Topo

Bala na Cesta

Carlos Lima, basquete feminino, CBB, os clubes e as críticas

Fábio Balassiano

08/07/2017 07h30

Você leu aqui ontem em primeira mão que Carlos Lima é o novo técnico da seleção feminina de basquete, né? E essa foi mais uma semana agitada para o basquete feminino. Fim de Americana, novo treinador pra equipe nacional e redes sociais razoavelmente agitadas com os temas. Resolvi dividir esse texto em algumas partes. Algumas mais racionais. Outras mais emocionais. Vamos lá.

1) A ESCOLHA DE CARLOS LIMA -> Seria totalmente leviano de minha parte traçar qualquer análise profunda sobre a chegada de Carlos Lima. Vi alguns jogos de seus times de São José, outros no Maranhão e só ouço referências boas acerca dele. Mas prefiro esperar um pouco antes de escrever algo mais correto a respeito. A escolha da Confederação Brasileira foi claramente por alguém jovem, dentro de um custo razoável para uma entidade quebrada (falarei no ponto a seguir), que conhece bastante da base do país (Carlos foi técnico de seleções inferiores, como destaquei ontem) e que se encaixa no novo modelo de gestão da CBB. Deste canto prefiro esperar antes de mandar bala (perdão com o trocadilho) em um textão acerca do profissional recém-contratado.

2) O PAPEL DA CBB -> Antes de falar do feminino, vamos a uma visão geral das coisas. Quando converso com as pessoas da CBB dá uma agonia danada. Vejo os caras trabalhando, mas a lama em que a entidade se encontrava beira o surrealismo. Guy Peixoto e seu time estão tentando tirar o basquete do atoleiro, mas a herança do duo Carlos Nunes e Grego é bizarra de tenebrosa. Costumo dizer que nenhuma modalidade resiste a 20 anos de nunes-grego, e é por aí mesmo. Corajoso e sem parar um segundo, Guy e seus diretores estão tentando, mas não é uma tarefa muito fácil, não. Também com a nova gestão eu prefiro dar um tempo até que eles consigam minimamente entender em que casa eles estão alojados. É justo e se fiz assim com Nunes em 2009 é muito natural que faça o mesmo agora com Guy em 2017.

Sobre o papel da CBB em relação ao feminino, é muito óbvio que a entidade precisa fortalecer a base, massificar o esporte. Hoje o número de praticantes do basquete entre as meninas é baixíssimo e não será do dia pra noite que isso será revertido. Não é papel da Confederação assumir a Liga de Basquete Feminino e nem sustentar os clubes (LONGE disso!), mas é obrigação dela trazer cada vez mais garotas para o esporte, capacitar os técnicos (sobretudo o das divisões de baixo), promover campeonatos de base com constância e fazer com que a seleção brasileira feminina volte a ser um produto atrativo. Foi plataforma de campanha de Guy e esperamos, todos, que o basquete das meninas tenha espaço, voz ativa e importância dentro do seu governo.

3) O PAPEL DOS CLUBES -> O maior desafio do novo presidente da Liga de Basquete Feminino, Ricardo Molina, é fazer com que tenhamos mais clubes investindo em basquete. É responsabilidade sua (dele) mesmo e tenho certeza que Molina trabalhará arduamente para conseguir isso. Não existe um torneio profissional com seis times. Desculpem, mas não existe.

A LBF hoje é um produto ruim (tenho certeza que ele sabe disso), que precisa de mais equipes, uma melhor roupagem (divulgação, marketing, tudo mais…) e sobretudo mais qualidade técnica. É óbvio que da massificação (mencionada acima) sai a qualidade, mas a Liga Feminina precisa fazer um campeonato com mais times, melhores atletas e mais atrativos urgentemente.

4) O PRECONCEITO CONTRA O BASQUETE FEMININO -> Outro tema já abordado por aqui anos atrás, quando Érika foi jogar uma final de WNBA. O fato é: ninguém liga pro basquete feminino no Brasil. Ninguém é ninguém mesmo. Tipo o país inteiro menos umas 300 pessoas. Por isso não admito muito quando as campanhas ruins em Mundiais e Olimpíadas chegam (e têm chegado com constância, obviamente) e ouço / leio o seguinte: "Caraca, essas mina são horríveis. Como alguém assiste isso?".

