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Bala na Cesta

Fim de uma era? Hoje pode marcar o último dia do case de sucesso chamado San Antonio Spurs

Fábio Balassiano

24/04/2018 06h00

A rodada desta terça-feira no playoff da NBA conta com três jogos marcados. Em Boston (20h), Celtics e Bucks lutam pela vantagem em uma série que está empatada em 2-2. Na Filadélfia (21h), os Sixers, com 3-1 no duelo contra o Miami Heat, podem avançar à semifinal de conferência Leste pela primeira vez desde 2012.

E às 23h30 (de Brasília) em Oakland o Golden State, que lidera por 3-1, tem tudo para colocar um ponto final não só na temporada do San Antonio Spurs, mas quem sabe para acabar também com o case de sucesso chamado San Antonio Spurs.

Time há mais tempo frequentando a pós-temporada na NBA (desde 1997/1998), o San Antonio vive uma espécie de crise de identidade neste final de campeonato e também para o futuro próximo da franquia. E motivos não faltam. Vamos lá:

1) Kawhi Leonard -> O melhor jogador do time entrou em rota de colisão com a diretoria. Ainda se recuperando de lesão da temporada passada (Salve, Zaza Pachulia!), Kawhi foi se tratar em Nova Iorque (longe da franquia), anunciou o retorno, deu pra trás, não jogou e praticamente abandonou o time na pós-temporada. O clima estremecido entre atleta e equipe leva muita gente nos EUA a crer que o ala não permanecerá em San Antonio para a próxima temporada (com o Lakers sendo um dos principais candidatos a fisgá-lo aliás). O futuro do Spurs passa por ele. Se ficar por lá, os texanos têm uma dupla excepcional pra começar a pensar (LaMarcus Aldridge e Leonard) nos seus próximos dias. Caso contrário, é para repensar muita coisa a partir de ontem.

2) Gregg Popovich e seus assistentes -> Gregg Popovich, o técnico, não terminou a temporada no banco de reservas devido a uma fatalidade (sua esposa Erin faleceu), mas pra próxima temporada muita coisa deverá mudar no comando técnico do Spurs. Dois de seus assistentes, Ime Udoka e Ettore Messina, estão sendo cortejados para serem técnicos principais em Hornets e Knicks, respectivamente. Caso perca a dupla, Pop, que tem contrato renovado por mais dois anos, teria que refazer a sua comissão técnica quase que na totalidade. O italiano Messina, aliás, é quem tem comandado o Spurs neste período de Popovich ausente e tem total confiança da franquia para, quem sabe, no futuro ser o comandante principal do Spurs – caso fique por lá, claro.

3) Sistema de jogo -> Aqui é uma questão complexa e difícil de resolver. O San Antonio Spurs se tornou uma franquia conhecida e encantadora para o mundo do basquete por jogar de uma maneira que todo mundo reconhece. Passes, passes, passes, altruísmo, senso coletivo, jogadores não tão atléticos mas com muita inteligência para ler a partida, defesa bem postada e arremessos bem planejados. Esse é o Spurs e todo mundo sabe. É, digamos, "cult" reverenciar o "Spurs basketball" e dizer a famosa frase-clichê: "esse sim é o jogo que eu amo". OK, beleza, mas…

O problema é que a NBA mudou, se tornou mais rápida, mais atlética e sobretudo menos "caxias", menos certinha, menos tatibitate. A liga, hoje, permite o erro, aceita o erro, "flerta" com os arremessos imprevisíveis que o San Antonio praticamente extinguiu de seu sistema há uma década. Mais do que aceita, a NBA vigente ESTIMULA que os times corram, tentem, errem, corram mais e tentem outra vez. É quase uma canção do Raul Seixas ("Tente outra vez") em looping. Goste ou não, é assim que tem funcionado.

No Spurs há uma cartilha – e todos seguem. O problema é que essa cartilha é BEM diferente da que é aplicada pela NBA nos dias atuais. E a cartilha dos dias atuais, com Rockets e Warriors como os "capitães", tem vencido praticamente todas as batalhas. Será que não chegou a hora de "refundar" a maneira de jogar do San Antonio, tornando o elenco mais atlético, mais imprevisível e mais atualizado de acordo com a maneira que a liga norte-americana tem praticado hoje em dia?

4) Veteranos -> Tony Parker chega ao fim de seu contrato. Manu Ginóbili tem mais um ano. Gasol, dois. O que o Spurs fará com seus veteranos? É ótimo tê-los no elenco, sobretudo para passar experiência aos mais jovens, mas todos eles vão permanecer por lá? Quais serão suas reais funções? Ao que parece o francês disse que fica. O argentino Manu ninguém sabe. E Gasol infelizmente está em uma curva física descendente que assusta um pouco.

5) Pouca agressividade no mercado -> Metódico e fiel às suas raízes de desenvolver talentos, o Spurs quase nunca é agressivo no mercado de agentes-livres. Prefere construir seu time através de picks de Draft e capacitando seus jogadores jovens no elenco (a bola da vez agora é o ainda errático armador titular Dejounte Murray – e Kawhi Leonard evoluiu pra caramba assim também aliás…). Isso é bacana, mas para voltar a vencer talvez seja também lento e traumático. Em um mercado de 2018 que contará com Paul George, LeBron James e DeMarcus Cousins, ser um pouco mais ousado talvez renda frutos mais rápidos e do tamanho da grandeza do San Antonio.

O San Antonio Spurs é / foi um modelo do que deve ser feito em uma franquia da NBA. Moldou inúmeros times que estão na liga atualmente (o Indiana, o Portland, o Nets, o Sixers, o Hawks, todos usam a filosofia e a forma de pensar dos texanos), mostrou como o senso coletivo é essencial ao bom jogo de basquete, trouxe o jogo europeu pro esporte americano e conseguiu "trocar a roda com o carro andando", ou seja, tem se mantido competitivo por duas décadas sem apelar para o famoso (e tenebroso) tank (quando as franquias perdem de propósito para galgarem posições mais altas no Draft seguinte).

É um exemplo a se seguir, sem dúvida alguma, mas pode ser que esta terça-feira, 24 de abril de 2018, marque os últimos dias do Spurs como o conhecemos nos últimos 20 anos. É bem possível que com a provável eliminação mudanças (salutares) venham a ocorrer.

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