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Bala na Cesta

Minha análise sobre o primeiro ato de Zanon como técnico da seleção

Fábio Balassiano

30/09/2013 01h43

Como você leu aqui neste blog, terminou no sábado a Copa América de basquete feminino em Xalapa. O Brasil ficou em terceiro (Cuba campeã, Canadá medalha de prata e as três primeiras colocadas no Mundial de 2014), jogará a competição do próximo ano e certamente terá muito o que corrigir pra chegar minimamente preparado para o torneio, que terá nível técnico, físico e tático centenas de vezes maior do que este no México. Por isso vale analisar o início de trabalho de Zanon, que comandou a equipe nacional no Sul-Americano e na Copa América.

Em primeiro lugar, é importante dizer o seguinte: a ideia de Zanon e da Confederação (ponto pra Vanderlei), de renovar a seleção brasileira, é corretíssima (e compartilhada aqui por este blogueiro há anos). Fazia-se necessária uma quebra de paradigma na seleção, com a entrada de meninas com potencial imenso mas com poucas oportunidades até mesmo em seus clubes, que preferem apostar nos produtos prontos e que ainda dão resultado no basquete interno. Foi uma nova filosofia de trabalho, um desafio, um risco grande até. Treinador e CBB embarcaram juntos sabendo de todos os obstáculos e estão de parabéns por seguirem nesta linha.

E como também foi dito aqui, derrotas viriam, oscilações viriam, irregularidades viriam. E vieram (não precisava ser nenhum gênio pra saber que viriam…). O Brasil jogou um torneio continental com 9 das 12 meninas tendo menos de 25 anos, e obviamente pagou por isso em quase todas as partidas (contra Cuba, recheada de jogadoras experientes e no primeiro match-point pro Mundial-2014, ainda mais e sem surpresa alguma). Este é um fato, e obviamente é o começo de um processo com muitas derrotas no caminho até (no mínimo) os Jogos Olímpicos de 2016, quando este grupo que está nas mãos do treinador já terá rodado um bocado não só em jogos, mas também em treinos e amistosos.

Além disso, duas coisinhas merecem ser ditas antes de passarmos ponto a ponto sobre o que vimos recentemente na seleção brasileira. Acho mais do que fundamental que a Confederação Brasileira dê a Zanon e às meninas um período de treinamentos e amistosos fortíssimo em cada um dos anos que virão de agora pra frente. É ficar uma semana nos Estados Unidos, três fazendo jogo-treino na Europa e por aí vai. Neste primeiro momento não deu, calendário já estava feito, sei disso tudo, mas é essencial para a melhora das meninas que o intercâmbio com os grandes centros esteja na ordem do dia (jogar contra Chile, Argentina e Porto Rico não vai ajudar em absolutamente nada). Outro fator importante que merece ser dito: como é ruim o trabalho de base do basquete brasileiro de um modo geral, e no feminino em particular. Vimos uma seleção brasileira ADULTA com atletas com problemas gravíssimos de fundamento (gravíssimos mesmo, algo que chegou a me assustar pois não imaginava que fosse tão triste assim), de leitura de jogo e de controle psicológico. É algo que precisa ser visto, revisto, pensado e repensado. Não é admissível que uma menina de 19, 20, 21 anos, independente de jogar em seleção, não consiga fazer drible com duas mãos, tenha dificuldade em acertar passes e por aí vai (por aí explica-se, também, o nível técnico abaixo do razoável da LBF).

Some estes dois pontos acima e veja o tamanho do trabalho que Zanon, técnico da seleção adulta que faz parte de uma engrenagem muito maior (a do basquete brasileiro feminino como um todo, que deveria ser muito mais bem tratado por uma Confederação Brasileira que não liga pras meninas e muito menos para a base, para a formação de atletas, o que é lamentável), terá que fazer para tentar colocar o Brasil de novo entre, sei lá, os cinco melhores países do mundo (se é que conseguirá, já que o material humano não é dos melhores). Por isso, até para deixar a análise bem completa, dividi em tópicos positivos e negativos dos primeiros atos do técnico da seleção brasileira. Vamos lá:

PONTOS POSITIVOS:

– A parte defensiva melhorou muito (quem não enxerga isso é maluco). Como o ataque é ruim, Zanon poderia arriscar até mais com a marcação, tornando-a mais agressiva, "esvaziando" o ataque e abusando do potencial físico de suas atletas (Nádia, Tatiane, Clarissa, Damiris, Joice etc.), mas este é um outro papo.
– O próprio processo de renovação merece ser destacado por aqui também
– A evolução de algumas jogadoras em pouquísismo tempo (cito Débora Costa, Tatiane Pacheco, Damiris e Patricia)
– A parte física está muito bem entregue nas mãos de Vita Haddad (o cara é muito bom e as atletas estavam sempre muito bem em todas as partidas)
– A confiança de Zanon nas meninas mais jovens (Tatiane e Patricia, por exemplo, jogaram de titular na frente das experientes Karla e Chuca, e isso merece ser destacado).

PONTOS NEGATIVOS:

– A insistência nas veteranas Karla e Chuca (esta última mal jogou na Copa América; e a primeira, de quem gosto muito e sei que ela pode render muito mais do que na competição, só entrou em quadra para arremessar de três pontos – e com mira torta, 28% de fora). Ainda não consigo entender por que diabos Isabela Ramona ficou no Brasil.
– Como chutou de três a seleção feminina na Copa América. Isso é uma lástima e algo que não se via em seleção feminina há anos. Não dá, sinceramente não dá aceitar – e com meninas que não são especialistas em bolas longas.
– A falta de um padrão ofensivo claro. Contra defesas por zona, então, foi uma tragédia, tragédia absoluta. Se a saída do Brasil será sempre arremessar de fora contra marcações por zona temos um problema seríssimo de concepção de jogo e opções táticas (abordei o assunto na semana passada).
– Não há jogo com as pivôs. As gigantes do Brasil só recebem bola quando há rebote ofensivo ou em finais de corta-luzes. As jogadas NUNCA começam com as meninas do garrafão, que tocam muito pouco na bola durante a partida. Ano que vem ele terá Érika de Souza, uma das melhores jogadora do planeta, e eu espero sinceramente que ela seja "alimentada" como merece.
– Intensidade no ataque (as meninas ficavam muito tempo paradas, a bola não rodou e a armadora quase sempre terminava com a bola nas mãos por 10, 12 segundos)
– A convocação poderia ser melhor feita em algumas posições (não levaria Tainá e Chuca, por exemplo).
– Fundamentos, fundamentos e fundamentos. Não vale citar as atletas por aqui, mas menina de seleção adulta que não consegue dar um passe ou que tem dificuldade pra dar drible pros dois lados não traz um bom sinal.

Está claro que o saldo de Zanon é positivo, bem positivo por aqui. Mas também está muito claro que, em decorrência de anos de trabalhos ruins (na base e na própria seleção adulta), há um trabalho imenso para ser realizado pelo técnico da seleção brasileira e pela entidade máxima do basquete nacional (CBB). Estou certo que ele, Zanon, inconformado e procurando sempre a melhora de suas atletas, também sabe disso. O Sul-Americano e a Copa América foram pontos de partida de uma longa, árdua e difícil jornada, que é a de repaginar o basquete feminino nacional.

O começo foi bom, satisfatório, pavimentou muita coisa, mas ano que vem o desafio é maior e o time precisará evoluir. Que Zanon, as atletas e a CBB estejam preparados.

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