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Bala na Cesta

Rômulo Mendonça fala da emoção de narrar as finais da NBA e de ‘encontrar’ o Papai LeBron nos EUA

Fábio Balassiano

30/05/2018 00h02

O menino Rômulo Mendonça que assistia e gravava as partidas da NBA no começo da década de 90 em Divinópolis (Minas Gerais) não imaginava que mais de 20 anos depois teria a oportunidade de narrar as finais da melhor liga de basquete do mundo diretamente dos Estados Unidos.

Pois é exatamente o que irá acontecer a partir de amanhã, quando Rômulo estará na Oracle Arena (Oakland) e logo depois na Quicken Loans Arena (Cleveland) para transmitir pela primeira vez em sua carreira as emoções da decisão entre Golden State Warriors e Cleveland Cavs com seu estilo único pela ESPN, que detém os direitos exclusivos de transmissão da decisão para o Brasil.

Fanático pela NBA desde que a Rede Bandeirantes exibia as partidas e o famoso NBA Action (programa com os melhores momentos da semana da liga) na década de 90, Rômulo embarcou ontem com destino a Oakland, onde a série envolvendo Warriors e Cavs começa nesta quinta-feira às 22h. Dono de bordões que se tornaram uma febre não só no meio esportivo, mas indo muito além dele (o site da ESPN fez um compilado das criações geniais do narrador), o mineiro de 36 anos chegará aos Estados Unidos sendo uma das vozes mais respeitadas do Brasil e, por que não dizer, também conhecido na terra do Tio Sam, já que suas narrações insanas foram divulgadas no SportsCenter americano com direito a elogios efusivos do público do programa.

O blog conversou ontem com exclusividade com o Mensageiro do Caos pouco antes de Rômulo entrar no avião para se encontrar com José Renato Ambrósio e Paulo Antunes, que farão a cobertura da decisão da NBA pelos canais ESPN.

BALA NA CESTA: A poucas horas de narrar a sua primeira final de NBA, como você está? Muito ansioso? Estava se sentindo assim logo que foi anunciado que você iria pros EUA transmitir as partidas de lá, ou nada disso?
ROMULO MENDONÇA: Olha, Bala, como eu fiz muito jogo das finais de conferência por aqui até que diminuiu a ansiedade. Nem deu tempo de eu ficar pensando muito, confabulando muita coisa. Eu estava mesmo concentrado nos jogos que eu iria narrar, no ESPN League, o nosso programa diário de debates, nas transmissões. Isso ajudou a sair um pouco do nervosismo. Todo dia eu tinha algo pra fazer.

BNC: Antes de entrar no lado de suas narrações, o que você espera da final no lado técnico da coisa? O Golden State é mesmo o favorito?
ROMULO: O favoritismo é do Golden State mesmo. Isso é muito claro. Coletivamente é um time muito superior ao Cleveland. Foi assim nas finais do ano passado com o 4-1 e gosto de lembrar que só não foi 4-0 porque do outro lado tinham LeBron James e Kyrie Irving. A história diferente deste ano em relação ao ano passado é que o nível de liderança do LeBron conseguiu ter uma evolução em relação ao ano passado. Muito, claro, em função da instabilidade do elenco do Cleveland. Com o que os caras estavam fazendo na fase regular todos estavam céticos em relação ao desempenho deles nos playoffs e o Papai colocou o time nas costas literalmente. Foi um campeonato muito atribulado pros Cavs, com a lesão do Kevin Love, o técnico Ty Lue se ausentando, uma quase eliminação pro Pacers na primeira rodada e todos sendo muito contestados. Em fevereiro o time mudou o elenco inteiro, né, cara. Pouca gente acreditava que chegaria à decisão. Resumindo, pra mim, essa decisão é o exército de um homem só contra o melhor time do mundo, dono do melhor arsenal, maior repertório. O que um dos melhores da história pode fazer em relação ao melhor time do mundo? É o que veremos. E se tem LeBron dá pra esperar um desafio. Dá pra estender um pouco o duelo.

BNC: E sobre a sua narração em si, alguma expectativa diferente daquela que já conhecemos? Narrar ao vivo do ginásio é bem diferente, né, cara?
ROMULO: Independente da situação, narrar o jogo em ginásio é sempre melhor, mais favorável do que a transmissão distante. É um fato e ninguém precisa ter dúvida disso. Narrei as Olimpíadas do Rio de Janeiro no Maracanazinho e certamente meu trabalho in loco foi muito favorecido. O clima, a torcida, o reconhecimento do ambiente e tudo mais. Fazer as finais nos EUA, ter o apoio da matriz americana com as estatísticas, todo suporte da NBA, tenho certeza que isso me ajudará demais a engrandecer a narração, o debate, o conteúdo pros canais ESPN. Vou usufruir disso para melhorar, pois o que vem de dado é um absurdo. Narrar in loco me aproxima do evento e é um facilitador pra que as coisas se tornem mais rápidas e dinâmicas.

