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Bala na Cesta

Stanic e seu amor pelo Palmeiras: 'No clube reencontrei o prazer de jogar'

Fábio Balassiano

12/03/2015 01h22

maxi5Dava para ver a felicidade de Maxi Stanic no hall do hotel em Franca. Convocado para o Jogo das Estrelas, o armador argentino do Palmeiras era só sorrisos. E não era para menos.

Depois de uma década jogando na Europa (seis anos na Itália, um na França e outros dois na Espanha) ele retornou a Argentina em 2011 para atuar no clube do seu coração (o Boca Juniors) até que recebeu uma proposta do Verona, da Itália, em agosto de 2013. Topou voltar ao velho mundo, se preparou fisicamente, organizou moradia para sua esposa (Carina) e matriculou seus três filhos (Olivia, Benjamin e Bautista) no colégio.

maxi2Estava animado com o desafio de atuar na cidade de "Romeu e Julieta" quando recebeu uma ligação de seu agente informando que o negócio havia sido desfeito. Naquele momento, aos 35 anos, Maxi falou com sua família que pararia de jogar ("Não queria saber de mais nada, não queria passar por aquela situação novamente").

Ficou 30 dias sem treinar, já havia tirado o cadarço dos tênis, mas acabou atendendo a um pedido de seu amigo Silvio Santander, então técnico do Obras Sanitárias, de Buenos Aires. Treinou com a equipe, jogou o primeiro turno da temporada 2013/2014 na Liga Nacional Argentina, mas ele sentia falta de algo.

maxi4Quando recebeu o convite para jogar o returno do NBB passado pelo Palmeiras não pensou duas vezes. Aceitou a proposta e embarcou no desafio de atuar no Brasil pela primeira vez em sua carreira.

Um ano se passou e torcida e atleta ainda vivem uma lua de mel que parece não ter fim. Maxi, frequentador assíduo do SESI e dos parques de São Paulo com sua família, declara amor incondicional pelo clube, e por sua vez os torcedores simplesmente o veneram. É o casamento perfeito entre atleta e agremiação. Vamos ao papo com o armador palmeirense de 36 anos.

maxi2BALA NA CESTA: Antes de falar de você especificamente queria que falasse um pouco da temporada do Palmeiras. O Régis Marrelli assumiu pouco antes do NBB, vocês têm conseguido ganhar em casa, mas fora do Palestra os resultados não têm vindo. Qual a sua análise da campanha de 11-14 até agora?
MAXI STANIC: A temporada tem sido boa. Poderia ser melhor, claro. A gente começou jogando bem fora de casa mas não conseguia ganhar. E agora os últimos jogos fomos mal. A partida contra o Paulistano teve muitas coisas particulares. A gente tem conseguido atuar bem em casa, onde ficamos muito confortáveis. Infelizmente tivemos lesões que nos afetam muito. O (ala) Diego faz muita falta.

maxi7BNC: Houve dois casos seus que me chamaram a atenção. Um contra o Minas e outro contra o Paulistano. Contra o Minas a arbitragem supostamente errou, você reclamou muito, foi expulso e suspenso. Ato contínuo, você utilizou as redes sociais e pediu desculpas, no que considerei uma atitude bem bonita. Contra o Paulistano você foi claramente atingido pelo Jeff Agba, o repórter veio lhe perguntar e, de novo em uma cena bastante elogiável, você preferiu não colocar a culpa no rival. Você lembra bem disso, certo?
MAXI: Ah, faz parte do jogo, faz parte do esporte. São coisas que acontecem. Contra o Minas errei, fui expulso, suspenso, pedi desculpas, paguei meu equívoco e a vida que segue. O lance com o Agba é de jogo. E acabou. A Liga Nacional de Basquete está crescendo muito, o nível está ótimo. Você veja: podemos ter a segunda final seguida de Liga das Américas com times brasileiros agora (Flamengo x Bauru), ano passado já tivemos uma (Flamengo x Pinheiros) e o Brasil pode ganhar o terceiro título continental seguido. Isso mostra como as coisas têm sido bem feitas por aqui. É um momento impressionante do basquete brasileiro apesar de a LNB ainda ser muito nova.

maxi6BNC: Você é um jogador de 36 anos e chama a atenção a sua identificação com o Palmeiras. Chegou ano passado, jogou o final da fase de classificação pelo clube, teve propostas maiores para esta temporada e decidiu ficar. Consegue descrever o que passou com você no alviverde?
MAXI: No Palmeiras eu reencontrei a felicidade de jogar basquete. Tão simples quanto isso e quase que de forma instantânea. Na temporada passada fiquei três meses no clube e parecia que estava há uma vida no clube. Quando você tem família e ela (família) se adapta rápido em um local, em uma cidade, tudo fica mais fácil. E foi o que aconteceu conosco. No Palmeiras me sinto em casa com todos – diretoria, torcida, técnicos, funcionários. No final da temporada passada a torcida criou uma campanha chamada "Fica, Maxi", e eu me emocionei muito. Tentava entender como aquilo estava acontecendo, o motivo de todos terem gostado de mim tão rápido, e não encontrava razão. Achei aquilo lindo, achei maravilhoso o carinho que todos estavam tendo por mim. Isso também ajudou que eu voltasse ao clube.

