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Bala na Cesta

Demissão de Dedé é compreensível, mas fala muito sobre a falta de planejamento do Vasco

Fábio Balassiano

07/03/2018 06h30

Você leu aqui ontem com exclusividade o depoimento de Dedé Barbosa a respeito da sua demissão do Vasco da Gama na noite de segunda-feira. Refleti bastante sobre o assunto e agora coloco exatamente o que penso a respeito da atitude do time, que, aliás, levou uma tunda do Caxias do Sul ontem (87-70) no primeiro jogo sem o (agora) ex-treinador. Vamos lá.

Em primeiro lugar, temos o óbvio. Dedé não fez um grande trabalho no Vasco da Gama. Isso é muito claro e a campanha dele (10-14) é um certificado de que, embora tenha um conhecimento absurdo sobre basquete, ele falhou em não extrair o melhor de um grupo que possui bons valores (ao menos no papel). Como disse também a mim em entrevista pré-NBB, o técnico montou o elenco com as peças que julgava as mais apropriadas mas em nenhum momento conseguiu o melhor encaixe delas (peças).

Ainda sobre Dedé, cabe uma observação de quem gosta dele. Apesar de todos os seus erros do passado, claramente é um cara com coração gigantesco, com conhecimento incrível sobre basquete e muito antenado às mudanças mais recentes do jogo. Há um ponto muito claro, porém, que ele precisa evoluir – na comunicação para seus atletas. Seria leviano eu julgar seus treinos, algo que nunca vi na vida, mas durante os jogos (mais especificamente nos tempos técnicos) ele, que possui uma usina gigante de conhecimento e de informação em sua pulsante cabeça, despeja milhões de situações em menos de dois minutos para seus atletas.

É humanamente impossível que o jogador, ali nervoso devido a partida, consiga absorver 1% do que Dedé tenta passar. Uma vez li um estudo neurológico da NBA que um atleta consegue entender nada menos que OITO SEGUNDOS do que os técnicos falam nas instruções nos tempos. Talvez condensar um pouco melhor as instruções e codificá-las melhor (sendo mais sintético e mais objetivo) seja um ponto importante para Dedé em seus próximos trabalhos. Os tempos técnicos, no final das contas, não são para o treinador falar e "aliviar" as suas tensões, mas sim pros atletas ouvirem e receberem informações, extraírem algo e retornarem à quadra de modo a remontar uma situação.

Estes são alguns dos pontos sobre o treinador Dedé, que, reitero, teve falhas bem grandes como treinador do Vasco. Mas o que dizer da agremiação cujo planejamento bizarro fez com que o time COMEÇASSE a temporada atrasando salários? David Jackson, o melhor pontuador da equipe, reclamou dos atrasos, saiu do time, voltou e até hoje ninguém sabe se a parte financeira encontra-se sanada por parte dos dirigentes cruzmaltinos. Chris Hayes, pivô, enviou mensagem pra antiga diretoria informando que sairia da agremiação caso seus pagamentos não fossem efetuados – Hayes enviou o texto duas horas antes de um jogo e ameaçou não voltar das festas de fim de ano (2017). Será que o fora da quadra não impacta no dentro da quadra?

E por falar em planejamento, a diretoria vascaína sinceramente acredita que resolverá algo demitindo um treinador a menos de um mês do começo do playoff do NBB? É sério isso? É uma cultura do futebol, a do imediatismo, a da solução emergencial, que chega ao basquete – mas que jamais deveria chegar. Infelizmente é algo que não faz parte da modalidade e que acabou pegando Dedé como vítima (ele é o primeiro treinador demitido durante esta temporada). A quem a nova diretoria vascaína pensa que vai pescar com essa isca? Se ela ainda não percebeu, esta temporada já foi pro ralo há bons três meses. Não houve química, não houve encaixe, não houve sinergia torcida / time. Já foi – e foi há muito tempo. O problema é MUITO maior que uma simples troca no comando técnico.

Há rumores, também, que o clima interno estava péssimo. Nezinho e o próprio Dedé quase chegaram (ou chegaram) às vias de fato no último sábado após a derrota para o Paulistano em São Paulo (102-59). Houve comentários, também, que os famosos treinos em dois turnos tão pedidos por Dedé foram trocados por apenas uma prática (algo que o técnico nunca engoliu). E as práticas específicas, tão fundamentais para a evolução dos atletas, não aconteceram na medida que a comissão técnica desejava. É aquele velho ditado: em casa que falta pão, todo mundo briga e ninguém tem razão.

O que pensar de um clube que, em seu segundo ano no NBB, entra no campeonato em uma ebulição política absurda? Nos dias pré e pós eleição na Colina, MUITA gente não sabia se o basquete vascaíno iria não continuar pro NBB11, mas sim TERMINAR a vigente temporada. Será que o fora da quadra não impacta no dentro da quadra?

E o que falar, também, de atletas que chegaram ao Vasco e estão até hoje em má forma física? Para ficar em apenas um exemplo, Lucas Mariano tinha tudo para brigar pelo troféu de MVP da temporada. Como ele respondeu a isso? Estando mal em termos atléticos e sem nenhuma melhoria em seu jogo (saiu de 18 para 11 pontos por partida). Quer outro nome que rendeu bem menos do que prometia (aqui o lado é técnico e não físico)? Guilherme Giovannoni, outro reforço de peso, que tem 50% a menos de pontos e a sua pior média na história do NBB (11,6 por partida) e uma monstruosa queda defensiva de um campeonato para o outro.

O acaso também impactou no dia a dia de Dedé. Gui Deodato, seu melhor marcador de perímetro, se machucou com gravidade no final de 2017 e recentemente retornou ao time. Fúlvio, o armador titular e responsável por colocar o ritmo de jogo do treinador na quadra, também ficou quase dois meses fora.

Desculpem, mas me respondam vocês agora: tinha como dar certo esta temporada do Vasco? Não com Dedé, mas com qualquer treinador. Neste cenário, a gente não espera solução de um técnico, mas sim de um milagreiro. Sem planejamento, sem pagamento em dia e sem organização não é de um comandante que o Vasco precisa, mas sim de alguém que tenha poderes sobrenaturais para recolocar o time nos trilhos ainda neste NBB.

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