Topo

Bala na Cesta

Murilo fala sobre Bauru e mudanças na sua vida com nascimento dos 4 gêmeos

Fábio Balassiano

11/11/2014 03h21

murilo1A partir desta terça-feira acontece em Mogi o segundo quadrangular semifinal da Liga Sul-Americana. Na semana passada Limeira foi a Argentina, mas não voltou com a vaga (avançaram o Boca Juniors e o uruguaio Malvin). Nesta, Mogi, Brasília e Bauru são os representantes brasileiros (além deles está o equatoriano CKT) que buscam as duas vagas na decisão.

E vem de Bauru uma das histórias mais bacanas desta fase final da Liga Sul-Americana. O pivô Murilo, de 31 anos, ainda é dúvida para as partidas desta semana devido a uma inflamação no tendão patelar esquerdo (os bauruenses estreiam contra Brasília hoje às 17h45, e logo depois os mogianos medem forças com o CKT às 20h), mas sua vida fora das quadras tem sido tão agitada quanto a sua tentativa para voltar a atuar pelo time que o contratou na temporada passada.

Há exatos cinco meses nasceram Gabriel, Leonardo, Maya e Rafaela de uma tacada só. O quarteto de gêmeos se juntou a Duda, de 7 anos, e o time titular do jogador ficou completo. Tudo isso fez a vida mudar, seu foco mudar. Vamos ao papo completo com ele.

murilo2BALA NA CESTA: Como você está para essa fase final da Liga Sul-Americana? Vai para o jogo ou está difícil ainda?
MURILO: Fiz uma avaliação nesta segunda-feira. A ressonância não deu muita coisa. Pode ser que consiga jogar, mas vamos ver. Se não der agora, nas próximas rodadas do NBB quero voltar. Dizem que estou fazendo falta pro time, mas o basquete é que está fazendo falta pra mim. Esta é a realidade.

BNC: Para quem é de longe e nunca foi a Bauru, como eu, como é a estrutura aí? Todos falam muito bem e queria ouvir de você. Além disso, é senso-comum que o planejamento aí da diretoria é ganhar uma competição internacional o quanto antes. É isso mesmo, né?
MURILO: Melhora a cada dia a estrutura. O patrocinador (Paschoalotto) é forte, e do ano passado para este ano o elenco melhorou muito, mas não só isso. O ginásio está sempre lotado e já estão com projeto para construir um novo. Além disso deram uma estrutura absurdamente boa para as categorias de base. Os garotos têm transporte, educação, fisioterapia, alimentação, tudo. Sobre essa questão de ganhar um torneio internacional, conversamos muito sobre isso. Montamos esse time para isso. Intenção é ganhar a Sul-Americana mesmo, para levar a Liga das Américas. A equipe ainda tem muito para entrosar, mas em alguns momentos do jogo mesmo não atuando bem a qualidade individual dos atletas consegue resolver. Todo time passa por isso, e estamos conseguindo segurar na qualidade. Nosso foco é chegar ao Mundial futuramente.

time1BNC: Você é um dos melhores pivôs do país há tempos, mas há cinco meses sua vida mudou. Você já era pai da Duda, de 7 anos, e nasceram seus quatro gêmeos. Mudou muito na rotina da família, imagino, mas e na sua cabeça, na sua maneira de encarar as coisas?
MURILO: Sempre fui uma pessoa muito responsável, e quando os gêmeos nasceram eu vi que essa galerinha dependeria de mim ainda. Você acaba ficando mais maduro querendo ou não. É quase que automático. Antes de ter filhos só tinha o basquete para me preocupar. Quando os filhos nascem a vida muda. O orçamento me deixou com a corda no pescoço, mas ao mesmo tempo estou muito feliz. Estou na fase mais difícil da minha carreira, cheio de lesão, mas chego em casa e vejo o sorriso deles. Muda tudo. Quando fiz o exame recentemente e vi a inflamação do meu joelho estava arrasado. Foi um dia triste, estava pra baixo. Aí meu filho acordou, começou a chorar e fui lá ver. Este mesmo dia foi a primeira vez que ele deu uma gargalhada. Aí eu desabei de emoção e passei a dar mais e mais de mim porque quero que eles me vejam em quadra, quero que eles tenham orgulho do pai deles.

time2BNC: Como fica a sua esposa, Patricia, com isso tudo? Imagino que ser mãe de um só já deva dar trabalho. Com quatro ao mesmo tempo…
MURILO: A gente acabou esquecendo um pouco que temos nós dois, a nossa vida. É um dos erros que os casais cometem. Fui ler sobre isso e passamos a nos preocupar mais com o casal. No começo é difícil, não tinha babá, não tinha muita coisa. Hoje já está um clima diferente. Conseguimos adaptar os horários para viver a nossa vida. O mais difícil foi a gravidez. Há as dificuldades normais, mas a dela foi a pior. Saía para viajar, e a Patricia não podia levantar. Ela ficou sete meses deitada e só levantava uma vez por dia. Só quem cuidava mesmo era minha filha mais velha, a Duda, de sete anos. Foram três ou quatro internações até o nascimento dos quatro. Ela gritava de dor, você imagina só como era. Hoje está mais tranquilo. Quem mais sofre é a Duda, a filha pequena, que já entende e sente minha ausência nas viagens. A vantagem é que a casa está sempre cheia.

