Entre a mudança e a manutenção, Paulistano escolheu correr - e vai se dando bem no NBB
Quando acabou o NBB passado, o técnico Gustavo de Conti tinha sensações distintas ao analisar a temporada do time. Se por um lado chegou pela segunda vez em uma final, algo surpreendente para o investimento financeiro apenas mediano da equipe, por outro tinha muito claro que o Paulistano, derrotado por Bauru por 3-2 na decisão, tinha que mudar.
Não de atletas, mas sim de filosofia. Na cabeça do treinador, um dos mais agitados intelectualmente do país, seu time precisava correr mais, tentar mais, arriscar mais, chutar mais de três, acelerar mais as ações ofensivas. Jogar, no final das contas, como a gente vê 90% dos times da NBA fazendo. Adaptando a ideia norte-americana de tentar muito, de procurar sempre o chute mais valioso (o de três pontos) e o de pressionar defensivamente o adversário até dizer chega, a realidade brasileira o Paulistano vai se dando bem. Foi campeão Paulista ao vencer Franca no quinto jogo fora de casa e agora está na vice-liderança do NBB com 13-3 e incríveis 11 vitórias consecutivas. Os números comparativos entre uma temporada e outra falam si só:
Mais do que o número de posses de bola do próprio Paulistano, alguns dados chamam a atenção: o time lidera o NBB em arremessos de 3 tentados (33,5/jogo, 20% a mais que o Vasco, o segundo que mais arrisca), em posses de bola (90,1 e com cinco arremessos a mais que vitória e dez a mais que o Pinheiros, segundo e terceiro neste quesito), em assistências (20,5 em 28 arremessos convertidos por partida) e, aderindo de vez à filosofia de Gustavo de Conti, é o segundo que MENOS arremessa de dois pontos (33,6). Dividindo a bola, o time tem um cestinha (Kyle Fuller) com apenas 13,4 pontos de média e o banco produzindo mais que um terço dos pontos totais da equipe (32,5 dos 82,3 pontos).
Mas não é só isso, não. Na dúvida entre tentar de perto ou um arremesso mais seguro (conversão de 49% no campeonato) ou tentar mais de longe o Paulistano deixa claro – vai dar alguns passos pra trás em busca da bola mais valiosa. Não é coincidência que os arremessos/jogo de 2 (33,6) e de 3 (33,5) estejam na proporção de um pra um, algo inédito na história do NBB e que faz os puristas se coçarem todos com tanta modernidade. Na real, este é o basquete atual e não há muito como fugir. Mais dia, menos dia, isso vai chegar ao mundo todo (talvez na Europa por último).
Para colocar em prática a sua ideia, Gustavo de Conti aplica bastante de sua filosofia de intensa rotação (10 jogadores jogam 12+ minutos) e conta com um elenco escolhido realmente a dedo para atirar de forma consistente de fora. Quatro atletas (Fuller, Deryk, Lucas Dias e Jhonathan) tentam no mínimo três vezes de três por jogo. Do banco ainda sai o baixinho Yago, um azougue para as defesas adversárias que na semana passada colocou 31 pontos em Bauru costurando a marcação de maneira inacreditável. Os pivôs (Guilherme, Nesbitt e Du Sommer) são leves e capazes de correr a quadra para ao mesmo tempo abrir espaço para os arremessos de seus companheiros como também para retornar à defesa em caso da bola no ataque não cair. Nas alas, os físicos Jhonathan e Eddy dão consistência defensiva e protegem perímetro e garrafão.
Para tudo isso dar certo, vale destacar a presença do armador Elinho. Em sua segunda passagem pelo clube, ele se tornou titular e tem as rédeas de Gustavo de Conti para acelerar o ataque e distribuir o jogo. São 7,3 assistências por jogo, melhor índice do torneio e uma aceleração incrível do time para ir ao ataque. Com Elinho, Gustavo conseguiu deixar Deryk, que veio de Brasília, na posição de ala-armador (fora da bola) e revezar a armação com Yago, que vem do banco não para cadenciar coisa alguma, mas sim para dar ainda mais fogo / velocidade a equipe.
Pode parecer pouco e talvez não dê resultado final naquilo que é o objetivo do Paulistano nesta temporada (o título), mas a maneira como a equipe, que jogará neste final de semana a Liga das Américas representando o país ao lado de Mogi, tem atuado nesta temporada do NBB enche os olhos. É uma mistura de treinamento com alto risco que faz muito bem ao basquete nacional. O problema nunca esteve em arremessar muito. A questão toda é como se chuta, com quem se chuta e que tipo de treinamento é feito para se chutar. Como se vê, está dando certo pra turma da capital de São Paulo.
Entre a manutenção do (seu) status quo e a busca pelo desconhecido, por um estilo de jogo que nunca tinha praticado com o seu Paulistano, Gustavo de Conti escolheu sair da zona de conforto. E só isso já merece ser elogiado.
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