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Bala na Cesta

Experiente, Leandrinho sonha com título e inédita final brasileira da NBA

Fábio Balassiano

25/03/2015 06h19

lb6Aos 32 anos Leandro Mateus Barbosa tem uma das carreiras mais frutíferas do basquete brasileiro. Único atleta do país a receber um prêmio individual na melhor liga de basquete do planeta (o de melhor reserva em 2007), ele está há mais de uma década na NBA, Leandrinho, como é conhecido, tem seis temporadas com média de mais de 10 pontos e é um dos jogadores mais respeitados e carismáticos por onde passou.

lb7Com passagem marcante pelo Phoenix Suns, onde jogou e se tornou amigo íntimo do agora aposentado Steve Nash, Leandrinho agora é reserva e peça fundamental do Golden State Warriors, melhor time da temporada 2014/2015 da NBA (58-13) e um dos maiores favoritos ao título do campeonato.

O blog conversou por email com o jogador que tem 7,1 pontos de média e é o responsável por manter o alto nível da equipe quando substitui a Stephen Curry e Klay Thompson, simplesmente os dois melhores jogadores da franquia. Na entrevista Leandrinho falou sobre os Warriors, Nash, a expectativa para uma final brasileira, seu sonho de ser campeão da NBA e, claro, seleção brasileira. Confira!

lb9BALA NA CESTA: A campanha do Golden State chega a surpreender a vocês, atletas da equipe? Não pela qualidade, mas sim por se tratar de uma comissão técnica nova, por serem dois titulares diferentes na rotação (Green e Barnes voltando a começar as partidas) e pelo estupendo começo da equipe (31 vitórias nos primeiros 36 jogos)?
LEANDRINHO: Não, jamais. Desde o início da nossa preparação nosso objetivo era fazer uma grande temporada regular. Houve alguns percalços, mas sabíamos que passaríamos por tudo como um grupo unido, focado e preparado para vencer obstáculos. Nosso excelente começo de temporada só facilitou todo o processo.

duplaBNC: A falta de experiência das duas principais estrelas do time, Stephen Curry e Klay Thompson, pode pesar nos playoffs diante de times mais experientes como Spurs e Grizzlies?
LEANDRINHO: Creio que o talento e a personalidade dos dois suprem essa possível falta de experiência. Isso sem falar no que os outros jogadores podem acrescentar neste quesito. E mais do que experiência jogo de playoff pede personalidade. Às vezes o cara tem uma rodagem incrível na NBA, uma bagagem e tanto, mas não consegue ser decisivo nos jogos grandes. É preciso ter personalidade para assumir essa responsabilidade. E isso nosso time tem isso de sobra, principalmente o Curry e o Klay.

lb3BNC: Sobre a sua temporada, o que você pode nos dizer? Ser reserva de feras como o provável MVP Stephen Curry e Klay Thompson é o papel mais difícil que você já teve na NBA justamente por não poder deixar, como você vem fazendo, a peteca cair quando eles saem de quadra?
LEANDRINHO: Com certeza é uma das funções mais difíceis da minha carreira. Talvez por tudo que passei recentemente, como as lesões e o retorno à NBA, seja mesmo o maior desafio da minha vida no basquete. Mas por outro lado, é algo que exigiu, desde o início, uma preparação muito intensa. E quando o time precisou de mim estava preparado para ajudar e ser importante. Isso me fez crescer rapidamente na equipe e me adaptar com mais facilidade ao time.

splitter1BNC: Ano passado o Tiago Splitter foi o campeão, e neste ano podemos ver dois times com brasileiros na final da NBA (em especial o próprio Tiago com o Spurs ou você com os Warriors no Oeste e o Cleveland, do Anderson Varejão, no Leste). Já pensou que podemos ter uma final brasileira no melhor campeonato de basquete do mundo? Como isso fica na sua cabeça?
LEANDRINHO: Seria histórico. Todos nós brasileiros muito para chegar até aqui e hoje nosso reconhecimento é o carinho e o apoio de todos, principalmente do povo brasileiro. O título do Tiago abriu muitas portas para o esporte no Brasil. Tenho certeza que somos exemplos para muitos garotos amantes do basquete. E isso é muito gratificante. Sem dúvida isso que você cita é uma motivação extra para todo nosso sacrifício no dia a dia.

