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Bala na Cesta

Maduro, Nezinho cultiva lado família, esquece críticas e projeta NBB: 'Estaremos na final'

Fábio Balassiano

11/03/2013 11h18

Nezinho teria todos os motivos do mundo para não falar comigo por conta das críticas que sempre fiz ao seu jogo. Mas decidi arriscar lá em Brasília, no fim de semana das estrelas: "Fala, beleza? Vamos fazer uma entrevista lá pro blog?". E ouvi: "Vou fazer uma foto ali fora para o jornal e já volto. Me dá cinco minutos". Pensei comigo mesmo: ele não vai voltar. Mas não deu três minutos e o armador do time da capital federal, sobrinho da campeã mundial Roseli, me chamou: "Bora lá?". E fomos para um dos bate-papos mais bacanas que eu fiz nos últimos tempos. O camisa 23 do tricampeão do NBB e principal responsável pela série de 13 jogos invictos dos brasilienses na atual edição (venceram Joinville no sábado por 96-86 fora de casa) tem as melhores médias da carreira em pontos (18,6, o líder da equipe), assistências (6,6), conversão de três pontos (41,4%) e está de bem com a vida. Aos 32 anos, educadíssimo e cercado de familiares no evento ("minha casa é uma festa, cara, tô toda hora vendo DVD e rindo com os moleques"), se divertiu horrores com os filhos, ouviu aplausos depois de dois anos sendo massacrado em Franca, ficou cansado de tanto apanhar bola para os espevitados Giovana (7 anos) e Pedro (4) e riu muito. Vamos a entrevista.

BALA NA CESTA: Antes de começar a falar sobre você, queria te perguntar sobre as reuniões da Associação de Jogadores. Vi que vocês têm feito vários encontros com a Liga e acho importante que vocês informem em que pé está a Associação.
NEZINHO: A Associação está implementada, mas ainda não está legalizada. As reuniões foram muitos boas, muitas coisas avançaram e conseguimos perceber que os jogadores estão querendo que ela seja realmente estabelecida. Assim que ela realmente sair do papel teremos mais força para brigarmos pelo que conversamos desde as primeiras reuniões. Agora é a hora da filiação, do pagamento da anuidade, essas coisas. Não dá pra traçar um prazo ainda, porém. O ponto principal é que não queremos brigar, não queremos nada de extraordinário. O principal é termos um contrato de trabalho, algo que muitas equipes sequer fazem atualmente. Com isso, tudo fica mais fácil. Desde uma janela de transferências, para evitar que aconteça o que ocorreu com o Lucas Tisher (Nota do Editor: o pivô de Brasília jogou uma partida, foi dispensado e pelo regulamento não pode mais entrar em quadra pelo NBB), até na questão dos seguros, entre outras situações importantes. Não estamos brigando. Só estamos reivindicando os direitos que os jogadores têm. Só isso. E falo isso sem pensar em mim, não. Hoje estou aqui em Brasília, em um time que me dá uma estrutura bacana, mas temos que pensar na galera lá de baixo, que trabalha em condições não muito bacanas. Estamos brigando por essa galera.

