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Bala na Cesta

Sobre a chegada de Marcel para ser técnico do Pinheiros

Fábio Balassiano

19/05/2014 10h59

sergio1A semana que passou foi agitadíssima fora das quadras no basquete nacional. Três trocas de técnicos no NBB chamaram a atenção. Limeira não ficará com Demétrius, e Brasília optou por não dar novo contrato a Sergio Hernandez (foto à direita). Do meu canto acho eu não gostei. O limeirense vinha fazendo um bom trabalho com um time médio. E o argentino poderia ter mais tempo para implantar sua filosofia em um time acostumado a jogar há anos do mesmo jeito. As duas agremiações pecaram pela não continuidade ao meu ver.

Mas a mudança que é tema deste texto vem da capital de São Paulo. O Pinheiros decidiu trocar o seu comando. O veterano Cláudio Mortari, campeão de tudo em sua carreira, sai da beira da quadra e vira Coordenador Técnico. Pode-se gostar ou não do estilo de Mortari (não é o dos meus sonhos), mas é importante ressaltar seus méritos e suas conquistas. Foram finais de Liga das Américas (um caneco), Paulista (um título), Interligas, Liga Sul-Americana, Mundial etc. . Mérito ele tem, né. Para o seu lugar, o clube contratou Marcel de Souza, que fará sua estreia no NBB na sétima edição (aqui e aqui lances dele como jogador para quem precisa de referência).

Em primeiro lugar, vale elogiar o arrojo da diretoria do clube dos Jardins. Não é fácil trocar em time que está ganhando. O Diretor João Fernando Rossi (um dos poucos bons do cenário nacional), por sua vez, optou pela transformação, o que mostra que ele pensa muito mais em inovação/melhora do que em manutenção/estagnação, o que é ótimo. Fala muito sobre ele e sobre o status alcançado (justamente) pela agremiação recentemente. É para se aplaudir a contratação, sem dúvida alguma. E ao mesmo tempo para se estranhar que alguém como Marcel tenha ficado tanto tempo de lado, como se fosse mais um na multidão (algo que decididamente ele não é). Inacreditavelmente (e absurdamente), no basquete do Brasil quem pensa, critica e dialoga acaba sendo "marginalizado" pelo status quo, algo que aconteceu com Marcel, que há mais de 20 anos fala sobre os problemas de treinamento no país (algo que qualquer cego enxerga, mas que quando pontuado gera melindre).

Marcel1O tema central para saber se o Pinheiros acertou na aquisição atende mesmo pelo nome de Marcel de Souza, cujo currículo carece de maiores explicações (mas se quiser, é só clicar aqui, aqui , aqui e aqui).

O grande ponto é o seguinte: Marcel entende do jogo, Marcel entende o jogo que é jogado hoje, entende os conceitos do jogo atual. Sua leitura dos jogos, do cenário da modalidade, do que pensam os atletas é sublime, e todos que têm o prazer de conviver com ele sabem disso. É o mais importante para alguém assumir um cargo no basquete, é um fato. Quem viu o seu São Bernardo jogar há quase uma década sabe do que estou falando (aqui uma coluna do Melk relembra isso). Seu time jogava bonito (ataque organizado, sem precipitações), os fundamentos (passes, dribles, posicionamento) eram bem trabalhados e a defesa era agressiva (falei um pouco sobre isso recentemente aqui). Estudioso, meticuloso, inquieto, crítico, ansioso para que as coisas mudem e dêem certo (o que é uma qualidade, pois o cenário está longe de ser bom por aqui) e longe de ser conformado, não tenho dúvida em afirmar que bagagem tática Marcel tem para dirigir qualquer time no Brasil. Quanto a isso, até pelas conversas que já tive com ele, não há o que temer.

marcel1É o essencial, claro, mas não tudo. No Pinheiros Marcel comandará uma equipe (e uma equipe com aspirações altas) em competições de ponta pela primeira vez em quase 10 anos (sim, já foram seis NBB's e ele JAMAIS havia sido lembrado por QUALQUER equipe – insisto neste ponto). Depois de São Bernardo, passagens por Barueri e Jundiaí, mas nada grande – e ele sabe disso.

Preocupa o fato de ele estar longe das quadras há anos. Preocupa, também, o fato de seu gênio ser difícil de domar. Como é muito inteligente (bem mais do que a maioria), suas visões acabam se confirmando lá na frente – e nem sempre as pessoas gostam de ver/ouvir isso muito antes. Por isso, já houve muito choque (de ideias).

Creio, pelo que coloquei acima, que não só a parte tática/técnica da coisa deva ser levada em conta para fazer a análise de seu trabalho (trabalho que pode ser que demore a "pegar" devido ao tempo de inatividade, o que me parece BEM natural). Aspectos de liderança, de gestão de pessoas e de condução de problemas estarão, tanto quanto a parte técnica do basquete, na ordem do dia por parte dos críticos, dos jogadores e de quem o contratou. Ter paciência (com os problemas que virão) será vital para Marcel conseguir colocar na quadra aquilo que tem em sua efervescente (no sentido criativo da coisa) cabeça.

marcel

No Pinheiros, Marcel de Souza, uma das melhores cabeças pensantes do basquete nacional, terá TUDO o que nunca teve desde que decidiu ser técnico: estrutura, elenco bom (de experientes com bagagem a jovens que precisam ser lapidados), dirigentes a apoiá-lo, pressão por resultados e uma única preocupação – os treinamentos de seus comandados (o tal treinamento apropriado que ele sempre cita). Algo que não acontecia tanto recentemente. Nos seus últimos trabalhos sua cabeça precisava funcionar como a de um administrador, de um financeiro, médico (algo que ele também é…), psicólogo, tudo. Em um cenário competitivo, profissional e exigente, como é o do basquete, não é a melhor das coisas, obviamente.

Em seu novo-antigo clube (dirigiu o Pinheiros há mais de uma década, tendo revelado, entre outros, Guilherme Giovannoni), o eterno camisa 11 da seleção brasileira sabe que terá uma imensa e valiosa estrutura para acompanhá-lo. Se Marcel conseguir colocar, na prática, aquilo que prega na teoria há anos sem dúvida será um dos destaques do próximo NBB.

Se vai dar certo ninguém sabe (nem Rossi, nem Marcel), mas é uma jogada que merece ser observada bem de perto. O momento que o técnico tanto sonhava/merecia/precisava chegou.

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