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Bala na Cesta

Entendendo melhor as lesões no basquete mundial, por Gustavo Nascimento

Fábio Balassiano

26/02/2018 15h00

* Por Gustavo Nascimento

Estava em uma discussão umas semanas atrás com meu chefe, no laboratório de pesquisa no qual faço parte, e entre as conversas veio o assunto das lesões da atual temporada da NBA. E de tanto conversarmos veio a vontade de fazer um estudo sobre. Durante as pesquisas feitas encontrei um artigo bem interessante, avaliando as lesões no basquete profissional (NBA e Liga ACB espanhola) e pensei em falar um pouco para quem gosta de uma leitura um pouco mais acadêmica.

"O basquete profissional dos Estados Unidos da América (N.B.A.) é um modelo que é tomado como exemplo para o basquete que se pratica no resto do mundo. Sem dúvida, antes de fazer comparações, é necessário realizar alguns esclarecimentos. Os jogos da N.B.A. duram 48 minutos, o tempo de posse de bola é de 24 segundos e o tipo de tática defensiva predominante é a marcação homem-a-homem, ou seja, um jogador é seguido continuamente pelo seu marcador. No basquete da Federação Internacional de Basquete (F.I.B.A.), que é o realizado no resto do mundo, as partidas duram 40 minutos, o tempo de posse de bola é de 30 segundos e existem vários tipos de defesa que não obrigam a um marcador acompanhar diretamente um dos seus adversários. Na N.B.A. são disputadas uma média de 80 jogos por temporada, quase o dobro da liga A.C.B. (liga profissional espanhola de basquete). Isto significa que na N.B.A. o tipo de jogo é consideravelmente mais rápido e a defesa homem-a-homem implica um maior esforço físico e uma maior possibilidade de contato.

A maior parte das lesões na N.B.A. ocorre nos jogos com uma incidência quase duas vezes maior do que as lesões que ocorrem durante os treinos. Na ACB. esta relação se inverte. As lesões que acontecem nos jogos são um terço do total. Foi relatado por vários autores que a maior parte das lesões ocorre nos membros inferiores. Os resultados da liga espanhola, que podem ser vistos na tabela 1, indicam que as lesões dos membros inferiores perfazem um total de 46,1% das lesões comunicadas, que acabam por chegar acima de 60% quando se consideram as lesões musculares e as lesões ósseas por estresse (sabe-se que estas afetam os membros inferiores na sua quase totalidade). Na NBA., como se pode observar na tabela 2, os membros inferiores são o sítio de 57,3% das lesões.

As lesões que afetam o tronco correspondem a quase um quinto do total de lesões em ambos os estudos (18,39% na A.C.B. e 17,9% na N.B.A.), sendo patologia discal lombar em 2,83% na A.C.B. e 1% na N.B.A. Os membros superiores possuem uma menor incidência de lesões do que outras estruturas e correspondem a 12,76% e 15,9% do total de lesões nas estatísticas da A.C.B. e N.B.A., respectivamente. Por último, as lesões que atingem a cabeça representam 7,1% e 8,6% nas estatísticas da A.C.B. e da N.B.A., respectivamente. A estatística de lesões da liga profissional francesa mostra uma incidência maior de lesões dos membros inferiores (73,5%), com uma incidência menor das lesões do tronco (8,98%) e da cabeça (3,07%), sendo semelhante a incidência das lesões dos membros superiores (14,42%).

Todos os estudos concordam ao apontar a entorse do tornozelo como a lesão mais freqüente no basquete (tabela 3). O ligamento mais afetado é o calcaneofibular, já que em 9 de cada 10 casos o mecanismo de lesão é a inversão do tornozelo causada por uma má queda no solo ou _ mais freqüentemente _ por pisar em outro jogador. Não devemos esquecer o possível comprometimento da sindesmose tibiofibular ou a implicação de mais de um dos três grupos de ligamentos do tornozelo: calcaneofibular + talofibulares; deltóide (medialmente) e sindesmose tibiofibular.