Com todo respeito (aqui entra um pouco do lado emocional), que hipocrisia é essa? Quantos jogos a galera vê do feminino por ano? Quantos % das notícias consumidas são do feminino por ano? O quanto a galera de fato se importa com o feminino? Por que julgar e dizer um "essas mina são horríveis" ao invés de tentar entender o contexto todo? Caraca, isso é feio.

Desculpem, mas isso me cansa um pouco. É desnecessário, mas vou dizer: se tem uma galera que ganhou muito há pouco tempo atrás é essa aí da foto acima. Um título mundial (1994), duas medalhas olímpicas (1996 e 2000) e posições bem honrosas em outros mundiais (quatro em 1998 e 2006) e olimpíadas (quatro em 2004). Não foi há 50, 60, 70 anos. Foi há duas décadas que as mulheres brilharam. Mesmo período em que os rapazes que aparecem na imprensa a cada cinco segundos definharam em resultados internacionais. Definharam.

Sou crítico em tudo na minha vida, admito claramente as críticas que os resultados carregam consigo, mas, sim, sim, sim, precisamos de uma análise mais profunda de um cenário bem feio pelo qual passa o basquete feminino antes de termos veredictos tão claros (e rasos) assim. Não dá pra fazer "análise" acompanhando 5 jogos a cada quatro anos, desligar a televisão no dia seguinte do final da Olimpíada e achar que a pessoa que profere alucinações assim segue o esporte. Não, não segue. Não compro análises de especialistas em generalidades.

Então, sério, que bobagem é essa de tratar com tanto desdém algo que deu tanto resultado, fez tanto sucesso, foi tão lindo até bem pouco tempo atrás? Desculpem o termo, mas é ridículo. Hoje o esporte por aqui é mal jogado, mal cuidado, mal arrumado, tudo isso aí que sabemos. Sim, é fato.

Mas um pouco mais de respeito não faz mal, né? Que cobremos quem a gente tem que cobrar (CBB, LBF, Clubes, Federações, as próprias atletas por serem MUITO passivas e pouco unidas), mas o nível do futebol interno é horrendo de feio e o espaço não caiu. O nível do basquete masculino interno não melhorou muito de 20 anos pra cá e o esporte tem crescido. Como, então, o basquete feminino brasileiro passou a ser tão ignorado assim? Pra mim é um mistério. Era só uma questão de ocasião / resultados? É sério isso?

Ah, e quer saber como elas foram mega valorizadas depois do maior título da geração? Na capa do jornal do dia seguinte à conquista do Mundial da Austrália, uma manchete, uma foto, mas o texto do lado era… sobre futebol.

5) O QUE FAZER? -> Há cerca de cinco anos fiz um Raio-X do basquete feminino. Se quiserem ler está aqui. Muito pouca coisa mudou. Os clubes estão quebrando, as meninas estão cada vez mais desamparadas, o preconceito contra o basquete feminino continua aí e agora temos um novo presidente da CBB que prometeu ligar mais para o tema.

Já passou da hora de um trabalho de choque em todas as esferas envolvidas. Se não houver nada de muito novo em um, dois anos, a modalidade estará FALIDA por aqui. Simples assim. Duro, mas real. Triste, mas totalmente possível. Torço pra dar certo, mas é difícil (impossível?) ver uma luz no final deste túnel. O duro é que as mesmas pessoas que proferem "análises" olímpicas a quatro anos vão falar 30 segundos (ou traçar duas linhas) sobre o tema e seguir adiante. Quem gosta, gosta mesmo, tem sentido os golpes na alma, no coração e no dia a dia há um bom tempo já.

Segue a pergunta: quem vai salvar o basquete feminino?

Sobre o blog

Por aqui você verá a análise crítica sobre tudo o que acontece no basquete mundial (NBB, NBA, seleções, Euroliga e feminino), entrevistas, vídeos, bate-papo e muito mais.