lb8BNC: Depois de tudo o que você já passou (melhor sexto homem, destaque em playoff, lesões), chegar a uma final de NBA com os Warriors seria um prêmio imenso por tudo o que você já passou em sua vida e carreira? Como conter a ansiedade para que essa vontade que todos da equipe têm de vencer um título não atrapalhe tanto nos jogos que ainda restam na fase regular e também na pós-temporada?
LEANDRINHO: Não podemos pular etapas. Temos que viver jogo a jogo. O time está em um ótimo momento, o jogo tem encaixado, nosso entrosamento é fantástico e tudo mais. Só que ainda não ganhamos nada. E ainda estamos muito longe do nosso objetivo principal. Temos a exata noção disso. Por isso, estamos mantendo o pé no chão e nos dedicando ainda mais nos treinamentos e neste fim de temporada regular. A vontade de vencer todos têm, mas é preciso ter inteligência e planejamento. Para ganhar campeonato é preciso talento, comprometimento e estratégia.

lb2BNC: O time do Golden State é um dos mais entrosados da liga e isso é nítido não somente nos jogos, mas também fora de quadra. Analistas da NBA atribuem parte do sucesso à amizade que os jogadores mantêm. Li que vocês fazem uma brincadeira para pagar a conta nos restaurantes, onde um jogador sorteado ("Credit card roulette") acaba tendo que arcar com tudo. Você já foi "sorteado" em um desses jantares?
LEANDRINHO: Essa é apenas uma das brincadeiras que fazemos para firmar nossa união e comprometimento. Costumamos dizer que nossa "Warriors Family" (Família Warriors) é mais forte do que muitos pensam. E isso nos traz ainda mais entrosamento e confiança para os jogos. Você olha pro lado e confia em todos os companheiros. Sabe que eles vão correr por você, assim como você correrá por todos eles. Isso ajuda muito na hora de passar por obstáculos complicados. Fui muito bem-recebido. É um grupo fantástico, um dos mais incríveis em que já joguei e procuro tentar ajudar sempre. Fora da quadra, tento sempre motivar, incentivar eles, e, sempre que acho necessário, dar algum conselho. E ouço conselhos também. Nunca é tarde para aprender.

alex2BNC: Nos últimos anos disse que você sentiu muito a falta de fazer a pré-temporadas nos EUA, o que aconteceu desta vez. Vendo seus jogos noto você muito mais solto em termos técnicos e "voando" na parte física. É por aí mesmo? No que a pré-temporada contribuiu para que você esteja fazendo uma temporada longe de lesões graves e mantendo ótimo nível de atuações como tem feito?
LEANDRINHO: Claro. A pré-temporada é uma das mais partes mais importantes do basquete norte-americano. Na NBA, se você não se prepara para jogar a temporada da forma ideal, não aguenta o ritmo e a intensidade do jogo. Não só pelas lesões, mas por todo o contexto que cerca a NBA. Você simplesmente não irá aguentar. E estava realmente sentindo falta disso. Me preparar melhor, chegar bem física e tecnicamente ao início da temporada regular, adquirir mais confiança e ritmo de jogo. Tudo isso facilitou minha adaptação ao time e me deu mais tranquilidade para jogar o meu basquete. Para prevenir lesões e manter o meu preparo físico, sobretudo na parte final da temporada, eu conto com a ajuda do Alex Evangelista (foto à direita), fisioterapeuta brasileiro.

BNC: Em relação a parte técnica, você consegue detectar mudanças no seu jogo? O quanto daquele Leandrinho que começou na NBA há uma década está diferente do de hoje?
LEANDRINHO: Sim, consigo. Mas acredito que seja algo natural, pela rodagem que você vai adquirindo, a maturidade que seu jogo vai ganhando. É uma evolução natural do atleta. Antes eu era mais agressivo, impetuoso. Hoje procuro jogar mais com a inteligência, pensando e cadenciando mais o jogo. Você vai adaptando as suas novas características conforme o tempo passa.