BNC: Falando de Brasília, vocês jogam muito bem, são tricampeões do NBB, mas praticam um estilo de jogo que não agrada muita gente. Eu, por sinal, sou um dos maiores críticos do basquete que vocês jogam. Como você avalia o time de Brasília enquanto sistema tático, por exemplo? E o NBB em termos técnicos, melhorou alguma coisa, ou ainda falta muito?
NEZINHO: Acho que é importante separar duas coisas em relação a mim. O Nezinho da seleção é diferente do Nezinho do clube. Na seleção do Magnano, quando joguei com ele, tive funções diferentes das que tenho no time do qual eu sou um dos líderes e principais jogadores. Isso precisa ficar muito claro pra todo mundo. Quanto ao nível técnico do NBB, acho que está crescendo, mas pode evoluir um pouco mais. A Liga de Desenvolvimento tem ajudado a fazer com que os meninos cresçam mais em pouco tempo. E aqui acho que vale uma coisa importante: a LDB é bacana, mas os meninos precisam jogar mais, de mais tempo de quadra. Dizem que a próxima já será maior, isso é essencial. Eu vejo os meninos de Brasília treinando todos os dias para jogar pouco, jogar pouquíssimos jogos por ano. Eles precisam jogar pra evoluir. É tão simples quanto isso. Só assim se evolui. E para o nível técnico subir ainda mais precisamos fazer com que os meninos novos sejam inseridos de vez na equipe adulta, no tempo de quadra do adulto. Eles precisam entrar, errar, estar dentro efetivamente nos times profissionais do NBB. Essa, aliás, é uma das reivindicações da Associação de Atletas: reduzir o número de estrangeiros de três para dois por equipe. Nada contra os gringos, que isso fique claro, mas sim porque isso está freando a evolução dessa garotada que é o futuro do nosso país dentro de uma quadra de basquete. É muito mais fácil você pegar um estrangeiro de 28, 30 anos e botar o cara pra jogar. É muito mais fácil do que pegar um menino, treinar, dar espaço pra ele errar, ter paciência com ele. Estamos dando um tiro no nosso pé. E em sete, oito anos, como vai ser? O basquete acaba por aqui.

BNC: Ainda falando sobre Brasília. Uma coisa que me chamou muito a atenção foi que vim do Rio para Brasília com um passageiro ao meu lado falando sobre basquete. Era um cidadão comum, morador de Brasília, que amava basquete e que disse não perder um jogo de vocês. No final, eu disse a ele: "Parece que estou indo a Franca". O basquete pegou em Brasília mesmo, não?
NEZINHO: Ah, cara, muito, muito mesmo. Isso que você sentiu é o que acontece todo dia com a gente aqui, e isso é fantástico. A gente vai pro Rio de Janeiro, perde um jogo. Quando volta, é porteiro cobrando, é flamenguista zoando, é todo mundo perguntando e querendo saber. Hoje, pelo fato de sermos um time vencedor, temos uma responsabilidade maior, uma expectativa que já nasce alta no começo da temporada. A gente perde um jogo e é cobrado. Tem vezes que a gente brinca dizendo que se vier o Chicago Bulls, jogar com a gente, e perdermos, os caras vão ficar indignados. É mais ou menos assim que as coisas têm funcionado por aqui. E isso é bacana pra caramba.

BNC: Nos dois anos anteriores a este você foi o jogador mais vaiado em Franca. Quero te fazer uma pergunta boba: quando você está em quadra você ouve os elogios a sua mãe, ou nem sabe o que os caras lá em cima estão gritando?
NEZINHO: Olha, eu nasci pra jogar basquete. O fato lá em Franca é muito simples: por eu ter ficado sete anos em Ribeirão Preto, e vencendo dos caras quase todo ano e ainda por cima rivalizando com o jogador mais querido da torcida (Helinho), meu nome é quase sempre o mais lembrado. Criou-se isso e tive que me acostumar. O importante pra mim é o ginásio estar cheio. Eu amo estar dentro da quadra, eu amo que as arquibancadas estejam cheias. Só isso me basta. Claro que prefiro os aplausos, mas faz parte da vida.

BNC: Tá legal, mas e os xingamentos. Incomodam? Você ouve?
NEZINHO: Hoje, com 32 anos, eu te digo que sinto alguma coisa da torcida mas nem sei o que estão falando. Penso mais nas jogadas, no que preciso fazer para meus companheiros, nada mais do que isso. Mas com 20 anos era diferente, né. Já havíamos ganho um ano, foi criada aquela rivalidade e eu sentia. Tinha vezes que pensava: "Poxa, por que estão me xingando? O que eu fiz? O que está acontecendo de errado?". Lógico que eu via pipoqueiro xingando, o cara do amendoim desesperado pra cima de mim. E mexia comigo. Mas hoje, com 32, eu gosto de jogar lá em Franca, é um polo bacana do basquete. E você pode reparar, você esteve lá: nas duas vezes que fomos jogar lá no Jogo das Estrelas eu fui a pé pro ginásio. Nunca fui hostilizado no caminho. Dentro da quadra é que sei que os torcedores ficam mais animadinhos.

