'Velho', alemão Nowitzki sente falta dos veteranos no All-Star Game
* O blogueiro viajou a convite do Canal Space
Dirk Nowitzki viveu sensações diferentes em Nova Orleans no fim de semana das estrelas que terminou domingo. Aos 35 anos, o alemão voltava à festa depois de dois anos e estava feliz por isso (já são 12 convocações para o All-Star em sua carreira de 15 temporadas na NBA). Por outro lado, ele olhava para o lado e não encontrava nenhum companheiro de sua geração (Allen Iverson, Tim Duncan, Kevin Garnett, Jason Kidd, Shaquille O'Neal e Kobe Bryant – este lesionado).
Por ser o mais velho em um jogo cada vez mais recheado de jovens (eram seis estreantes), Dirk era constantemente alvo de brincadeiras (principalmente de Blake Griffin, que brincava de arremessar em um pé só, tal qual faz o germânico), mas levava numa boa. Conversei com ele sobre seus difusos sentimentos na Louisiana, carreira, seleção, o momento do Dallas Mavericks e, claro, futebol, uma de suas grandes paixões.
BALA NA CESTA: Este é o seu décimo-segundo All-Star, o primeiro depois de um ano de ausência. Qual é a sensação de participar do jogo aqui em Nova Orleans?
DIRK: Ao mesmo tempo em que fico feliz e honrado de ser lembrado depois de dois anos difíceis, recheados de lesões, fico um pouco desnorteado de chegar aqui e não ver os caras que participavam comigo dos All-Stars desde que cheguei à liga. O mais especial de todos foi o primeiro, no ano de 2002, na Filadélfia. Estava muito deslocado e todos aqueles caras que eu tinha como referências me trataram tão bem que não consigo esquecer. E hoje eu olho pro lado e não vejo Tim Duncan, Kevin Garnett, Jason Kidd, Shaquille O'Neal, Kobe Bryant, Allen Iverson, Paul Pierce. É um pouco triste, sabe! Ontem mesmo eu estava falando com um amigo "Onde estão os caras? Sobrei aqui…" e ficamos refletindo sobre isso. É uma sensação bem estranha. Eu quero estar entre os melhores, é óbvio, eu gosto de estar aqui, é muito bom ser selecionado. Mas não conviver com a turma da última década faz com que seja bem estranho tudo isso aqui também. Agora eu sou o velhinho da turma, né.
BNC: Você tocou no nome do Jason Kidd. Como tem sido para você ver o seu ex-companheiro como técnico do Brooklyn?
DIRK: Não é fácil, principalmente pelo começo que ele e o time tiveram por lá. Acompanho de longe, mas tento não conversar muito com ele. Jason é um amigo que criei no basquete, um dos melhores jogadores com quem atuei, mas agora ele é treinador de um time rival, né. Houve muitas lesões no início da temporada, ele deve ter sofrido com isso, mas agora o Nets parece ter encontrado uma identidade. Eles têm boas armas, e eu não gostaria de enfrentá-los em uma primeira rodada de playoff, não. Joe Johnson, um All-Star, dois Hall da Fama (Pierce e Garnett) e Deron Williams. Ia dar certo quando todos tivessem juntos em quadra, porque Kidd entende do jogo como poucos.
BNC: Deu pra perceber que os jogadores brincam muito com você, né. No treino de sábado Blake Griffin, Kevin Love e Stephen Curry ficavam tentando imitar o seu arremesso em uma perna só…
DIRK: (Risos) Pra você ver. Sou quase um idoso aqui no meio deles e eles ficam me sacaneando (risos). Mas eu sei que é com respeito, então está valendo. Eles se divertem bastante. O Love disse que tentou fazer o arremesso em uma perna só antes da temporada e não conseguiu. Perguntou como eu fazia, foi divertido.
BNC: Então, me tira uma dúvida: desde quando você começou a arremessar assim, jogando o peso do corpo todo em cima de uma perna só? Lembro que quando você começou na liga não era assim, não…
DIRK: Não, não era mesmo. Você tem razão. Não sei exatamente em qual temporada foi isso, acho que em 2004, mas eu adotei isso para ter uma vantagem competitiva contra meus marcadores. Quando você joga o peso do corpo todo em uma perna só, consegue abrir mais espaço entre as pernas e dificulta a ação do marcador. Foi tudo pensado, não foi nada coincidência. Não me lembro exatamente como, mas eu percebia que os marcadores colavam o corpo perto de mim e eu não tinha espaço para fazer os drives (arranques). Então eu tinha duas opções: ou bater de frente e enfrentar o rival, usando uma arma que não me favoreceria nunca (o físico), ou usar a envergadura que eu tenho para abrir espaço em relação ao defensor e, mesmo com ele colado, conseguir criar uma distância razoável para arremessar com alguma folga. Acabou dando certo. Hoje eu vejo o Kevin Durant fazendo isso, o Kobe Bryant também (aqui um vídeo completo sobre isso).
BNC: O Kobe também?