lb4BNC: Boa parte do sucesso da sua equipe se deve, também, ao técnico. Como explicar o sucesso tão rápido do Steve Kerr? O cara é um treinador novato e logo no primeiro ano tem a melhor campanha da NBA, dirigiu o time do Oeste no All-Star e tem tudo para conquistar o prêmio de Técnico do Ano. Qual o segredo dele?
LEANDRINHO: O Steve é um grande treinador. Um cara estrategista, mas ao mesmo tempo bastante motivador. Parte do nosso sucesso se deve ao seu trabalho, que tem sido fantástico. Ele procura sempre ouvi o lado do atleta, não só dos mais experientes, como dos mais jovens também. Nós ficamos à vontade com ele e isso nos ajuda bastante. Ele é um cara extremamente profissional. Sempre tivemos uma boa relação e fiquei muito feliz quando soube que havia o interesse do Warriors no meu trabalho. Sabia que seria um novo desafio em minha carreira, mas apostei demais no projeto. Hoje sou muito feliz aqui.

nash1BNC: No sábado passado Steve Nash anunciou a aposentadoria e citou você como um dos melhores companheiros que ele teve em sua jornada na NBA. É possível dizer que ele foi realmente o seu maior mentor na liga?
LEANDRINHO: Sim, é possível. O cara com quem eu mais aprendi dentro e fora das quadras. Um craque como jogador e pessoa. O Steve era fantástico. Agradeço demais por ter podido conviver com ele no meu início de trajetória na NBA e ter me tornado seu amigo. Além de aprender demais com seus conselhos e dicas, ele fez o meu jogo crescer enquanto estivemos juntos. Se hoje estou onde estou, devo bastante a ele. E ele sabe disso.

lb5BNC: Um dos assuntos mais comentados nos EUA neste momento é sobre o uso das tais Analytics. Muita gente acha loucura (Charles Barkley, por exemplo) e há uma outra vertente que acredita fielmente nisso (Daryl Morey, GM do Houston). Você é um dos jogadores que há muito tempo acaba pontuando nos famosos lugares-chaves do basquete hoje (infiltrando e matando bolas de três – do corner inclusive). As estatísticas ajudam mesmo, ou há muito de exagero nisso tudo também?
LEANDRINHO: Ajudam, sim. Mas números não são tudo. Acredito num equilíbrio de fatores. Você precisa das estatísticas para estudar seu desempenho, sua evolução, mas por outro lado elas não são tudo no basquete. É preciso desenvolver suas táticas, seu plano de jogo. Lógico que, em muitos casos, você se baseia nos números, mas jamais pode ficar dependente deles para se desenvolver no esporte. Acredito muito num equilíbrio de fatores nesse caso.

phoenixBNC: É possível fazer um comparativo dos dois candidatos ao título que você já jogou – o Phoenix Suns de Nash/Marion/Stoudemire e o Golden State Warriors dos Splash Brothers (Curry e Klay)? O próprio Kerr já comparou Curry com Nash, mas a questão não é nem estilo de jogo, mas o momento que as equipes viveram. O Suns chegou em 2005/06 pronto pra brigar pelo título, Nash foi o MVP, Nash e Marion foram All Stars mas a lesão do Stoudemire atrapalhou. No ano seguinte o Suns voou, você foi o melhor sexto-homem, o time era popular e um dos favoritos ao título mas foram barrados pelo Spurs. O Warriors não joga no mesmo ritmo acelerado do Suns, mas é o melhor time da temporada, o Curry é o favorito ao MVP da temporada, Curry e Klay All Stars. Dá pra comparar os dois times de alguma maneira?
LEANDRINHO: Difícil fazer comparações. Mas são times parecidos. Não dá para dizer que aquele era mais técnico porque este é muito técnico também. Ou que este é mais veloz na transição, mais intenso, porque aquele também era ótimo nesse quesito. Lembro que muitos apostavam demais naquele time, no Nash, no próprio Stoudemire. E assim como é hoje no Warriors, éramos muito unidos, focados, comprometidos. Tivemos problemas de última hora que nos atrapalharam. Hoje acho que estamos mais preparados para situações assim. É como se tivéssemos mais alternativas para solucionar possíveis obstáculos. Acredito muito neste grupo.

lbBNC: Para fechar: o que você está esperando dos próximos passos em relação a seleção brasileira? Este ano temos Pan-Americano e Pré-Olímpico e ano que vem as Olimpíadas. Os Jogos serão a sua despedida da seleção, ou não pensa nisso ainda?
LEANDRINHO: Não gosto de ficar pensando muito no futuro dessa forma. Prefiro viver o momento, me dedicar ao máximo e honrar sempre o meu país quando for convocado. A recompensa sempre vem de acordo com a sua dedicação e o seu trabalho.

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