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Bala na Cesta

Nem Cavs de Lebron e nem Celtics - os motivos que explicam a liderança do Raptors no Leste da NBA

Fábio Balassiano

09/03/2018 07h00

Antes de começar a temporada 2017/2018 da NBA a expectativa básica era sobre uma provável final de conferência Leste envolvendo o Cleveland Cavs, de LeBron James, e o tradicional Boston Celtics, times que se movimentaram bastante pro campeonato e que tiveram seus armadores trocados (Isaiah Thomas saiu de Boston e foi pra Ohio, e de Ohio saiu Kyrie Irving pra ser o craque dos verdes). Chegando ao final da fase regular, quem dá as cartas até com certa folga na conferência não é nem Cleveland e nem Boston. É o Toronto Raptors, única franquia canadense da liga e que tem 47 vitórias em 64 jogos (6 seguidas e 14 nos últimos 15 duelos).

O mais interessante de tudo é como o Toronto, que tem o brasileiro Lucas Bebê no elenco, tem conseguido chegar às vitórias. Em recente entrevista ao Woj, da ESPN, o técnico Dwane Casey afirmou que ao final da temporada passada teve uma conversa com Masai Ujiri, o manda-chuva da franquia. No papo, Masai afirmou ao treinador: "Temos que mudar nossa maneira de jogar. E em tudo. Trate de dar espaço aos jovens, de espaçar a quadra, de mudar os seus conceitos". E assim foi feito.

Com pouco menos de 20 jogos por jogar ainda na fase de classificação, o Raptors é o único time da NBA que figura entre os cinco melhores tanto em ataque (o quarto) quanto em defesa (o terceiro). Para chegar a isso, o treinador passou a usar algo bastante incomum desde que chegou ao Canadá em 2011 – uma rotação gigantesca. Ao todo são 11 atletas jogando 15+ minutos por jogo, e com todos eles produzindo no mínimo 5,9 pontos por partida. Na defesa, o time é o terceiro que mais pontua através dos desperdícios de bola forçados nos adversários (18,3 pontos assim por jogo).

Seguindo a risca o que Masai lhe pediu, jovens como Norman Powell, Jakob Poeltl, Paskam Siakam, OG Anunoby, Fred VanVlett e Delon Wright ganharam tempo de quadra para sustentar os experientes DeMar DeRozan, Jonas Valanciunas, Kyle Lowry, Serge Ibaka e CJ Miles, reforço que chegou para abrir a quadra chutando mais de três pontos (39% de aproveitamento e gatilho bem certeiro). E quase todos se dando muito bem. Pra ficar em dois exemplos, VanVleet, não draftado, é um reserva de ótimo valor na armação. Anunoby é um carrapato defensivo de dar gosto mesmo sendo um calouro praticamente desconhecido do grande público.

Coletivamente, o impacto das mudanças de Casey são bem visíveis. O Toronto, que trocava 270 passes por jogo em 2016/2017, hoje dá quase 300 por partida (oitavo maior índice da NBA) e isso se reflete também no número de assistências (saltaram de 18 para 23,5 por noite). A saída da comissão técnica para isso foi bem simples mas ao mesmo tempo pouco ortodoxa. O Raptors tirou a bola das mãos de seu armador. Kyle Lowry segue sendo o líder do time em assistências (6,6), mas passou a dividir o espaço da condução do ataque com o astro maior da franquia.

DeMar DeRozan ficou muito conhecido do grande público na semana passada quando anunciou que teve que tomar medicamentos para tratar da depressão. Ato bem corajoso de um jogador que é bem subestimado por boa parte da crítica e do público. DeRozan é, sem dúvida alguma, um dos melhores jogadores da NBA há tempos e nessa temporada tem sido pra lá de especial.

Embora seus pontos tenham caído de 27 para 24,3 pontos de 2016/2017 para 2017/2018, suas funções no time mudaram – e mudaram muito. Primeiro ele foi encorajado por Casey a chutar mais de 3 pontos (as 1,7 tentativas por jogo mais que dobraram – 3,6). Embora com aproveitamento ainda não mais que razoável (31%), foi uma transformação e tanto para um jogador que baseava seu lado ofensivo em arremessos de média distância e muitos lances-livres (jogando mais no perímetro, seus lances-livres diminuíram de 8,7 para 7,3 por partida).

Depois disso, algo até então impensável para quem é a arma ofensiva número um para pontuar no Toronto Raptors há tempos: Casey pediu para que DeMar comandasse boa parte das ações do ataque ao lado de Lowry. Com isso, o camisa 10 tem 5,2 assistências por jogo, maior média de sua carreira. E o Toronto, com DeRozan dividindo as responsabilidades que eram apenas de Lowry, é o quarto time que menos desperdiça bolas no ataque em toda NBA (12,5 por noite) e o segundo no índice de assistências por erros (1,8, atrás apenas do Warriors, que têm 1,9).

Com a bola nas mãos, ele tem sido capaz de distribuir passes, mas também de decidir o jogo quando seu time lhe solicita (foram 42 pontos bem incríveis contra o Detroit na quarta-feira, veja só abaixo):

Com os titulares bem amparados por reservas jovens, o técnico Dwane Casey está conseguindo algo que também não obtinha sucesso nos últimos campeonatos – descansar suas principais estrelar. É bem verdade que DeRozan praticamente repete os minutos de 16/17 em 17/18 (35,4 para 34,1), mas Lowry joga 5,3 minutos menos por jogo nesta temporada, Ibaka menos 3,7, Valanciunas, menos 3,4. Não será por falta de fôlego que o Toronto se dará mal nos playoffs, não há a menor dúvida.

No final das contas, sabemos bem que a análise sobre o Toronto se reduzirá, pelo lado de boa parte da imprensa e de grande parcela do público, no bom e velho "quero ver nos playoffs". Não dá pra dizer que é sem razão devido ao passado recente não muito animador dos Raptors em pós-temporada (embora tenha chegado à final do Leste em 2016, o time nunca foi confiável no mata-mata). Mas pode ser, também, que de tanto perder o time que mais mudou a sua forma de jogar de uma temporada pra outra tenha encontrado a fórmula das vitórias.

O Toronto, hoje, é, sim, candidato ao título da conferência Leste.

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