Como um armador baixinho e desprezado no Draft virou o novo ídolo do Boston Celtics na NBA
No dia 23 de junho de 2011 todos os olhos daquele Draft estavam em Kyrie Irving e Derrick Williams. De Universidades renomadas (Duke e Arizona, respectivamente), eles seriam escolhidos nas duas primeiras posições por Cleveland Cavs e Minnesota Timberwolves. Primeiro a selecionar, o Cavs mandou ver em Kyrie, e vocês sabem o que o camisa 2 tem feito em Ohio desde que entrou na liga. O Minnesota não teve muita dúvida e foi em Derrick Williams logo depois. Enes Kanter, Tristan Thompson, Jonas Valanciunas, Jan Vesely, Bismack Biyombo, Brandon Knight, Kemba Walker e Jimmer Fredette seguiram a ordem das primeiras dez posições em uma noite que teve uma das trocas mais incríveis da história da NBA. O Indiana pegou George Hill, armador, mas despachou o seu pick, um rapaz chamado Kawhi Leonard (décima-quinta posição) para o San Antonio Spurs. Três anos depois Kawhi seria não só campeão, mas MVP das finais de 2014 com a franquia texana. Dois anos depois o Pacers mandaria Hill pra Utah.
O Draft seguiu, nomes como Klay Thompson (o décimo-primeiro) surgiram, fechou a sua primeira rodada com Jimmy Butler, do Chicago Bulls, mas segundas rodadas normalmente aparecem gringos que serão emprestados pelas franquias da NBA para a Europa. E assim a noite de 23 junho ia acabando. Nas posições 54, 56, 57, 58 e 59, só estrangeiro (Milan Mačvan, da Sérvia, Chukwudiebere Maduabum, da Nigéria, Tanguy Ngombo, do Catar, Ater Majok, da Austrália, e Ádám Hanga, da Hungria) e ao que tudo indicava a última escolha daquele dia iria pelo mesmo caminho. Mas é o Sacramento Kings, sabe como é. Os caras são diferentes – para o bem ou para o mal. E havia um baixinho disponível ainda. Era Isaiah Thomas, de 1,75m e produto da Universidade de Washington. Como assim alguém que teve três temporadas seguidas com no mínimo 15 pontos de média seria ignorado? Os dirigentes da Califórnia matutaram isso, viram que só tinham Tyreke Evans como armador no elenco e pensaram em Isaiah para ser reserva de Evans. Era uma opção. A última opção. E assim foi feito.
Um fato interessante sobre o nome da escolha de número 60 é que ele foi dado devido a uma aposta. Seu pai James, cujo time do coração era o Los Angeles Lakers, perdeu uma brincadeira para um amigo cujo time era o Detroit Pistons, do craque Isiah Thomas. James, então, prometeu que seu filho teria o nome do craque do time rival. E assim foi feito, mas com uma ressalva. A futura mamãe gostava do nome, mas não exatamente pelo basquete. Tina gostava da pronúncia que lembrava a do nome bíblico de um profeta e cujo significado era salvação. Entre a aposta do pai e o desejo bíblico da mãe, o casal Thomas se acertou em pagar a aposta com um asterisco. Nascia em 7 de fevereiro de 1989 Isaiah Jamar Thomas em Tacoma, Washington. E querem ver uma coisinha engraçada? Meses depois do nascimento de Isaiah os Lakers perderam a final para o Detroit, de Isiah.
Sua carreira na NBA começou no banco. Muito banco. Até o dia 26 de dezembro ele sequer havia pisado na quadra. Foi quando o técnico Keith Smart chamou Isaiah para fazer a sua estreia contra… o Los Angeles Lakers, time do pai. Foram 13 minutos, 5 pontos e 2 assistências. No dia seguinte contra o Portland, mais 11 minutos e 6 pontos. No começo de 2012, a primeira partida com mais de 10 pontos de sua carreira. Diante do Memphis em 3 de janeiro, 15 pontos em 16 minutos. Menos de 10 dias depois, a primeira vez com 20 pontos (contra o Toronto em 11/01). Não se tratava, obviamente, de um jogador de segunda rodada como os outros que a liga conhecia.
A temporada seguiu, Isaiah mostrou que não era apenas um baixinho atrevido, tornando-se, na verdade, uma grandíssima e importante arma vindo do banco. Rápido, corajoso, ótimo drible e excelente controle de bola, ele era um inferno para as defesas adversárias, forçando imensos ajustes de cobertura por parte dos rivais e obviamente criando espaços para seus companheiros. O jovem de 22 anos emplacou até uma sequência de oito partidas seguidas com 10+ pontos entre 15 de fevereiro e 2 e março em 2011. No final da temporada, as médias de 11,5 pontos, 4,1 assistências e 25,5 minutos chamavam a atenção, mas na verdade eram diminuídas pelo seu começo com poucos minutos. No total foram 22 dos seus 65 jogos somando 15 ou mais pontos. A fábula da carreira do pick 60 de 1,75m que jogaria muito bem na NBA virava realidade quando, depois do All-Star Game de 2012 Thomas não seria apenas um reserva, mas sim titular da equipe.