DIRK: Sim, ele mesmo. Cara, teve um jogo em Los Angeles contra a gente que o Kobe fez este tipo de arremesso em um pé só na lateral, todo marcado pelo (Josh) Howard, com cronômetro zerando para o fim de um período. A bola caiu, e o Kobe olhou pra mim e disse: "Ei, alemão, aprendi bem?". Eu ri. Acho que foi naquele jogo que ele fez 815 pontos na gente em três períodos (Nota do Editor: foram 62 pontos em 33 minutos no dia 20 de dezembro de 2005 – aqui o vídeo). Na verdade não existe um único arremesso que o Kobe não saiba fazer, né.
BNC: Uma das grandes conversas que há na NBA atual é a dificuldade que há em se encontrar pivôs e alas-pivôs que gostem e saibam jogar perto da cesta. O jogo acabou migrando muito para o perímetro?
DIRK: Pode ser que por eu ser alemão esta discussão não faça muito sentido. E te explico o porquê. Você não é americano, então poderá me entender melhor. Você deve saber, mas aqui, até pouco tempo atrás, não era permitido marcar por zona, alguns tipos de ações defensivas eram punidas etc. . Com as mudanças das regras, a marcação por zona acabou virando uma grande arma dos técnicos e o jogo acabou mudando. Meu time mesmo ama utilizar as variações da defesa por zona. E foi assim que fomos campeões anos atrás, né. Mas estas modificações foram naturais, e não impostas. A NBA saiu de um jogo de contra-ataque, velocidade e um-contra-um para algo mais elaborado, algo mais pensado. Ficou mais completa, portanto. E isso só pode ser bom. É só você ver o número de armadores europeus e sul-americanos que estão por aqui nos últimos anos. Manu Ginóbili, Ricky Rubio, Prigioni e todos os outros. Eles não estão aqui simplesmente porque sabem pontuar, mas porque sabem pensar, ler as defesas e atuar contra marcações por zona – algo que estão acostumados desde a infância. Eu acho uma bobagem quando dizem que não há mais jogo de garrafão. Há, há sim. Menos, mas é claro que há. E há menos porque há outras situações, outros complementos que não eram vistos antes. Agora os jogadores são mais completos, mais preparados, mais atléticos, mais prontos para agir e reagir em algumas situações que antes não eram vistas. Não acho que seja um grande problema como as pessoas por aqui às vezes querem pintar. Se a NBA é um produto mundial, o jogo também teve que, digamos, se "internacionalizar" um pouco. Quase 25% dos atletas da NBA não são americanos. Quer dizer algo, não?
BNC: Na temporada passada você jogou apenas da metade pra frente, depois de 13 anos os Mavericks não foram aos playoffs e imagino que a pressão tenha sido grande. Como está sendo pra você neste ano?
DIRK: Muito bom, muito bom. A diretoria fez algumas mexidas, que oxigenaram um pouco o elenco e isso sempre ajuda muito. Pessoalmente acho que ano passado a gente jogou bem, mas já era um pouco tarde quando começamos a reagir e os playoffs não vieram. Pode ser até leviano de minha parte, mas acredito que meu desempenho não seja excelente nesta temporada. Tenho jogado bem, ajudado o time com rebotes e pontos, mas sei que eu e o restante do grupo podemos ir além, podemos fazer mais ainda.
BNC: E o que esperar do Dallas daqui pra frente?
DIRK: Estamos fazendo uma temporada decente, e sabemos que podemos ir bem longe. O Oeste é muito complicado, então temos que ficar sempre em alerta. Da quinta até a décima colocação está tudo muito embolado, e sabemos que qualquer deslize pode custar caro. É o que mais tenho tentado passar ao time. Na semana passada perdemos jogos seguidos e quando fui olhar a tabela estávamos em nono. Ganhamos três consecutivos e estamos sem sexto. Louco isso, não? Mas temos um time forte, um elenco sólido, boas armas ofensivas comigo e com o Monta Ellis. O que precisamos melhorar mesmo é a defesa, que precisa ser mais consistente, e o nosso rebote. Se você pegar os dados, pode reparar que ganhamos quase todas as partidas em que temos um volume de rebotes maior do que o dos adversários. É uma questão de se posicionar melhor, estar mais concentrado. Se tivermos isso estaremos em condição de vencer qualquer um dos nossos adversários.
BNC: O desempenho do Monta Ellis te surpreende?
DIRK: Sim, sinceramente sim. Talentoso todos sabíamos que ele era, pois havíamos enfrentado o Monta algumas vezes e tínhamos noção do impacto que ele poderia trazer. Mas nunca se sabe como uma peça vai se adaptar a um sistema que já existe há algum tempo – como é o nosso caso. Ele traz algo muito importante, e que não tínhamos há algum tempo, que é uma condição de desequilibrar a defesa adversária com infiltrações e dribles. Ele dribla em direção a cesta e pontua ou cria boas condições de chute para mim, (José) Calderón e (Shawn) Marion. Isso é muito importante pra gente e tem rendido bons resultados. Ele é bem explosivo, né. Ele sempre foi e sempre será um grande pontuador, explosivo, mas vê-lo apenas como um cara de cestas é um engano. Ele cria muitas situações para o restante do time também, além de lances-livres.
