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Bala na Cesta

Os méritos da Espanha, bicampeã mundial "de fora pra dentro da quadra"

Fábio Balassiano

16/09/2019 01h57

Não há muito o que se falar de uma final de Copa do Mundo que termina em 95-75 como a surra que a Espanha aplicou na Argentina na manhã de ontem em Pequim, na China, para se sagrar bicampeã mundial (o outro título foi em 2006).

Os ibéricos contiveram Luis Scola (8 pontos, 1/10 nos chutes), correram como loucos nos deslocamentos sem a bola e abriram vantagem desde o começo. Ricky Rubio foi o MVP, o técnico Sergio Scariolo deu um nó em Sergio Hernandez e dentro do garrafão Marc Gasol, o primeiro não-americano a ser campeão da NBA e mundial no mesmo ano, foi soberano. Título justo, incontestável e resultado de um trabalho de fora pra dentro da quadra do país que, hoje, é o segundo melhor quando falamos em basquete neste planeta.

Pouca gente sabe, mas o sucesso da Espanha tem duas datas-chave. A primeira é a do dia 11 de setembro de 1983. Foi a criação da Liga ACB, onde os clubes passaram a gerenciar o campeonato nacional, deixando a Federação local "apenas" com os torneios de desenvolvimento (segunda, terceira e quarta divisões), massificação e capacitação de técnicos e árbitros.

A segunda data é a de 10 de agosto de 1984, quando menos de 12 meses depois da criação da Liga ACB os espanhóis foram medalha de prata em Los Angeles. Era um time não mais que mediano, mas que se beneficiou do boicote dos países da União Soviética, que não foi aos Jogos Olímpicos, para conseguir uma inesperada segunda colocação (o ouro ficou com Michael Jordan e os EUA).

Assim como aconteceu no vôlei brasileiro, que conseguiu impulsionar a modalidade depois da prata na mesma Olimpíada, os europeus foram com sede para popularizar e ajudar a crescer o basquete a partir de um resultado que eles mesmos não esperavam. Não era, ainda, reflexo da criação da Liga e nem mesmo de uma gestão mais moderna da Federação Local como acabou acontecendo depois disso, mas algo que literalmente caiu no colo e eles tiveram competência para aproveitar.

Daí pra frente a semente foi regada, as divisões de base trabalhadas, os técnicos formados, os clubes enchendo de alunos e prospectos e toda roda girou. Os dois títulos mundiais, as três medalhas olímpicas, as conquistas do EuroBasket e tudo mais são reflexo de uma cultura esportiva brilhante e que merece ser analisada com calma.

A bola não entra por acaso, já dizia aquele famoso livro. No caso da Espanha, o aro ficou um pouco maior quando a organização falou mais alto. A Argentina campeã seria reflexo puro e simples de uma cultura de desenvolvimento de atletas muito forte por parte dos técnicos e de um grupo de 10/12 atletas muito bons. O modelo de gestão argentino é muito parecido com o nosso – ruim, cheio de solavancos e com presidente sendo deposto e tudo (no caso deles há cerca de quatro anos).

O troféu espanhol, por sua vez e bem mais justo do ponto de vista de colocar as coisas em ordem, é o troféu do planejamento, da gestão, da visão de futuro, do plantar sempre para colher de quando em vez. A Espanha hoje tem o segundo melhor campeonato do mundo e não depende de um, dois, três jogadores. Não foram a China Pau Gasol, Nikola Mirotic, Serge Ibaka e Alex Abrines, por exemplo. E a final foi uma surra de 20 pontos. Diz muito sobre a qualidade do elenco e o tamanho da mão de obra disponível para o técnico Scariolo fruto de um trabalho magnífico de massificação e popularização do esporte.

Viva o basquete espanhol.

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