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Bala na Cesta

A história do jogador que pagou R$ 500 para fazer teste na NBA e hoje é peça fundamental no Spurs

Fábio Balassiano

13/05/2017 09h44

Na última quinta-feira o San Antonio Spurs passou pelo Houston Rockets para se classificar a mais uma final de conferência Oeste da NBA (enfrentará o Golden State Warriors a partir de amanhã) sem Tony Parker e Kawhi Leonard, dois de seus principais jogadores. Contra James Harden, um dos melhores pontuadores da liga, a solução do técnico Gregg Popovich foi colocar para marcá-lo alguém que está na NBA há apenas duas temporadas apesar de ter 27 anos e que pagou US$ 150 (R$ 500) para fazer testes na liga quatro anos atrás. O nome dele é Jonathon Simmons, e Harden teve míseros 1/5 nos arremessos e 6 desperdícios de bola quando marcados por ele. Simmons ainda terminou com 18 pontos e escreveu mais um capítulo de sua incrível história de vida.

Nascido e criado em Houston, Simmons teve carreira muito boa no segundo grau, mas ele começou a se enrolar quando passou por três Universidades, algo incomum nos EUA. No terceiro ano (dos quatro possíveis) teve 14,7 pontos e 5 rebotes por jogo. Com quatro bocas para alimentar, pensou em como ganhar dinheiro aos 22 anos para sustentar suas quatro filhas. Colocou seu nome no Draft da NBA de 2012, mas nenhuma equipe o selecionou. Pior que isso: nenhuma equipe sequer o convidou para jogar nas Ligas de Verão, processo, por exemplo, que aconteceu com o brasileiro Cristiano Felício, que anos atrás jogou uma dessas pelo Chicago, chamou a atenção da franquia e assinou contrato com o Bulls logo em seguida.

Desesperado, com nenhum dinheiro no bolso e sem a chance de voltar para a faculdade (pelas regras locais isso não é permitido – colocou o nome no Draft "já era"), Simmons ouviu de LaTonya, sua mãe, o conselho mais duro de sua vida: "Filho, largue o basquete. Isso não te levará a nada. Siga o seu hobby, seja barbeiro que assim você conseguirá criar as suas filhas". Jonathon preferiu não ouvir. Jogou na American League, um campeonato de nível bem menor nos Estados Unidos. O objetivo era chamar atenção, mas não aconteceu como ele esperava.

"Jogando na American League eu quase desisti várias vezes. Aquilo não era basquete de verdade. Tinha média de 35 pontos, mas aquilo não era o que eu tinha sonhado e aprendido. Em vários momentos me peguei sofrendo e sem saber o que fazer, mas quase todas as vezes eu terminava o dia otimista e pensando em como poderia realizar meu sonho de chegar à NBA", disse o ala à ESPN americana.

Simmons, então, preferiu jogar a sua última cartada. Soube que em 2013 a D-League, Liga de Desenvolvimento da NBA, faria um teste coletivo para atletas chamarem atenção das franquias. Alguns jogadores foram selecionados para a "peneira", mas para estar entre os 60 que treinariam ele teve que desembolsar US$ 150. Era o dinheiro das fraldas de sua filha mais nova e a alimentação das mais velhas. Ele preferiu tentar, arriscar. Concentrado, focado, obstinado, ele foi aprovado pelo Austin Spurs, afiliado do San Antonio Spurs, time para o qual ele treinou no ano anterior e que não fez a menor menção de contratá-lo.

No primeiro ano na D-League foram 10 pontos de média e o começo do gostinho do "basquete de verdade" que ele tanto queria. No segundo, 15 pontos por jogo e o convite do Brooklyn Nets para jogar a Liga de Verão de 2015. Temendo perder um diamante bruto o San Antonio Spurs decidiu agir. RC Buford, manda-chuva da franquia, conversou com Gregg Popovich, o técnico, e ambos travaram um possível futuro contrato de Simmons com o Nets. Quando ele estava indo para o ginásio em Orlando seu empresário ligou e disse: "Jon, saia deste ônibus e não entre mais na quadra pelo Brooklyn. Você é um jogador de NBA agora. O San Antonio lhe ofereceu um contrato".

Incrédulo, Simmons fez o que seu agente pediu, comunicou ao Nets, pegou suas coisas e foi chorar no quarto do hotel. No dia seguinte um avião o esperava para que ele fosse treinar e jogar a Liga de Verão de Las Vegas pelo San Antonio Spurs. Foi campeão, MVP e chamou a atenção da comissão técnica. O diamante bruto precisava ser lapidado por Popovich e sua incrível comissão técnica. Entre idas e vindas na D-League, onde seguia com o Austin Spurs, recebia chances com o time principal na NBA. Em 2015/2016 foram 55 partidas, 14,8 minutos e 6 pontos por jogo. Nesta temporada, 78 partidas, 16,8 minutos e 6,2 pontos. Nas duas mostrou evolução (comportamental, técnica, defensiva, tática etc.) e passou a ser peça fundamental principalmente por possuir uma parte física capaz de dar ao veterano time do Texas uma opção diferente nas marcações aos rivais.

"Em todos os pontos da trajetória de Jonathon ele poderia ter desistido, fraquejado, mas ele seguiu acreditando em si mesmo. De vez em quando o encaramos como um neófito, alguém que esteja começando na profissão, porque é assim mesmo que o enxergamos aqui dentro deste programa. Sua força de vontade é imensa, seu comprometimento em seguir melhorando é incrível e estamos orgulhosos com o seu desenvolvimento aqui", afirmou Gregg Popovich antes do começo da pós-temporada deste ano.

E aí surgiu chance de ser titular de um jogo 6 de playoff quando Kawhi Leonard se machucou. A missão era parar James Harden e Jonathon Simmons conseguiu. Depois de ter pago US$ 150 para treinar na D-League em 2013, Simmons já acumula mais de US$ 1,3 milhões (mais de R$ 4 mi) em salários com o San Antonio Spurs desde 2015/2016. Ao final dessa temporada ele será agente-livre, poderá ganhar novo e polpudo contrato e acrescentar novo capítulo a sua história de perseverança e luta.

LaTonya, sua mãe, deve ser orgulhar de seu Jonathon. As quatro filhas agora não passam fome, podem usar fraldas à vontade e Simmons tem tranquilidade para se concentrar no desafio que começa amanhã contra o Golden State Warriors. Destemido, estudioso e sabendo o que vem pela frente, ele não compareceu a entrevista coletiva depois da vitória contra o Houston Rockets por um motivo singelo. Ainda com a roupa do jogo, estava com gelo nos tornozelos, fone no ouvido e um iPad nas mãos no vestiário estudando os movimentos de Kevin Durant e Klay Thompson, rivais que ele irá enfrentar a partir deste domingo.

Aos 27 anos, Simmons não tem tempo nenhum a perder.

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