BNC: Você é um dos grandes arremessadores da história da NBA, isso ninguém tem dúvida. Quem você gosta de ver atualmente? Quem consegue dominar o jogo com chutes hoje em dia?
DIRK: Ah, se eu tiver que citar um eu digo o nome de Stephen Curry, do Golden State Warriors. Gosto do Kevin Durant também. Mas sou um entusiasta do que o Curry faz na quadra. É realmente um absurdo, assustador. O que ele consegue fazer após o drible (off the dribble) é impressionante. A velocidade com que ele quica a bola e sai para a definição é incrível e certamente ele será um dos maiores da história da NBA daqui a alguns anos. Lembro bem que nos playoffs da temporada passada eu olhava pela televisão o que ele fazia, tipo aqueles jogos com 25, 30 pontos em um período, e não acreditava. Toda vez que ele pegava a bola no ataque eu gritava na minha casa para ele chutar. Porque o que ele estava fazendo era de verdade fora do normal, fora dos padrões. Ele será cada vez mais vigiado, mas a sua habilidade em cortar as defesas para logo em seguida sair para o chute faz com que marcá-lo seja uma das tarefas mais complicadas atualmente. Nos 15 anos em que estou aqui não me lembro de ter visto alguém como ele, não. Chutar muitos caras sabem fazer, muitos caras podem fazer. Mas saindo do drible, por cima dos corta-luzes, como ele faz, é quase impossível. E o cara faz parecer fácil.
BNC: Acho que o momento mais especial da sua carreira foi quando você ganhou o título com o Dallas em Miami. E a cena que eu mais me lembro foi quando o cronômetro zerou e você foi para o vestiário chorar (aqui e aqui). Queria que você explicasse um pouco como foi aquela cena, e por que um alemão não pode chorar em público…
DIRK: (Risos) Foi um dos momentos mais especiais da minha vida. É algo que não consigo descrever até hoje, que não consigo medir em palavras. Foi tanto tempo de sofrimento, tanta luta, tantos obstáculos, que a hora que eu vi o título se cristalizando na minha frente eu só consegui correr para o vestiário para me recompor. Você tem razão quando fala da frieza dos alemães. É bem isso mesmo. Fui para um lugar fechado, onde, sozinho, eu poderia dar uma respirada, me emocionar antes de voltar para a quadra. Jamais esquecerei daquele dia porque eu perdi tantas séries de playoff, foi tanta frustração… que quando a gente ganhou eu acabei tendo que extravasar, o que não é comum para mim.
BNC: Você é um apaixonado por futebol, e dentro de alguns meses teremos a Copa do Mundo no meu país, o Brasil. Vai aparecer lá para torcer pela Alemanha? O que está esperando da sua seleção?
DIRK: Você mora em que cidade lá?
BNC: No Rio de Janeiro.
DIRK: Nossa, onde será a final da Copa do Mundo. Que sonho, hein. Aproveite. Mas, bem, eu infelizmente não poderei ir devido a alguns compromissos familiares já previamente agendados. Ficarei torcendo de casa, de longe, e com muita esperança que a Alemanha faça um bom papel. Sei que estamos no grupo da morte, né, com Portugal, Gana e Estados Unidos mas a tradição diz que chegaremos às semifinais. Sempre chegamos às semifinais. Depois disso ninguém sabe (risos). Como um entusiasta do futebol, assistirei às partidas que puder e estou querendo muito saber como será o desempenho do Messi e do Cristiano Ronaldo, meus jogadores favoritos.
BNC: Duas perguntas em uma só: alguma chance de você jogar as Olimpíadas de 2016 no Rio de Janeiro? E quem pode ser o próximo grande jogador europeu a despontar na NBA?
DIRK: Acho que não, acho que não. Não descarto nada mas eu terei 37 anos e não acredito que tenha saúde para jogar no Rio de Janeiro. Adoraria, mas eu não creio. Minha história com a camisa germânica foi linda, e acho que não haverá novos capítulos. Quando você chega a uma certa idade, como eu, o mais interessante a se fazer depois da temporada é ficar estirado em uma cama descansando o seu velho corpo. Sobre o próximo jogador da Europa, eu não posso falar muito pois eu não acompanho. Mas eu leio que o Nikola Mirotic, que irá jogar no Chicago Bulls, tem ido muito bem no Real Madrid.
BNC: Por fim: você já foi MVP de temporada regular e de finais, e campeão da liga de basquete mais importante do mundo. O que ainda te move, o que ainda te motiva?
DIRK: Engraçado, outro dia me perguntaram isso na Alemanha também. O que me motiva é competir, é seguir jogando em alto nível. Pode parecer incrível para quem vê de fora, mas eu ainda sinto que posso evoluir e fazer meus companheiros melhorarem também. Enquanto essa chama estiver acesa pode ter certeza que vou continuar jogando. Tomara que eu consiga voltar a disputar uma final de NBA. É o que mais desejo.
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