Nos demais tipos de lesões há uma incidência variada, com destaque para a tendinite do tendão patelar e a condropatia femoropatelar, manifestações claras de um comprometimento do mecanismo extensor da perna em um esporte que envolve saltos, como é o basquete. A lombalgia é uma queixa freqüente do jogador de basquete e está relacionada com a sobrecarga da coluna lombar em movimentos de rotação e flexoextensão, com contusões e deslocamentos provocados por outros jogadores. A entorse do joelho, com lesão freqüente do ligamento cruzado anterior, é outra das lesões freqüentes nos jogadores de basquete. Outra lesão freqüente, embora haja incidências variadas nos diferentes estudos, é representada pelas entorses e luxações dos dedos das mãos, geralmente causadas pela própria bola. As outras lesões têm uma incidência menor mas devem ser consideradas pela gravidade potencial das suas seqüelas, como ocorre com a tendinite do calcâneo, a fasciite plantar, as hérnias e protrusões discais, as síndromes compartimentais e as roturas de meniscos.

É difícil conhecer a incidência exata das lesões musculares. No estudo realizado na N.B.A. é indicada a seguinte incidência de lesões musculares: isquiotibiais (3,3% do total de lesões), adutores (2,8%), tríceps sural (1,9%), quadríceps (1,3%), ombro (1,1%) e região lombossacral (0,9%) e a contusão quadricipital, o popular tostão, com uma incidência de 3,2%. Além disso, no basquete é produzida uma ampla variedade de lesões que afetam qualquer parte do organismo.

Nos estudos comparativos de incidência de lesões realizados com outros esportes, como o futebol, o handebol, o atletismo e a natação, encontramos alguns dados interessantes. Sem dúvida é na natação que se encontram menos lesões, que afetam regiões anatômicas diferentes dos outros esportes, com o predomínio dos ombros, região cervicotorácica e joelhos (respectivamente, 37,0%, 20,2% e 23,7%). O tornozelo, região muito afetada nos outros esportes estudados, só é afetado em 13,3% das lesões. O basquete apresenta uma incidência de lesões musculares e tendíneas menor do que o atletismo, esporte no qual estas lesões são mais freqüentes. Entretanto, no basquete há mais lesões agudas, enquanto que no atletismo predominam as lesões por sobrecarga.

Em relação ao futebol, o basquete também apresenta menos lesões musculares, mas mais lesões que afetam a coluna vertebral. Deve-se ainda destacar que no futebol as lesões afetam muito mais as extremidades do que no basquete (84,6% e 55 a 60%). A incidência de lesões, expressa em lesões por 1.000 horas de jogo é de 5,6 no futebol, 4,1 no handebol e 3,0 no basquete."

Em uma visão geral, o artigo escrito por Tarrero e Marqueta apresenta muitos pontos semelhantes ao que vemos atualmente no basquete mundial, apesar dos dados serem um tanto antigos. Um exemplo disso é a incidência de lesões no tornozelo que o estudo apresentou sendo a que ocorreu com maior frequência – isso na década de noventa; a mesma que vem fazendo muitas "vítimas" na atual temporada da NBA, como por exemplo, o grande pivô do New Orleans Pelicans, Demarcus Cousins e a jovem estrela do New York Knicks, Kristaps Porzingis. O comparativo que o estudo faz, mesmo que de forma superficial, também é bastante interessante, entre as lesões da NBA e a ACB, surgindo alguns questionamentos como: O estilo de jogo implica no volume e tipos das lesões? O calendário na NBA em comparação ao da ACB é um ponto na diferença no volume das lesões durante o jogo?

Concluindo, o basquete é um esporte com a tendência de sempre surgir algo novo – seja no estilo de jogo, ou nas formas de se deslocar em quadra e de se defender. E, como todo esporte de alto rendimento tem maior índice de lesões se comparado a pratica esportiva por lazer. Cabe à ciência pesquisar para que ocorra a prevenção de lesões nesses atletas de elite, assim como na potencialização dos seus resultados. Esse texto mostra apenas um entre diversos artigos que existem retratando a importância da ciência no esporte.

Sobre o blog

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