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Bala na Cesta

No título inédito do Paulistano, o prêmio ao inconformado técnico Gustavo de Conti

Fábio Balassiano

03/11/2017 06h00

Chegou ao fim a espera do Paulistano. Na noite de ontem, o tradicional clube da capital de São Paulo fez 91-76 em Franca diante de um Pedrocão lotado (quase 6 mil pessoas), fechou o confronto em 3-2 e conquistou o primeiro título da história da agremiação que havia sido vice estadual em 2005, 2009 e 2013 e também do NBB em 2014 e 2017. O norte-americano Fuller foi o cestinha da decisão com 18 pontos. Este é um troféu que coroa o brilhante trabalho do Paulistano, que não teve medo de inovar (o trabalho da agência Old Coach deu uma bela repaginada na comunicação com o público) e agora colhe frutos.

Vocês sabem bem que eu não ligo pra estaduais, não gosto mesmo e, na essência, sou completamente contra no modelo vigente. Sou a favor que eles (estaduais) existam, mas em outro formato. É uma discussão mais longa, pra outro momento. Agora, agora mesmo, vale exaltar o trabalho do técnico Gustavo de Conti no Paulistano (aqui todos os textos que escrevi sobre ele neste espaço).

Aos 37 anos, Gustavo de Conti é técnico principal do Paulistano desde a temporada 2010/2011. Apenas em seu ano de estreia teve campanha negativa (com mais derrotas que vitórias). Nos outros, retrospectos positivos, excelentes mesmo como em 2013/2014 (23-9 na fase regular e vice-campeonato do NBB). O mais interessante disso tudo pra quem acompanha basquete nacional com afinco é: o Paulistano sempre deu a ele, ano após ano, elencos diferentes e razoavelmente modestos.

E Gustavo, dono de personalidade fortíssima e com capacidade técnico / tática acima do normal pros padrões brasileiros, nunca teve pudor de mudar. Seus times já passaram de "cadeados defensivos" para duplas assassinas como foi Holloway e Dawkins, para o muito jovem e o vigente veloz, leve e heterogêneo. Em todos os casos, os atletas começaram a temporada de um jeito e terminaram como jogadores muito melhores.

Exemplos não faltam, e o que mais salta aos olhos é o do jovem Lucas Dias, de 22 anos. Revelação do Pinheiros, na primeira temporada (a passada) com o Paulistano ele ganhou "golpes" no ataque, senso de liderança, postura defensiva e traquejo para jogar na posição 4 (ala-pivô). Guiou o time ao vice-campeonato do NBB, treinou muito nas férias e já neste Paulista apresentou nova dose de melhora, tornando-se uma opção ainda mais confiável no ataque jogando mais aberto (dificulta para os grandões do garrafão saírem para marcá-lo) e um marcador ainda mais responsável. Yago, atrevido baixinho armador trazido do Palmeiras recentemente, é outro que encanta. Aos 18 anos e com 1,75m, ele encarna Isaiah Thomas (armador que fez sucesso no Boston Celtics e agora está no Cleveland Cavs) e alucina as defesas adversárias saindo do banco. Com a empolgação da juventude, coube ao técnico segurá-lo um pouco nos momentos de pressão e soltá-lo sem medo em outros para desempenhar o que ele faz de melhor – costurar marcações, infiltrar para buscar companheiros e pontuar, pontuar e pontuar.

Jovem, cabeça em polvorosa para se manter atualizado e camaleônico na medida certa para inovar e transformar a sua equipe com as mudanças constantes do jogo, Gustavo me lembra muito a canção de Gabriel, o Pensador: "Seja você mesmo, mas não seja sempre o mesmo". Em um meio esportivo brasileiro quase sempre avesso às mudanças, é um prazer ver o desenvolvimento profissional e também pessoal dele nos últimos anos.

Antes mais "esquentado", o comandante agora campeão pela primeira vez me parece, de longe pois não convivo com ele com tanta frequência assim, o mesmo inconformado de sempre. Mas agora respirando um pouco mais antes de explodir e dosando um pouco melhor as suas brigas Gustavo me parece totalmente centrado, mais equilibrado para "alucinar" seu time quando necessário ao mesmo tempo que consegue acalmá-lo nos momentos mais tensos. É natural, vem com o amadurecimento (algo que eu claramente também passo) e os benefícios são imensos como se vê.

Quem acompanha este espaço sabe que admiro o trabalho de Gustavo de Conti há tempos. É destemido, entende muito do jogo, inventivo para mudar e inconformado. Não sei exatamente o que será do futuro dele como treinador, mas torço para que este seja o primeiro troféu de muitos.

A vitória de Gustavo faz bem ao basquete brasileiro pois mostra que estudar, inovar e não se conformar dá resultado. Que surjam mais dos bons "maníacos" por evolução, inovação e transformação como ele.

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