BNC: Teve alguma vez que você chegou em casa arrasado pelo que falaram de você?
NEZINHO: Hoje com 32 anos eu sinceramente não ligo para nada do que falam de mim. Mas antes, claro, mexia, mexia muito mesmo. É natural, né. Você é novo, acaba amadurecendo é com pancada que leva da vida mesmo. Tinha vezes que procurava entender o porquê das críticas, os motivos dos xingamentos, a razão daquela raiva toda pra cima de mim. Mas com 30 anos eu cheguei ao ponto que me deu um estalo simples: precisava só focar nos treinamentos e jogos, só isso. E teve uma coisa que aprendi com o Tom Zé, ex-técnico de Araraquara falecido em 2008, nosso grande rival, e que foi o responsável por me levar para Ribeirão Preto. Ele disse, já quase morrendo no hospital quando fui visitá-lo depois de um jogo em Assis: "Nezinho, nós tivemos uma briga muito feia quando saí de Araraquara. Eu briguei com todos vocês e levei isso pra dentro da minha casa. Minha esposa depois parou de falar com vocês e só anos depois é que voltamos a nos falar. Se você puder, não leva as coisas da quadra para sua vida pessoal, para fora do basquete. E tenta sempre deixar sua família longe dos problemas que enfrentamos no esporte. Só esse conselho que te dou". E desde então sigo a risca o que ele me disse. Tem me ajudado bastante.

BNC: Críticas ainda te incomoda bastante, ou já passou dessa fase também? Se quiser criticar blogueiro tá liberado, aproveita…
NEZINHO: (Risos) Olha, seria muito fácil eu dizer que eu ignoro tudo. Mas não tem como você não ler, não escutar, não ligar a TV e não ver o que estão falando de você. Mas hoje eu sou um cara muito bem resolvido. Aos 32 anos, estou focado e sei exatamente o que se passa em minha vida. Quando acaba o jogo, Bala, eu pego meu filho e vou pra minha casa. Levo as crianças na escola, quando posso eu busco, fico com todo mundo dando risada, vendo filme. Essa é a minha vida, é assim que vivo. Isso me faz feliz. Sinceramente pra você: não me deixa triste, não me deixa feliz, não me deixa nada. Entendo que faz parte do trabalho de vocês, da imprensa, e preciso respeitar. Eu só quero estar treinando e jogando. O que me faz feliz, quer saber? Jogar e estar com minha família. O que me motiva é estar em quadra com meus companheiros ou em casa com meus familiares. Parece que estou com 20 anos.

BNC: Sua maturidade enfim chegou, é isso?
NEZINHO: Hoje me sinto completo, pleno, cara. Se eu tivesse a cabeça que tenho hoje quando tinha 23, 24 anos eu seria um jogador que hoje são considerados diferenciados. Pelas minhas limitações eu não fui assim. Paciência. Errei, bati muita cabeça, aprendi e hoje com 32 eu sou muito bem resolvido e sei do dia que posso treinar, do dia que preciso descansar, do que me deixa feliz, do que posso ou não fazer. Essa maturidade é fundamental pra mim hoje. Ano passado foi muito bom pra mim e aprendi que tenho que compartilhar tudo com minha família. Nos dias de folga, cara, nem adianta ligar no meu celular porque vai estar desligado. Estarei em casa, brincando e me divertindo com e para eles. É assim a minha vida hoje.

BNC: Pra fechar, pergunta fácil: Brasília e Flamengo vão jogar mesmo a final do NBB nesta temporada?
NEZINHO: Olha, não sei qual é o outro, não, mas Brasília vai estar, pode anotar aí.

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