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Bala na Cesta

Confiante, Ricardo Fischer assume armação de Bauru e sonha com seleção nesta temporada

Fábio Balassiano

18/03/2013 15h30

No sábado, Ricardo Fischer teve um difícil duelo contra os experientes Hélio e Ronald Ramon, de Limeira. E saiu-se com 20 pontos, sete rebotes e seis assistências. Números de gente grande, sem dúvida alguma. Armador de Bauru, campeão da Liga de Desenvolvimento com a equipe e atuando cada vez com mais confiança, ele conseguiu 12 ou mais pontos em oito das últimas nove partidas e vem jogando muitíssima bola como titular armação do time de Guerrinha (na temporada ele tem 11,1 pontos e 4,3 assistências por jogo, tendo dobrado todos os seus números em relação à temporada passada, quando estava em São José). Conversei com o armador de 1,85m e 21 anos sobre seu momento em Bauru, sua passagem pelo basquete suíço, suas expectativas em relação a seleção brasileira (ele foi convocado para treinar com Rubén Magnano no ano passado) e sobre a sadia disputa com seu companheiro de armação, Larry Taylor, por uma vaga na equipe nacional.

BALA NA CESTA: Muitos técnicos do adulto dizem que além do ritmo de jogo a Liga de Desenvolvimento traz uma questão da confiança importante para os atletas. Isso parece ter acontecido com você, Andrezão e Gui Deodato, cada vez mais atuantes no adulto, não?
RICARDO FISCHER: Olha, sem dúvida alguma. Não disputei ano passado por São José, mas vejo que pelo que joguei este ano por Bauru o nível cresceu muito, pois os times investiram muito. Este é um campeonato muito importante nessa transição juvenil/adulto. É o momento mais importante da carreira do atleta, e são poucos, hoje, que conseguem jogam muito tempo no adulto. Na LDB temos a oportunidade de sermos os protagonistas, de chamarmos a responsabilidade, de carregar o jogo mesmo. Isso mostra o talento de cada um. Para o NBB, as duas coisas andam juntas. Eu venho para a LDB com uma bagagem importante de jogar um campeonato forte como é o NBB. E eu volto pra lá com uma confiança extra, gigante mesmo. Tá dando certo. Normalmente em jogo de adulto a gente não é um protagonista. Somos, jovens, coadjuvantes que aos poucos conseguimos nosso espaço, nosso reconhecimento. A LDB acaba nos trazendo essa força para chegar no NBB e mostrar a nossa capacidade. Com talento, confiança e treinamento a molecada vai longe.

BNC: Uma vez eu falei com teu irmão, Fernando (também jogador de Bauru), e ele me disse que encheu sua paciência para que você ficasse na Europa, jogando por lá depois que você saiu da Suíça. Mas mesmo assim você voltou. Como foi essa decisão de voltar a jogar no Brasil?
RF: É difícil falar, cara, mas na época que eu voltei toda a minha família brigou muito porque acreditavam que era meu futuro. Mas eu procurei a minha felicidade, o meu bem estar mesmo. Se você não estiver feliz fora das quadras, não adianta. Acho que fiz a escolha certa. O nível do NBB está crescendo muito, está tudo embolado na classificação, mas nunca vou descartar jogar numa Espanha, isso é muito claro. Jogar uma ACB, uma Euroliga, isso é um sonho. Tomei uma decisão e estou feliz. Estou muito contente em Bauru, jogando em um grande campeonato e com tempo de quadra.

BNC: Queria falar sobre sua parte técnica. Desde que te acompanho, vejo seu basquete bem mais agressivo, bem mais voltado para a cesta. Você é um armador que procura os pontos, procura os arremessos. É por aí que passa sua evolução, seu crescimento em Bauru?
RF: Olha, ser armador o pessoal acha que é só levar bola, chamar a jogada e dar uns passes aí. Eu sempre fui ala-armador, e eu sofri muito pra entender quão complexa era a posição. Mas eu melhorei muito de São José pra cá quando eu passei pela seleção brasileira, naquele período de treinamento que tive com o Magnano. Foram dias e dias em alto nível, jogando com uma intensidade incrível, com o Rubén sempre me dando uns toques importantes nos treinamentos dele, que, diga-se de passagem, são bons demais mesmo. Ali eu percebi que a coisa estava virando, pra te ser sincero. É um desafio constante. É uma briga por posição saudável, e você precisa evoluir todos os dias. Isso pra mim foi sensacional, me deu uma força incrível. Cheguei em Bauru, o Guerrinha me deu espaço, me deu confiança, o grupo me aceitou bem e hoje eu divido a armação com o Larry Taylor. Gosto muito de atacar, sou um cara que gosto do arremesso, de infiltrar, mas gosto também de fazer o time jogar. Não adianta o armador fazer 30 pontos e o time não ganhar. Um dia ou outro isso vai acontecer, mas não é a regra da posição, não. Sempre tive um arremesso bom, mas melhorei muito meu passe quando treinava com o Fúlvio e via o cara jogar. Tinha vezes que ficava vendo o cara treinar, e o jeito que eu jogo pick-and-roll, por exemplo, é idêntico ao que ele me ensinou. Além de tudo eu sou um viciado em basquete. Se deixar, pra desespero da minha família, eu vejo basquete 24 horas, o tempo todo (risos).