BNC: Pessoalmente falando, se eu te dissesse há 10, 15 anos que você narraria uma final da NBA nos Estados Unidos seria um sonho, não? Como é ver isso se tornando realidade?
ROMULO: É, sim, uma grandíssima emoção narrar uma final de NBA nos Estados Unidos. É realmente sensacional. Quando comecei a ver NBA, na temporada 1991/1992, a logo antes da Olimpíada icônica de Barcelona, naquele momento eu tinha 9 pra 10 anos. Comecei a gravar tudo que é jogo em um videocassete. E pouca gente sabe, mas as primeiras partidas daquele aficionado por basquete não foram da NBA, mas sim do Pan-Americano de Havana, em Cuba. Aquele que a Paula, Hortência e Janeth ganharam nas barbas do Fidel Castro.

Após o Pan de Havana eu comecei a fazer gravações dos jogos da NBA. Tinha 9 anos. Gravei muitos jogos, o NBA Action, aquele programa semanal na Band. Tinha todos e até hoje tenho as fitas em Divinópolis. Adorava os clipes com as músicas, era muito cativante, decorava as músicas, as jogadas selecionadas. Olha só, pra você ver eu lembro até hoje do slogan do NBA Action, que era "It's fantastic" ("É fantástico"). Tenho o All-Star Game de Orlando de 1992, Bala. Você lembra desse, que foi aquele da volta do Magic Johnson e com o Luciano do Valle não chamando os times de Leste x Oeste, mas sim de Atlântico x Pacífico (risos). Minha relação com a NBA vem dessa época e cresceu desde então. Nunca pensei na profissão que eu iria exercer enquanto assistia. Naquele momento eu simplesmente via, acompanhava, achava fascinante. Hoje, uns 30 anos depois, é maravilhoso ver que aquela criança irá lá narrar in loco uma final da NBA para o Brasil. Desde que trabalho nos canais ESPN isso se torna uma possibilidade, natural, mas em 2018 estarei realizando um dos meus sonhos.

BNC: Esse playoff ficou muito marcado pelo apelido que você criou para o LeBron James. E você irá narrar as finais do Papai LeBron, como você o apelidou…
ROMULO: Você sabe que eu não crio os apelidos com tanta prévia assim. Depende do contexto e às vezes sai. Essa coisa do Papai LeBron surgiu assim. Não importa o esporte, eu gosto de enaltecer personagens, elogiar a genialidade, fazer com que os personagens tornem ainda mais atraentes as transmissões que estou fazendo. Eu me vi com a missão de abordar o melhor jogador da atualidade de uma maneira única, diferente e com o respeito que ele merece pela autoridade que ele tem atualmente na NBA. Pensei que além do King James, seu apelido lá nos Estados Unidos, eu poderia falar mais com o publico brasileiro, aproximar mais o craque do Cleveland do nosso público. Aí veio o Papai LeBron devido a liderança dele, algo gigantesco. Essa evolução dele como líder é extraordinária. Você percebe uma evolução específica na postura. Busquei o apelido pra exaltar a referência dele. Ele é superior ao técnico dele, pô, em termos de autoridade, liderança, respeito do elenco e isso é incrível. O (técnico) Ty Lue não tem autoridade alguma sobre o LeBron e não é segredo pra ninguém. Ele é o Papai da parada (risos). É ele que manda na parada toda. É um humor, é uma coisa legal e que ultrapassou algumas coisas que jamais imaginei. Romper a barreira do idioma, ver minha narração parando na ESPN americana foi sensacional e fugiu do meu controle. Quis abordar esse lado dele. O que virá depois disso eu não sei. Se vier, tem que ser espontâneo e natural.

