu a sua mochila, tirou um caderno e respondeu: "Minhas dúvidas são mais aqui fora do que dentro da quadra". E o papo fluiu sobre liderança, gestão de time, controle emocional, preparação física, dieta, meditação, respeito aos treinadores, entre outros temas. Os 180 minutos de Giannis com a bola nas mãos se somaram a surreais 3 horas de conversa sem que Kobe pudesse dar um arremesso sequer – e sabemos quão difícil é isso para ele.

Foto: Instagram Bucks (NBA)

Giannis, então, teria outra abordagem nessa temporada. E aí entra outro personagem fundamental. Mike Budenholzer foi assistente técnico do San Antonio Spurs por quase duas décadas, fez excepcional trabalho como técnico recentemente no Atlanta Hawks e recebeu um convite da nova gestão do Bucks pra assumir o comando técnico. Após demitir Jason Kidd, de quem Giannis era bem próximo, o time de Wisconsin sabia que não podia errar.

Fechou contrato com Budenholzer e a primeira coisa que o técnico, que sempre armou times organizados em Atlanta mas NUNCA com um All-Star do calibre de Giannis, fez foi chamar o grego para conversar. Explicou a ele a forma de trabalhar e disse, na lata, que não o via atuando como estava jogando nos anos anteriores (quase que como armador, com muito tempo de bola nas mãos).

Sem entender, Giannis quis saber os motivos e o treinador então sacou o computador para lhe mostrar que as jogadas em que ele era mais efetivo eram as que recebia a bola e partia em direção a cesta no famoso um contra um – e não aquelas em que distribuía o jogo. Um ala-pivô com sua envergadura e sua explosão física batendo em direção ao aro incomoda mais que um armador que não tem no passe a sua principal qualidade, basicamente era isso que o comandante queria dizer.

Tudo alinhado, só faltava então colocar em prática. Budenholzer recebeu um presente da diretoria do Bucks que foi a manutenção do elenco e o fato do time titular cercar MUITO bem Antetokounmpo de talento. Os quatro outros titulares (Eric Bledsoe, Malcolm Brogdon, Brook Lopez e Khris Middleton) têm no mínimo 12 pontos por jogo e, pra ajudar ainda mais a encobrir a maior deficiência do grego, no mínimo 32% de aproveitamento nas bolas longas.

Crédito: AFP

O antigo problema de Giannis (ele está chutando 22% pra 3 nesta temporada, muito baixo realmente) acaba sendo "revisto" pelo complemento que está a seu lado. O time não se ressente das bolas longas da liderança e permite que, assim, o camisa 34 infernize os rivais perto da cesta e passando as bolas para seus companheiros. Em 2017/2018, Antetokounmpo ficava quase 4' do jogo com a bola em suas mãos. Em 2018/2019, menos de 120 segundos. O resultado disso? Recorde de assistências da carreira (5,8) e a liderança do time no quesito (o armador Eric Bledsoe, com 5,6, vem logo a seguir). Nem sempre quantidade é sinônimo de qualidade, não é mesmo?

Antes a bola ficava e morria nas mãos do projeto de armador de Jason Kidd e facilitava a flutuação da marcação em cima dele. Agora os rivais sabem que não podem descolar de seus oponentes porque, caso o façam no jogo de meia quadra, Giannis quicará a bola para o perímetro e verá titulares e as boas armas que vêm do banco (Ersan Ilyasova, George Hill, Tony Snell e o recém-chegado Nikola Mirotic) mandando brasa de três pontos.

Uma prova disso é que o Bucks, que em 2017/2018 tentava apenas 24,7 de longe, hoje é o segundo que mais arrisca de fora com 37,5 (o bom aproveitamento de 35% coloca a franquia no Top10 de conversão. Em contra-ataques, não. A bola normalmente vem para as suas mãos e ele inicia as ações ou partindo com fúria para a cesta ou desmontando as marcações rivais com um ou outro drible.

Outro ponto interessante é que o fato de Giannis ficar mais perto da cesta no ataque e também na defesa fez a equipe crescer em rebotes. De penúltimo dois anos atrás a último no ano passado, a franquia passou a liderar a NBA em rebotes com os 12,5 do grego por noite (mais que a soma de segundo e terceiro do time no quesito).

Através das palavras de Kobe, da sabedoria tática de Budenholzer, do ótimo elenco montado pela diretoria e da fúria de Giannis é que o Bucks busca vencer a primeira série de playoff desde 2001 e chegar à final da NBA pela primeira vez desde 1974.

Ganhar o Leste ainda é algo distante para um time que precisa construir muita coisa na pós-temporada, mas com o grego jogando a bola que está jogando em uma conferência sem LeBron James é possível, sim, que o Milwaukee se torne efetivamente uma das maiores surpresas da temporada.

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