BNC: Falando nisso, como tem sido jogar ao lado do Larry. Ele é um armador também, mas tem uma facilidade absurda pra atacar, criar seus próprios arremessos.
RF: Eu acho que encaixou muito bem. Sou um cara que gosto de decidir, mas armo mais o jogo. E o poder de decidir do Larry é gigante, imenso. Então eu meio que desafogo ele, porque ele não precisa levar a bola e definir. Acaba que nos completamos bem, isso é o mais importante pra Bauru. Foi uma ótima leitura do Guerrinha, isso é importante ser dito.

BNC: Tem só um fato engraçado nisso tudo, porque agora você e ele são concorrentes na luta por uma vaga na seleção, né. Ele, naturalizado, já foi até a Olimpíada de Londres, e você busca entrar no time do Magnano para a Copa América deste ano. Há alguma brincadeira entre vocês nos treinamentos, em viagens, ou ficam mais calados em relação a isso?
RF: A gente brinca, brinca. A gente é concorrente, mas é tudo saudável. Nos treinamentos a gente se marca, é bom para os dois evoluírem. A safra de armadores é muito, muito boa. Tem o Raulzinho, o Gegê, o Rafael Luz, Larry, Huertas e eu. O Brasil está muito bem servido na armação. Isso é mais importante.

BNC: Além do Larry, tem também o Guerrinha, seu técnico, né, que foi um grande armador quando jogava. Imagino a cobrança que você deva sofrer.
RF: Olha, desde que eu cheguei a Bauru não teve um dia que eu tenha voltado pra casa sem uma cobrança dele. E isso é ótimo, sem brincadeira. Só me faz crescer, pensar em ser um jogador melhor. E tudo ele tem uma explicação pra me dar, uma passagem dele como atleta, uma coisa bacana pra eu ouvir. Pode ver nos jogos, ele sempre me puxa pra falar alguma coisa, dar um toque. O armador é o técnico dentro da quadra, e é importante termos essa troca de ideias. Ele me dá a liberdade de falar também, e isso é muito legal. Tenho muito a agradecer ao Régis, meu ex-técnico em São José e também ex-armador, e agora ao Guerrinha, com quem aprendo diariamente.

BNC: Além do Steve Nash, que sei que você é fã, quem mais você admira?
RF: Tem o Nash mesmo, mas eu gosto muito do Ricky Rubio. O jogo dele é fantástico. Gosto muito do Chris Paul, da maneira como ele coloca o time pra jogar e como ele faz o pick-and-roll. É um cracaço, né. Você vê que ele não é muito rápido, mas ele faz estrago, né. Tem arremesso, passe, tudo. Gosto muito do Huertas também. É um cara que gostaria de conviver no dia-a-dia pra aprender mais ainda.

BNC: Você falou sobre a parte boa, que é seu jogo de passes e arremessos, e queria saber onde você precisa evoluir mais. É na defesa?
RF: Olha, eu preciso melhorar muito mesmo na parte física. Ficar mais forte mesmo. A parte de fundamentos é importante também, com passes, essas coisas. E a defesa, claro, isso está sempre na minha ordem do dia. Hoje é físico e defesa.

BNC: Uma pergunta importante sobre a LDB pra fechar. Queria que você falasse sobre times que vocês acabam não enfrentando no NBB, como foi o do Maranhão, e sobre este intercâmbio que há com centros ainda em formação no basquete brasileiro.
RF: Acho que é muito importante isso, cara. Hoje o basquete está focadíssimo no Estado de São Paulo, né. Principalmente nas categorias de base. Entrando nessa rede do NBB as coisas começam a ter uma estrutura, acreditar que é, sim, possível fazer basquete de alto nível. Nestas localidades, como é o Maranhão, têm muita gente talentosa, querendo jogar basquete, que precisa só de um espaço e de uma chance para aparecer. A LDB proporciona isso. Eu joguei em São Paulo sempre. E já não era boa, vou te falar a verdade. Imagina nos outros lugares. O NBB já cresceu muito no adulto. Agora é evoluir para os jovens, essa é a grande saída para o basquete daqui melhorar de vez.

BNC: Pra fechar mesmo: você tem 21 anos mas fala muito e fala bem. Por ser bem esclarecido, ter morado fora, é algo que você conversa, cobra dos dirigentes? Melhor condição de trabalho, investimento na base, essas coisas.
RF: Olha, quando tenho oportunidade eu falo, falo sim. Eu estava ali na ESPN, e estávamos o Larry e eu. Nos perguntaram sobre investimento na base, e eu falei quão importante era isso. Muitas vezes os jovens acabam saindo do basquete porque não têm oportunidade, não têm condição de continuar. Não adianta ter um baita profissional e nada na base, isso é o essencial para o basquete daqui crescer. A vida no basquete é curta. Precisa ter novo ciclo, renovação. É o Brasil que perde se não houver esse investimento na garotada.

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