Isiah Thomas ficou de fora do Dream Team e o motivo foi Michael Jordan - entenda!
No dia 31 de julho de 1992 o Dream Team enfrentaria a seleção brasileira na Olimpíada de Barcelona. Após vencer Angola, Croácia e Alemanha, o time americano fez 127-83. Naquela noite na Catalunha Michael Jordan terminou com 15 pontos, e do outro lado do oceano alguém olhava os Jogos com o coração machucado. Era Isiah Thomas, craque do Detroit Pistons, certamente entre os melhores da NBA à época e não convocado pela Federação norte-americana (USA Basketball) a pedido de Jordan.
Pra entender um pouco da rivalidade entre Isiah Thomas e Michael Jordan é preciso voltar um pouco para a década de 80. Natural de Chicago, Isiah era considerado o melhor jogador já nascido em Illinois. Ágil com a bola nas mãos, personalidade forte, dono de visão de jogo acima da média e explosivo para pontuar, ele foi campeão pela Universidade de Indiana, era um ídolo já de todo país quando colocou seu nome no Draft de 1981, mas o time de sua cidade-natal não conseguiu selecioná-lo porque com a segunda posição o Detroit Pistons escolheu o armador. A franquia Bulls tentou inúmeras trocas com o Pistons, mas ninguém de Detroit pensou em se desfazer do cara que vestiria a camisa 11 por mais de uma década em Michigan.
Quando Isiah saiu da faculdade começou a surgir outro nome no país. Era o de Michael Jordan, que foi campeão universitário por North Carolina e logo depois, em 1984, foi selecionado pelo Chicago Bulls. Havia, claramente, uma animosidade entre eles desde o começo da carreira profissional de Jordan na NBA. Michael queria tomar de Isiah o posto de melhor jogador da cidade de Chicago e também vencer campeonatos rapidamente. Thomas, por sua vez, queria, mesmo jogando em Detroit, seguir mostrando quem ainda mandava na cidade em que nasceu. O choque era inevitável. E começou cedo.
No All-Star Game de 1985 disputado em Indianápolis o mundo todo queria ver o novato de Chicago na festa principal. Michael Jordan terminaria a temporada de calouro com 28,2 pontos de média, assombrava o mundo, havia sido selecionado para o torneio de enterradas (perderia para Dominique Wilkins em uma disputa que também contou com ninguém menos que Julius Erving, Larry Nance e Clyde Drexler), mas o choque veio quando a NBA anunciou que MJ seria TITULAR do All-Star Game, a festa principal.
Isiah não curtiu, arremessou mais do que fazia normalmente em seu time (14 tentativas em 25 minutos), terminou com 22 pontos e todos ali viram que o armador do Detroit boicotou o calouro Michael Jordan, que mesmo jogando 22 minutos só teve 9 oportunidades de arremesso, terminando com apenas 7 pontos. O que era animosidade ficaria ainda pior nos anos seguintes.
Michael Jordan era o queridinho de uma liga que buscava novos rostos, já que Larry Bird e Magic Johnson, os astros da NBA na década de 80, estavam se encaminhando pro final da carreira. Isiah e os Pistons se sentiram preteridos, aderiram de vez a alcunha dos Bad Boys e passaram a ligar menos para a repercussão de seus atos e mais para os resultados que aquele timaço conseguiria. A união da equipe, o jogo físico, as confusões e as vitórias seriam as marcas registradas de uma equipe que marcou época no basquete mundial. Pra azar de Jordan, o seu Bulls e aquele Detroit se encontrariam três vezes seguidas nos playoffs do Leste.
Tudo bem que era um time em formação (o Bulls) contra um já consolidado, mas o fato cristalino é que o Detroit amassou o Chicago nos playoffs de 1988, 1989 e 1990, ganhando não só na bola, mas sobretudo mentalmente de Michael Jordan e Scottie Pippen. A resposta dos Bad Boys não era simplesmente destroçar física e psicologicamente o rival, mas ir longe nos playoffs.
