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Bala na Cesta

Fora do Mundial, chegou a hora da pergunta: qual o plano da CBB pro basquete feminino brasileiro?

Fábio Balassiano

14/08/2017 06h20

Vocês sabem que ontem terminou a Copa América Feminina, né? A desastrosa campanha da seleção brasileira teve seu fecho "de ouro" com a quarta colocação e a não classificação para o Mundial após derrota vexatória para a paupérrima equipe de Porto Rico por 75-68 (escrevi sobre aqui, ó).

Nem há muito o que falar de um time que em seis partidas (24 quartos e um tempo extra) conseguiu anotar mais de 20 pontos em um período de 10 minutos em apenas duas ocasiões. Os números (21,2 desperdícios de média, 16% em bolas de 3, 41% de 2 e 70% nos lances-livres) estão aí e são fáceis de ser lidos. Carlos Lima, em sua primeira e provavelmente última participação como treinador de uma equipe nacional, repetiu erros e clichês do passado, apostou nas veteranas de sempre, foi péssimo em seus tempos técnicos e não conseguiu trazer absolutamente nada de novo (em termos táticos, de fundamentos e parte técnica) para um time que joga um basquete velho, antiquado e medroso há anos.

Este é o lado de dentro de quadra e que, esperamos, tenha tido um capítulo final em seu quase que inesgotável pacote de vexames. Agora vem a parte mais importante de todas ao meu ver: qual é o planejamento da nova gestão da Confederação Brasileira de Basketball para o basquete feminino daqui pra frente?

Guy Peixoto foi eleito em março deste ano e não teve muito tempo pras coisas pois estava preocupado em retirar a suspensão imposta pela Federação à gestão passada da CBB. Isso é justo e compreensível até. Quando a suspensão foi retirada, faltavam menos de 60 dias para o começo da Copa América. Por mais que o tombo da competição em Buenos Aires machuque e seja injustificável devido ao nível dos rivais (Ilhas Virgens, Porto Rico e Argentina mesmo são TERRÍVEIS!), sua responsabilidade beira a zero se comparada a das pessoas que estavam na entidade máxima nos últimos 20, 25 anos. Isso é uma coisa.

A outra é: o que Guy e sua diretoria farão a partir de hoje, 14 de agosto de 2017? Qual é o plano? Em termos de planejamento, estratégia e ideias, o que sairá da caixa a partir de (espero) amanhã? O Brasil está fora do Mundial de 2018, mas no próximo ano mesmo haverá um Sul-Americano. E em 2019 um Pré-Olímpico classificatório para os Jogos de Tóquio. E aí as perguntas sobram:

1) O que será feito? Qual o planejamento de Guy para os próximos três, cinco, dez, quinze e vinte anos? Queria, juro pra vocês, ver uma planilha com cronograma, ações, responsáveis e metas. É possível? Ou não foi feito isso?

1.1) Por mais que a eliminação do Mundial seja doída e machuque fundo nos corações, ela pode representar um dado positivo, que é o fato da CBB planejar TUDO do zero, do zero mesmo. A entidade só não pode achar que está tudo bem, que derrotas para (insisto) ridículos times como Porto Rico, Argentina e Ilhas Virgens tenham sido obras do acaso ou da falta de sorte. Não é isso. É preciso muito senso crítico e humildade para reconhecer que, sim, está tudo errado e que é preciso mudar. Cabeças mais arejadas (modernas mesmo!) e menos passivas (está cheio disso nesta comissão técnica e em tantas outras que passaram por lá recentemente…) são muito bem-vindas neste momento em que a revolução é a única saída.

2) Veteranas de quase 40 anos continuarão a dar as cartas em um time recheado de vícios? Quando as jovens terão, enfim, seu espaço? E se tiverem, como elas serão estimuladas e desenvolvidas? Não adianta, também, jogá-las às feras e torcer pra dar certo. É preciso ENCHÊ-LAS de clínicas, treinos no exterior e de técnicos de alto nível. Alguns chamarão de custo. Eu, de investimento. E sem investimento de longo prazo não há resultado. Logo, ou se investe ou os resultados serão sempre os mesmos – e no caso, bem ruins como estamos vendo agora.

3) Qual o plano para capacitar mais os nossos técnicos, atrasados, com metodologias de treinos horríveis e sem a menor condição de dar instruções durante as partidas?

4) Onde está a capacidade de se indignar de todo basquete feminino? Por que não há vozes (ou uma única que seja) para cobrar melhores condições de trabalho em um país que conquistou Mundial (1994) e medalhas olímpicas (1996 e 2000) não faz tanto tempo? Guy é um empresário, alguém que montou uma empresa reconhecidamente de sucesso, e certamente se enquadra no perfil dos indignados. DUVIDO que ele esteja satisfeito com isso. Como bom indignado, espero que busque explicações, conclua seu diagnóstico e que comece a colocar em prática seu plano de ação.

5) Qual o estímulo que será dado para os clubes de base? Se da quantidade se extrai a qualidade, é imperativo perguntar: quantas equipes fazem basquete feminino nas divisões inferiores por aqui? Cinquenta? Duvido. A CBB sabe? Desconfio também. É preciso mapear quem faz e estimular. É fundamental ver quem quer fazer e dar condições para crescer. É OBRIGATÓRIO encontrar quem poderia mas não está fazendo. Hoje o basquete feminino no brasil é nicho do nicho do nicho. Não há, arrisco-me a dizer, do adulto às divisões de base nem mil garotas praticando o esporte. É um número ridículo para um país de 200 milhões de habitantes.

6) Será mesmo que em um país com tão poucas referências nomes como Paula, Hortência, Janeth, Alessandra, Maria Helena Cardoso, entre tantos outros, podem ficar de fora do processo para a reconstrução da modalidade? Guy fala tanto em renovação, em mudar, no que ele está certíssimo, mas que tal ouvir estas e outras meninas que sabem MUITO sobre basquete feminino? Quando elas serão chamadas para opinar e dar ideias?

Poderia continuar escrevendo e indagando sobre o futuro do basquete feminino, mas creio não ser necessário. Guy e sua diretoria agora precisam respirar e apresentar um plano para a modalidade. Espero, sinceramente, que isso seja exposto à sociedade muito rapidamente. A imprensa não gosta de criticar. Pelo contrário. A imprensa (ao menos a livre, a independente) precisa sempre lançar luz sobre os problemas quando eles existem – e neste caso, o problema é bem claro, não?

O basquete feminino brasileiro encontrou o poço neste domingo, 13 de agosto de 2017, e de lá só sairá com muito trabalho, planejamento, estratégia, indignação e caras mais modernas. Passou da hora de jogar fora o que não dá certo há 20, 25 anos e investir / apostar no novo.

Espero que Guy Peixoto e a nova diretoria da CBB abracem o desafio e tragam novas luzes para um basquete brasileiro feminino que encontra-se nas trevas há bastante tempo.

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