maxi1BNC: Foi, então, basicamente pela torcida que você voltou ao clube para a temporada 2014/2015?
MAXI: A torcida contou e pesou muito, mas a diretoria tem sido maravilhosa comigo e minha família desde que pisei no Brasil. Para você ter uma ideia, quando coloquei a camisa do Palmeiras pela primeira vez não passou um mês e eles me chamaram para renovar o contrato para esta temporada. Algo raríssimo e que mostra um respeito muito grande. Na minha situação atual, estar em um lugar em que minha família se sinta bem é fundamental para mim. No começo da temporada 2014/2015 a diretoria me procurou para renovar para 2015/2016. De cara disse que não, que precisaria voltar para a Argentina. Mas sabe como é. O tempo foi passando, o carinho foi aumentando e agora eles me fazem a mesma pergunta e eu respondo que não sei (risos). Sou muito feliz aqui.

maxi3BNC: A maneira como você chegou ao Palmeiras, meio que depois de uma desilusão, contribui para este amor pelo clube ser assim tão grande?
MAXI: Provavelmente sim, mas é algo totalmente irracional, pois se você pensar bem estou completando um ano de casa agora. Foi assim. Voltei para a Argentina em 2011, joguei dois anos no Boca e aí teve uma história engraçada. Fui contratado pelo Verona para a temporada 2013/2014. Já estava tudo certo. Eu treinando sozinho na Argentina, vendo escolas para as crianças. Tudo tranquilo, até que um dia meu empresário me ligou dizendo que o negócio havia sido cancelado. Foi um choque, e eu disse: "Sabe de uma coisa, então parei de jogar". Estava cansado daquilo, estava sem a menor paciência de passar pelos mesmos problemas novamente. Fiquei 20, 25 dias em casa até que o técnico do Obras, Silvio Santander (atualmente no Quimsa), contra quem eu joguei e que me conhece há 25 anos, me ligou e chamou para treinar com a equipe. Era um grupo jovem, e ele disse que precisava de alguém experiente para ajudar a molecada. Fui, treinava um dia, faltava o outro, mas para mim aquilo ali já estava encerrado. Não queria mais jogar. Mas fui convencido, a liga argentina começava no início de outubro e decidi ir ficando até o final do ano. Joguei bem, ficamos em quarto lugar, só que não tinha muita cabeça para aquela situação. Até que saí e vim para o Palmeiras. Do primeiro momento que pisei ao clube até hoje só tenho memórias lindas, momentos felizes. É algo indescritível mesmo.

maxi10BNC: No Brasil, o que mais lhe fascina?
MAXI: Eu gosto como o brasileiro vive a vida. Todo mundo tem problema, preocupações, mas o brasileiro parece sempre estar contente, com um sorriso no rosto. Acho que vocês devem ter problema, stress, mas não demonstram. E isso é lindo. Só sinto falta da família, dos amigos, do churrasco com os amigos.

BNC: Você falou sobre a Liga Nacional, que é recente mesmo (criada há sete anos). A Liga Argentina (também LNB) é mais antiga, tem mais de 25 anos. Quais as diferenças entre as duas ligas? O Brasil hoje está economicamente um pouco melhor que a Argentina…
MAXI: (me interrompendo) Um pouco, não. Muito melhor. Sei que há muitos problemas por aqui, mas está bem melhor que na Argentina…

maxi12BNC: (Risos) É, sim…
MAXI: Mas, bem, o NBB está começando e tem muita coisa para melhorar em infraestrutura, marketing, essas coisas. Acredito que essas melhorias virão com o tempo. Na Argentina já estão há mais de 25 anos e algumas coisas já fizeram antes. Aqui se viaja menos porque há muitos times de São Paulo e faz-se mais viagens de avião. No final da temporada a quilometragem percorrida por cada equipe é menor e isso faz uma diferença brutal para os atletas. Não parece, mas faz. No estilo de jogo também há diferenças grandes. Na Argentina o estilo é mais lento, cadenciado. Joga-se mais devagar no ataque. Aqui é um pouco mais correria no ataque, mais físico, bem mais atlético. Mas as coisas estão mudando. O Brasil tem ido um pouco para o lado argentino, com mais defesa, mais passes no ataque, um pouco mais de leitura de jogo. E os argentinos têm jogado mais para o lado brasileiro de uns tempos para cá, com mais rapidez no ataque, por exemplo. O Peñarol, de Mar del Plata, foi o primeiro a correr mais que os demais times argentinos. E agora o Quimsa, o melhor clube argentino na temporada, que acelera muito o ritmo. Os placares na Argentina aumentaram muito de um tempo pra cá e isso é reflexo desta mudança.