BNC: Você é um cara muito carismático e desde a Olimpíada cada vez mais popular. Esse assédio já gerou alguma situação diferente nas ruas?
ROMULO: Ah, não, ainda não. O mais importante pra mim é que as pessoas que me abordam são as que me acompanham. E o mais legal é que narro NBA, NFL, Baseball e na olimpíada narrei o vôlei. Minha rotina, via de regra, são os esportes americanos, ou seja, algo bem de nicho no Brasil. Por isso eu fico muito feliz quando as pessoas me abordam conhecendo muito o trabalho que eu faço. Nunca vivi nada absurdo, mas é muito normal me pedirem uma foto e logo na seguida um áudio pra tio, namorado, isso acontece direto. Outro dia em São Paulo estava no mercado e havia duas senhoras. Uma com uns 50, a outra com um pouco mais. As duas me olharam e perguntaram: "Você que é o Rômulo Mendonça, não é mesmo? Adoramos as suas narrações". Pô, fiquei muito orgulhoso. Duas pessoas que gostam de esportes americanos e me conheciam bem. É bacana isso, né? Semana passada estava atravessando a rua e uma senhora também, esta de mais de 70 anos, perguntou qual seria o próximo jogo que narraria. Isso emociona. De alguma forma não estou só conversando com o público mais jovem, adolescente, mas sim com uma galera de todas as idades.

BNC: Você tem algum palpite pra essa final?
ROMULO: O que eu vou falar, Bala, depois do que o LeBron fez nessa final do Leste contra Boston? Rapaz, é complicado. O Cleveland já poderia ter sido eliminado contra o Indiana logo na primeira rodada. Não acredito em varrida, em 4-0. Palpite, apenas frio do jogo, aposto em 5, no máximo 6 jogos a favor do Warriors. Não acho que dá pra descartar o LeBron de forma alguma, mas acho que será mais um capítulo de dominação do Golden State, um dos maiores times da história. Se LeBron conseguir ganhar, seria épico, apoteótico, e inevitável a comparação com o Michael Jordan.

BNC: Sério que você acha que dá pra colocar os dois no mesmo patamar?
ROMULO: Olha, Bala, vou ser bem sincero. Eu gosto de falar essas coisas assim. Me limito aos jogadores que vi em quadra. Me limito a analisar, portanto, partir do começo dos anos 90. Então dentre os que vi em ação é o Michael Jordan, e vai continuar sendo o Michael Jordan o melhor. O Jordan foi atemporal. Se estivesse em ação nos tempos atuais, com a medicina, a tecnologia avançadas do jeito que estão, ele seria ainda melhor do que ele foi nos anos 80 e 90. Seria ainda melhor. Eu sei de algumas estatísticas favoráveis ao LeBron sobre ser decisivo, números de não sei o quê mais, mas eu não posso ser refém de estatística. Das 6 conquistas, ele foi muito dominante em todas as 6. O legado que ele deixou é incrível. Entre os tricampeonatos, ele teve uma aposentadoria, e dá não especular que ele teria uns 8 títulos ou 7 direto se tivesse permanecido. O legado do Jordan é inesgotável, inesquecível e marcante. E além de tudo, era extremamente completo, sendo brilhante no ataque e na defesa.

É um ícone, se mistura com o próprio esporte. O LeBron, dos que vi jogar, eu coloco atrás do Jordan em 2º lugar. O que mais me impressiona é essa mudança de postura recente dele. O LeBron passou por uma verdadeira metamorfose. A força física dele, a liderança, a técnica, a leitura de jogo, isso tudo o transformou de um cara omisso, como ele foi acusado injustamente no começo da carreira, em um cara altruísta e reconhecido pelo seu talento. A evolução dele nos arremessos foi incrível. Como ele lidera é um absurdo. É um padrão único. É inevitável discutir isso dele x Jordan caso ele ganhe, mas o Jordan se mistura com o esporte. Quando alguém vira o Pelé daquela função, se torna natural você falar que alguém é o "Michael Jordan ou Pelé daquela determinada atividade". O fundamental pra mim é você gostar de um não significa ue o outro pode ser anulado. São dois mitos, dois gênios, duas referências do esporte. Não precisa desmerecer. É uma discussão saudável, inevitável. Não precisa diminuir o outro pra saber quem é o melhor. O LeBron é uma referência como o Jordan foi. Pra gente que gosta de esporte é só apreciar um que está jogando agora como apreciamos o outro que já parou. Que os dois sejam valorizados. Mas reforço: o Jordan pra mim é o melhor dos que vi. Então só do LeBron estar na discussão é ótimo. O Jordan é o maior atleta de todos os esportes.

BNC: Mais que o Pelé?
ROMULO: Olha, sem querer entrar em polêmica, mas sim, o Michael Jordan é o maior atleta de todos os tempos em todos os esportes em minha modesta opinião e sem querer desmerecer a nenhum outro.

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