Entrevista: Prodígio, jovem Gustavo de Conti comanda surpreendente o Paulistano no NBB
Na semana passada, antes do começo do NBB4, perguntei a uma confiável pessoa sobre as qualidades de Gustavo de Conti (31 anos – do elenco, apenas Felipe é mais velho que ele), técnico reconhecido pelo seu ótimo trabalho na base do Paulistano e cuja "fama" em São Paulo é muito forte. Ouvi o seguinte: "Sem medo de errar te digo que é o segundo melhor técnico no país, atrás apenas do Rubén Magnano. Treinamento igual ao dele eu só vi com o Rubén. O cara é fera, muito fera". Foi bom ouvir aquilo e depois olhar o Paulistano, um time de meninos, quase vencer o Flamengo naquele sábado. Na segunda-feira, contra o Tijuca, a primeira vitória (81-63), e há dois dias, um grande triunfo, que quebrou a invencibilidade do Uberlândia (94-81). O blog foi bater um papo com Gustavo, o Gustavinho, tão educado quanto estudioso e idealista. Ele está em sua segunda temporada como técnico principal do Paulistano no NBB e coleciona de títulos nas divisões de base.
BALA NA CESTA: Pelo que vi de vocês, me surpreendeu muito não a técnica, que sei que seus jovens valores têm, mas sim a maneira como atuaram contra o Flamengo. Um time muito organizado e disciplinado em quadra. É por aí? O que falta pra vocês conseguirem ser um time de ponta?
GUSTAVO DE CONTI: Acho que em um time jovem fica mais fácil de aparecer o trabalho, de verdade, e tenho que exaltar os jogadores, que conseguiram entender exatamente o que tínhamos que fazer neste começo do NBB. O que ainda falta um pouco é a tranquilidade na hora de fechar os jogos. Contra o Flamengo, por exemplo, quando nos vimos atrás do placar pela primeira vez faltavam dois minutos e saímos do sistema. É uma coisa que eu tenho que aprender, talvez parando o jogo na hora certa, e eles também. Era só continuar a fazer o que estava dando certo ou nos adaptarmos rápido ao que o adversário passou a nos proporcionar. O mais fácil seria eu estar aqui te falando que isso vem com o tempo, né, mas não gosto muito disso, não. Sabemos que temos que corrigir muita coisa.
BNC: Eu ouvi aqui antes do jogo (contra o Flamengo) que você é o melhor técnico do Brasil depois do Magnano. O cara é campeão olímpico, você não tem 40 anos e o reconhecimento parece que já veio (ou está vindo). Todo mundo te olha como um cara muito qualificado na nova geração, e como está seu planejamento de carreira?
GDC: É natural que quando surge um técnico novo as pessoas levantem um pouco, exaltem desta maneira. Mas na realidade eu sei que não é assim. E não falo como falso humilde, mas do fundo do coração. No Brasil nos empolgamos e nos desiludimos rápido demais com as coisas. É preciso ter equilíbrio. Estou atrás de muitos técnicos do NBB, lá em São Paulo em categorias de base há muitos ótimos treinadores e só penso em fazer o meu trabalho. Gosto muito de trabalhar com jovens jogadores, e estou aprendendo a lidar com alguns mais experientes também. Fui assistente de grandes times lá no Paulistano, com os quais eu aprendi muito e acho que assumi o adulto na hora certa (no NBB3).
BNC: Você falou sobre treinar um time jovem, mas queria saber como faz para o técnico dar o próximo passo, ou seja, ser o comandante de uma equipe que brigará por títulos, cheio de estrelas?
GDC: Há as coisas fáceis e as difíceis de você dirigir um time cheio de jovens. Fechar um jogo contra grandes times, mesmo estando melhor, é complicado. Mas lidar com um time mais experiente, cheio de estrelas, também não é fácil. Tem o lado bom, que é a parte do talento, das opções, da chance de vencer muitos jogos, mas é bom lembrar que é preciso lidar com alguns egos. Já vi os dois lados da moeda lá no Paulistano, e aprendi muito que não é o jeito do técnico que vai imperar sempre. É preciso se moldar de acordo com o que você tem nas mãos. É como a parte tática. Não dá pra ser sempre igual com grupos e pessoas completamente distintas – e em momentos diferentes de suas vidas e carreiras.
BNC: Sei que você é um cara muito estudioso, e queria que você falasse sobre o seu método de atualização. Imagino que sua esposa deva adorar…
GDC: (Risos). Minha esposa e minha filha, né (Gustavo é pai de Julia, de um ano). Mas vamos lá. Procuro pelo menos uma vez por ano fazer uma viagem para estudar. A última foi pra Las Vegas e Los Angeles, e na época do Draft deste ano eu vi alguns treinamentos. Acho importante falar que isso é algo que o Paulistano me proporciona. Além disso, eu tenho o Neto (agora técnico de Joinville) e o Diego Jeleilate (preparador físico da seleção e do Paulistano), que sempre me trazem muita informação (vídeo, revista, apostilas). Isso sem falar do meu bom relacionamento com o Magnano, que sempre me traz bastante aprendizado. Não leio muito, cara. Lia mais quando era técnico das categorias de base apenas. Hoje você tem vídeo de tudo, e acabo preferindo ver, toda noite, um jogo, um treinamento, algo assim. Procuro sempre anotar o que estou vendo, ver de novo, trocar idéia. Acho que assim a gente cresce.
BNC: Pra fechar: você foi assistente-técnico do Walter Roese na Copa América Sub18, trabalhou com o Neto, tem um bom trânsito com o Magnano. Queria saber o que você puxa de bom de cada um?
GDC: Do Magnano é ser detalhista e criterioso no treinamento. Eu sou um cara meio chato neste sentido. Tenho consciência que por vezes passo do ponto, que posso dar um pouco mais de liberdade, mas uma coisa é certa: quero que meu time faça no jogo exatamente o que a gente treina. O Walter Roese é um cara quase que 100% relacionamento e moral. Ele fez os jogadores daquela seleção (vice-campeã, perdendo dos EUA por apenas três pontos) acreditar que podiam ganhar lá dentro dos Estados Unidos. Foi um trabalho incrível de convencimento como eu nunca havia visto, de entrar na mente dos caras mesmo. Foi fantástico. E com ele (Roese) aprendi também a saber delegar. Fiquei responsável pela parte tática, e ele me ouvia muito sobre isso. Aprendi muito sobre defesa com o João Marcelo e com o Neto em como lidar com os jogadores.
BNC: No que mais você precisa melhorar? Você fica muito nerovoso…
GDC: Cara, eu cobro muito, muito mesmo em treinamento. E sei que isso às vezes passa dos limites. Preciso conversar mais com os jogadores. Cobro muito, falo muito na hora dos treinamentos e em viagem, mas fora de quadra eu preciso chegar e explicar o que realmente estou querendo, o que estou pedindo.
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