BBNC: Você acha que o jeito que o brasileiro joga transparece um pouco de como o brasileiro é? Por aqui somos mais, digamos, emocionais e o argentino, em todos os aspectos, mais racionais?
MAXI: Nunca tinha pensado por este lado. Mas para mim a explicação é bem lógica e passa por outro aspecto. O argentino não tem o potencial atlético que o brasileiro tem. Além disso, devido ao trabalho de base, o argentino tem um pouco mais de leitura de jogo desde a infância. E mais entrosamento como time, porque ele sabe que, devido a ausência de potencial físico, se não atuar como uma equipe não terá chance de ganhar de times mais fortes fisicamente. É isso que vejo. O brasileiro tem muito mais qualidade física, e por isso joga da maneira que joga, arriscando mais, essas coisas. É natural isso.

raul2BNC: Essa vitória recente do Brasil contra a Argentina na Copa do Mundo da Espanha em 2014 pode ter sido o começo de um período difícil para os argentinos pois já está chegando ao fim a geração dourada?
MAXI: É uma coisa que poderia acontecer. E poderia acontecer há alguns anos já. O Brasil chegou melhor ao Mundial de 2014. A Argentina não chegou bem e com muitos desfalques. O poderio do Brasil perto da cesta é incrível, impressionante. E aconteceu. Agora na Argentina é um período difícil, de transição, pois a geração que deu tudo ao nosso país está saindo de cena. É natural, é do esporte, acontece em qualquer modalidade. Precisaremos de tempo, mas o jogador argentino se adapta, aprende rápido. Onde iremos sofrer mais é dentro do garrafão. Temos bons armadores como Campazzo e Laprovittola, alas com mais de dois metros, como é o caso do Marcos Mata, de Franca, mas perto da cesta está difícil sair alguém alto e forte para proteger o aro.

magnano1BNC: Sei que você está sendo sincero, mas aqui quero que você seja 200% honesto. Quão difícil é para um argentino ver o responsável pela maior conquista do esporte platense treinar a seleção brasileira de basquete?
MAXI: (Risos) Putz. Não é fácil. Não é fácil. Mas já faz tantos anos que está na seleção brasileira, muitos jogos contra a Argentina, que já nos acostumamos. Mas na Argentina o Rubén Magnano é o cara que nos levou ao lugar máximo no esporte e terá sempre seu reconhecimento intacto. Ele não foi o cara que começou aquela história, mas o responsável pelo grande salto de qualidade com aquela geração.

maxi11BNC: Você tem 36 anos e já está se encaminhando para o final da sua carreira. Tem uma visão de jogo ótima, fala bem, tem ótima liderança. Pensa em ser técnico?
MAXI: Não, não.

BNC: De cara assim?
MAXI: (Risos) Não, não. Antes de acontecer isso da Itália eu já estava para parar. Tenho meu Centro de Treinamento especializado em basquete em Buenos Aires e quando parar de atuar quero administrá-lo de maneira mais próxima. Agora eu só penso em seguir jogando, em continuar a ser feliz dentro da quadra. A minha alegria de jogar voltou quando eu passei a atuar no Palmeiras. Sinto-me muito bem aqui.

NBB 7 - S.E.PALMEIRAS x UBERLÂNDIABNC: Houve algo dentro de quadra que lhe chamou a atenção em relação aos atletas brasileiros?
MAXI: A minha grande surpresa quando cheguei aqui foi sobre a qualidade que tem o Brasil. O potencial que há por aqui. Estou realmente surpreso quanto a isso. Quando você joga fora você acaba conhecendo de forma superficial. Conhece os caras da seleção, os clubes que jogam os torneios internacionais. Mas quando você atua no país é que vê a realidade. Há caras de 2,05m, 2,10m que sequer entram em quadra, que ficam o banco de reservas. E eu penso: 'Caramba, imagina um rapaz com esse físico na Argentina. Nós não temos um assim'. E eu vou ver jogos das divisões de base no Palmeiras, vou ver tudo o que é jogo por lá também. É assustadora a quantidade e a qualidade de material humano que há por aqui. Recentemente eu vi uma partida Sub-14 entre Palmeiras e Corinthians e havia um menino de mais de 2m na ala. Na ala! Você tem noção disso? O potencial que há por aqui é impressionante, impressionante mesmo.

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