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Bala na Cesta

Fala, Leitor: O domingo, por Antônio Misquey

Fábio Balassiano

13/04/2017 14h00

Por Antônio Misquey

Um típico domingo à noite. Aquele tédio e angústia de ter que aguentar a tal segunda-feira no dia seguinte. Mas sempre há aqueles dias excepcionais. Sempre não, às vezes. Bem às vezes. Aqueles que você chega e fala: "Lembra?". E são esses que você lembrará. São raros, em extinção, mas eles aparecem.

Nove de abril de 2017. Bem-vindo a "mais um" domingo. Aquele que passa Faustão, futebol e você fica aprisionado ao "nada pra fazer". Nada mesmo, além do básico: comer, respirar, dormir. Contudo, um simples dia pode virar uma página para ler e grifar todas as linhas da sua vida. E ele virou. Mas vamos ao que interessa. 18:00, horário de Brasília. Depois de horas de "que saco", a hora pela qual você esperou por todas as outras horas do dia. Um momento que poderia valer muito para uma pessoa que você nunca conheceu, mas que possui um fascínio por ser quem é. Vive a quilômetros e quilômetros de distância, mas foi uma admiração repentina que surgiu em você que não conseguiu mais abandonar.

Russell Westbrook. Quem? Ele mesmo, Russ para os mais íntimos. A pessoa pública. Digo "a" porque ele é um cara de características próprias, que apenas ele tem. Único. Uma vontade inigualável que faz ele conseguir o que quer. Uma vontade que inspira. E te inspirou o suficiente pra você querer que todo o bem que ele te fez naquelas noites de basquete fosse o bem que ele sentiria naquele 9 de abril. Uma recompensa do bem, que ele merecia. Gentileza gera gentileza.

Até agora não te expliquei quem é esse homem. Não expliquei porque ele é inexplicável. O que posso te falar é o que ele estava prestes a realizar. É algo que quero compartilhar com todas e todos. Russ estava a um passo de quebrar uma marca história de mais triplos-duplos em uma temporada da melhor liga de basquetebol desse planeta, a NBA. E o que isso vai mudar na sua vida? Depende do jeito que você lidar com a importância do que está acontecendo. A forma que eu lido é de que ele estava entrando não só do basquete, mas da humanidade. Exagero? Talvez. Mas exagerado do jeito que ele merece.

Era um jogo sem nenhuma pretenção além dessa. Ambos os times cumpriam os compromissos que estavam pré-datados. O que não era esperado era o inesperado, obviamente. Poderia ser um inesperado normal, como qualquer outro. Mas não foi. Os minutos passavam, os nervos pulsavam. Tudo indicava que aquele momento chegaria. Você estava mais ansioso do que aniversariante querendo ver os presentes. Entretanto, o presente estava na sua frente, sem você saber. Esperando para ser aberto. Aquele que chegaria de surpresa, o que você mais queria.

Segundos te distanciavam do seu desejo. E, ao seu ver, ainda era muito longe. Aquela narração do que seus olhos viam em outra língua te fazia narrar o momento na sua cabeça. O seu momento. O momento dele. A empolgação era tanta que você nem percebe que o grande momento chegara: o histórico triple-double. O 42. A glória de Russell. Aos poucos você percebia o que presenciava, se aconchegando aos poucos naquele instante. Ainda haviam resquícios daquele domingo chato e entediante. Nada melhor do que exterminá-los da melhor forma: com uma pitada à mais de história. Lá ia ele melhorar o seu domingo. O nosso domingo. Com aquela alucinante vontade e garra, aos poucos ele mostrava sua diferença dos demais. Diferenças pontuais que o tornavam o melhor jogador da atualidade. Provas? Sente-se aqui e assista. A história sendo feita.

Westbrook quebrava marcas num ritmo de "treino". Até porque cada jogo o treinava para ser melhor no seguinte. E, quase sempre, os resultados apareciam. Sozinho, carregou as cores que vestia atrás do próximo objetivo: a vitória. Mesmo que a vitória pessoal ele já atingira, era aquela famosa hora de querer mais. Não sei se comentei, mas para ele querer é poder. Ele podia querer mais.

É batalhando que se consegue. Ele batalhou, lutou até o fim. Porém, o costume de ser épico o rondava ao ponto de ser natural. E foi. Russell Westbrook III, como consta na sua certidão de nascimento (sim, ele é humano), deixou sua assinatura nos segundos finais: o tiro do triunfo. Ou melhor, o arremesso da redenção. Algo inacreditável. Algo impressionante. Algo que poucos conseguirão descrever. Em inglês, "ele conseguiu". Foram as únicas palavras daquele narrador por longos segundos de mais glória para ele. Um ser iluminado, que veio pra liderar e mostrar que sabe fazer isso. E como sabe. A vitória veio sem muito esforço, com a naturalidade de Russ. Certamente nem tudo que ele faz é natural, mas é natural o jeito que ele consegue. É divino.

O lance que citei no parágrafo anterior foi o lance que me motivou a escrever essas longas linhas. Não via mais jeito de retribuir aquele bem. Mostrar o que sinto é o que deveria fazer. Estou fazendo, e não me canso de escrever. Escrevo na mesma medida que te considero. Isso tudo aqui é pouco para o que você faz, cara. Eu queria servir pra amarrar seu tênis, servir pra ser um cara importante como você é. E é o seu exemplo que me mantém. Me mantém focado a ser quem à cada dia descubro que sou, do mesmo jeito que descobri à cada dia quem você é. Só tenho a agradecer. Obrigado.

Domingo terminou. De uma forma diferente, inesperada. Segunda amanheceu, vamos à luta. Na 1ª conversa com aquele amigo que passou o mesmo que você, o assunto não é diferente: "Você viu, cara?". Nem perguntei do que estava falando, porque não havia outra coisa para falar. Era isso, era fácil de deduzir e lembrar que você assistiu aquilo do que seu amigo nem começou a falar. E a conversa continua. E você, do mesmo jeito que ele, Russell, fazia, trouxe de dentro. Trouxe o que você passou naqueles instantes. Jogou pra fora o que estava guardado. Em palavras, como faço agora: "Foi como ter viajado para um lugar inesquecível, e ter vivido uma experiência única na vida por breves momentos. Eu estava vendo, ao vivo. Eu me senti parte daquilo, daquele lugar, daquele momento. Saboreei uma droga que não poderei viciar porque é caríssima e rara. Porque cara, aquilo foi inexplicável. Uma sensação de alegria, com surpresa, com tudo. Algo que você nunca viveu antes e não poderá viver por longo tempo. Sim, eu viajei. Viajei pelo êxtase de presenciar algo que nunca sonhei, mas que é um sonho. Aprendi a esperar o inesperado. Eu vi, com os meus olhos, a história sendo feita".

Ele te abraça. O seu amigo. O cara que você tirou as palavras da boca. Não só deles, e sim de todos que assistiram aquilo. Aquilo cara, aquilo foi incrível. Foi mágico. Foi Westbrook. Sentirei saudades, domingo. Foi bom ter vivido você. Mais uma vez, obrigado.

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