Aquele timaço chegou a três finais seguidas, venceu dois títulos, mas ninguém dava o crédito merecido a Isiah e seus companheiros. Do outro lado, quem já leu as biografias de Jordan sabe o quanto ele se esforçou não pra ser o melhor de todos os tempos, mas para bater o (para ele) odiado Pistons de Isiah Thomas, algo que acabou acontecendo apenas em 1991. MJ era marcado de forma implacável, e em inúmeras vezes foi jogado ao solo por Dennis Rodman, Bill Laimbeer e Joe Dumars. O Detroit cunhou o "Jordan Rules", estratégia defensiva que ficou conhecida na década de 80 porque conseguia tirar um pouco da efetividade do camisa 23 nos playoffs.
Quando a ideia do Dream Team foi formatada em 1991, Rod Thorn foi o encarregado pela USA Basketball para ser uma espécie de general-manager daquele inesquecível time. Era dele a missão de fazer os convites aos atletas que formariam a melhor equipe de basquete de todos os tempos.
Se o objetivo de David Stern, o chefão da NBA, era internacionalizar o seu produto, como disse aqui na semana passada, e o da USA Basketball era o de colocar o melhor time possível em quadra em Barcelona, o principal nome seria o de Michael Jordan. Para azar de Isiah, Thorn era o manda-chuva do Bulls no Draft de 1984. Foi dele, Thorn, a escolha que mudaria a escolha do Chicago e de toda modalidade. A relação de Rod com MJ era, portanto, visceral, próxima e de muito tempo.
Conforme detalha o excepcional livro "Dream Team", do jornalista Jack McCallum, na primeira conversa entre eles, em setembro de 1991, o posicionamento de Jordan foi claro: "Hey, Rod, estou muito honrado com o convite. Você sabe que eu amo jogar pela seleção, fui campeão olímpico em 1984, em Los Angeles, e tenho muita vontade de atuar em Barcelona. Mas sendo muito sincero, se Isiah Thomas estiver no elenco eu prefiro ficar de fora. A decisão é sua". E a decisão de Thorn era muito óbvia. Entre Jordan e Isiah, o craque do Pistons teria que ficar de fora. O cruel da história é que o técnico daquele elenco seria Chuck Daly, que dirigia, à época… o Detroit de Isiah.
No momento seguinte a divulgação da notícia de que Isiah Thomas ficaria de fora da seleção norte-americana muitos jogadores chegaram a comunicar para a imprensa que por eles não haveria problemas em lidar com Isiah, considerado um atleta de temperamento forte e jogando para um time que triturava as demais franquias com um jogo físico e recheado de provocações. A verdade, verdade mesmo, não era aquela.
Em seu livro mais recente, "When the Game was ours", Magic Johnson, astro do Los Angeles Lakers, conta que era puro jogo de cena: "Falávamos o que era politicamente correto para a mídia na época em relação a Isiah, mas a real é que nenhum de nós gostaria de contar com Thomas naquele time. Nosso elenco era um grupo que se gostava, que apesar da rivalidade entre os times tinha um apreço gigantesco internamente, e ter alguém que havia brigado com todo mundo na década anterior não faria o menor sentido. Isiah colheu o que plantou, matando ele próprio as suas chances de jogar no Dream Team", escreveu Magic.
E assim foi. Mesmo sendo sem dúvida alguma um dos craques da NBA na década de 80 e principal responsável por guiar o Detroit Pistons a três finais seguidas da liga Isiah ficou em casa, em Chicago, assistindo às Olimpíadas de Barcelona. Entrevistado pelo blog em 2015 no All-Star Game de Nova Iorque, ele respondeu o seguinte quando o perguntei sobre a sua ausência nos Jogos de 1992: "Sendo muito sincero: adorava competir contra Chicago e adorava competir contra Michael Jordan. E o jogo te leva a algumas vitórias memoráveis e a algumas derrotas torturantes. Não ter ido aos Jogos Olímpicos de Barcelona em 1992 me machucou demais, muito mesmo. Foi um momento de cortar o coração, que doeu bastante, um dos mais difíceis da minha carreira. Ao mesmo tempo, fiquei muito feliz que a medalha de ouro veio ao meu país. Queria muito ter estado lá, pois fiz parte daquela geração, mas como não estava eu só podia fazer uma coisa – torcer por eles. E foi o que eu fiz da minha casa".
Isiah escolheu uma causa. A da sua equipe. Ganhou muito com o Detroit Pistons, onde é venerado até hoje, mas acabou perdendo a chance de fazer parte do melhor time da história do basquete devido a desavenças principalmente com Michael Jordan.
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