Murilo 01 - Henrique CostaBNC: A maneira de encarar o basquete mudou? Como você disse a responsabilidade é ainda maior…
MURILO: Claro que mudou. Agora, com urgência, é correr atrás deste semestre que eu quase não joguei. Pretendo ficar em Bauru por muito tempo. Tem muita coisa por fazer ainda. Pensava em jogar até 35 anos, mas agora com os quatro vou até uns 40, sei lá. Enquanto meu corpo aguentar eu vou jogar. Tive que comprar um carro maior, de sete lugares, e tudo isso é custo. Parando de jogar eu não terei a vida que terei hoje em termos financeiros. Estou construindo uma casa. Essa é a minha meta pessoal hoje. Tudo pode dar errado, mas se tiver o meu cantinho com meus filhos e minha esposa já estará de bom tamanho para nós.

muriloBNC: Nesta fase da Sul-Americana você enfrentará um cara muito importante pessoal e profissionalmente. O Fúlvio, agora armador de Brasília, foi seu companheiro em Mogi no começo da carreira e depois em São José, onde vocês chegaram à final do NBB de 2012.
MURILO: É uma amizade muito bacana mesmo. Sou fã dele como armador, como atleta e ele me ajudou muito. Fúlvio esteve presente na minha carreira nos momentos mais importantes. Quando comecei a virar atleta profissional (em Mogi), quando fui seleção paulista e dei um salto muito importante. E depois em São José, onde fui MVP, reboteiro e fomos à final do NBB. Só posso agradecer a ele, sério mesmo. Ele sempre me procurava em quadra, sempre tentava me ajudar. Nos últimos anos em São José nem precisávamos falar, era só olhar que já sabíamos o que fazer. Ele vai nos dar trabalho. Conversamos normalmente, mas nessa semana não nos falamos. No dia do jogo você quer ganhar, faz parte.

ricBNC: Tem uma coisa interessante. Você jogou com o Fúlvio em São José, e o reserva dele era o Ricardo Fischer, que, ainda muito novo, aprendeu muito rápido e hoje é titular e peça fundamental em Bauru. É possível comparar os dois? Ou não tem nada a ver?
MURILO: Posso comparar o Ricardo de agora com o Fulvio no começo de carreira em Mogi. Assim eu acho possível. É indiscutível a qualidade téccnica do Ricardo, mas o que mais me chamou a atenção quando ele chegou a São José foi a personalidade. A maneira como ele entrava nos jogos era incrível. Agora, mais experiente, isso só vai melhorando. São dois jogadores decisivos e não se intimidam, vão pra briga. Isso é uma característica de ambos.

Murilo 03 - Henrique CostaBNC: Você faz parte de uma geração do basquete brasileiro que pegou muitos problemas em nacionais da CBB e que viu nascer o NBB. Como foi viver isso tudo?
MURILO: O NBB eu olho com muito orgulho. Me orgulho muito de ter feito parte de todas as edições. A cada ano o negócio melhora mais, se torna mais profissional. Primeiro Jogo das Estrelas. Depois TV Aberta. Agora muitos gringos. Depois muitos jogadores sendo repatriados. Agora três jogos na final. Festa de encerramento, de lançamento. Se tudo ainda não é perfeito, é visível que a cada ano evolui-se um pouco mais. A galera mais veterana conversa muito sobre isso. Pegamos uma fase ruim do basquete brasileiro. Teve campeonato que não teve final. Eu participei porque jogava em Franca e não foi bacana. Logo depois nasceu o NBB. Quem vai colher os frutos é essa molecada que está começando agora, não tenho dúvidas. Fico feliz em ter iniciado, de verdade mesmo. Depois, no final da carreira ou parando de jogar, estamos prontos a ajudá-los no que for necessário, seja na parte técnica, na organização, no que for.

muriloseleBNC: Pra fechar, uma pergunta que é quase que consenso de quem acompanha basquete. Sempre que sai uma convocação e seu nome não está as pessoas perguntam o motivo. Como isso bate para você? Ainda pensa em seleção?
MURILO: Lógico que penso em seleção, sim. Até meu último ano de basquete, se eu estiver bem fisicamente, eu vou caso seja chamado. Se eu não fui convocado foi por escolha do técnico. Mas respeito isso e pretendo voltar. O ano que fui MVP do NBB, em 2012, fui para a seleção B, e não fui chamado mais. Paciência, faz parte, não posso desanimar. Mas, claro, bate uma tristeza. Para você ter ideia de como esse lance de seleção funciona para mim. Neste ano que foi o nascimento dos meus filhos. Eles nasceram 7 de junho. Teria a convocação logo depois e muita gente ficava me perguntando se iria jogar. E dizia: "Claro que vou jogar". Só que não fui chamado. Não misturo as coisas, pessoais e profissionais, mas mesmo com o nascimento dos quatro eu iria vestir a camisa do país. A vida continua, torço muito pelos caras e quem está lá fez por quem merecer.

Sobre o blog

Por aqui você verá a análise crítica sobre tudo o que acontece no basquete mundial (NBB, NBA, seleções, Euroliga e feminino), entrevistas, vídeos, bate-papo e muito mais.