Nos dois anos seguintes, a consolidação. Em 2012/2013, 13,9 pontos e 4 assistências em 79 partidas (62 como titular). Em 2013/2014, 20,3 pontos e 6,3 assistências em 72 jogos (54 como titular). Pra azar do Kings, era seu último ano de contrato e o baixinho chamava a atenção. O Phoenix decidiu pagar US$ 27 milhões por 4 anos para reforçar o seu perímetro e o Sacramento preferiu não cobrir a oferta. A ideia que parecia ser boa, porém, acabou se tornando trágica para o Suns, que teria Goran Dragic, Eric Bledsoe e Isaiah disputando espaço, minutos e o vestiário na armação. A franquia precisaria escolher um ou dois deles. E parecia sobrar para Thomas, que nem estava tão mal assim (15,2 pontos em 46 jogos vindo do banco). Logo depois Dragic foi despachado para Miami, ficando apenas Bledsoe por lá.
No dia 19 de fevereiro os rumores se confirmaram. Boston enviou Marcus Thornton e mais um pick para ficar com o baixinho. O primeiro jogo dele vestindo verde (adivinhem) foi contra… o Los Angeles Lakers. Ao todo, 21 pontos vindo do banco, mas uma discussão com a arbitragem fez Isaiah ser expulso. Entrando no vestiário, o camisa 4 pensou que seria repreendido, mas um profissional da comissão técnica o puxou pelo ombro, deu-lhe um abraço e disse: "Cara, ser expulso contra o Lakers logo na estreia? A torcida do Celtics vai amar você. Não abaixe a cabeça". O menino ouviu. Nos 21 jogos daquela temporada, 19 pontos e 5,4 assistências vindo do banco.
No ano seguinte, em 2015/2016, o técnico Brad Stevens lhe conferiu a armação titular. Caberia ao rapaz de 1,75m comandar um dos times mais tradicionais da história da NBA. E como Isaiah Thomas respondeu? Com 22,2 pontos e 6,2 assistências em 32 minutos de média. E sendo um All-Star. E sendo ídolo de uma franquia. E sendo ídolo e principal referência de uma equipe como o Boston Celtics, maior ganhador da NBA.
O roteiro do filme, ou da fábula, já estaria de ótimo tamanho, mas Isaiah, que ainda recebe o salário daquele acordo com o Phoenix Suns que vai até 2017/2018 (é apenas o quinto mais bem pago do Boston na temporada), queria mais para a temporada 2016/2017.
Ficou feliz quando Al Horford foi contratado por quase US$ 120 milhões/4 anos, mas aquele já era o seu time – e continuaria sendo. Na temporada 2016/2017 são 28,4 pontos, 6,1 assistências e 34 minutos de média, um absurdo total e deixar até mesmo Isiah Thomas, mito do Pistons, de boca aberta. O cara é simplesmente o quarto maior cestinha da melhor liga de basquete do planeta, à frente de bambas como Steph Curry, Kevin Durant, DeMar DeRozan, DeMarcus Cousins, Damian Lillard, Lebron James, entre outros. Repito: isso com 1,75m e sendo o pick 60 do Draft de 2011. No Boston Celtics.
Já seria uma história e tanto, não? E se eu disser a vocês que ele é o cestinha do Boston com mais de 10 pontos de vantagem em relação ao segundo maior pontuador da equipe (Avery Bradley tem 17,7 de média)? E se eu disser a vocês que o baixola coloca os Celtics como terceiro time do Leste com 26-15? E se eu disser a vocês que no dia 30 de dezembro ele fez 52 pontos, sendo 29 no último período (maior marca da franquia)? E se eu disser a vocês que desde 19 de novembro o rapaz não tem NENHUMA partida com MENOS de 20 pontos?
Não sei se há história melhor nesta temporada 2016/2017. Um rapaz de 1,75m que tem o nome dado por causa de uma aposta vai pra NBA na última posição do Draft, começa no Sacramento, assina contrato milionário com o Phoenix, é despachado para o Boston, onde a pressão é enorme, mas lá vira ídolo. E que ídolo. Antes do campeonato disse que Isaiah não era armador de time campeão, embora o achasse espetacular. Se ele será campeão nesta liga ainda não dá pra saber, mas o cara é um vencedor. Vencedor que está desmentindo todo mundo que ainda teima em duvidar de sua capacidade desde 2011. Isaiah, corajoso ao extremo, está no caminho para colocar os verdes entre os melhores do Leste – e quem sabe avançar pesado com o elenco na pós-temporada
Baixinho atrevido, craque de bola, All-Star em 2017 mais uma vez e candidato, sim, a MVP da temporada. Que belíssimo roteiro de vida, e de filme, tem Isaiah Thomas.
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