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Bala na Cesta

No resultado dos semifinalistas do basquete, a ampla reflexão que o Brasil deve fazer

Fábio Balassiano

22/08/2016 06h05

eua11Como vocês sabem, terminou ontem a Olimpíada do Rio de Janeiro com dois ouros para os Estados Unidos no Basquete. Mas algo me chamou a atenção além da conquista norte-americana no país.

Não sei se repararam, mas além do pódio ter sido idêntico (com a diferença que entre as mulheres a Espanha foi prata e a Sérvia, bronze, e nos rapazes os sérvios ficaram com a prata e os espanhóis com o bronze), os demais semifinalistas (França e Austrália) possuem, justamente com os Estados Unidos, algo em comum: um programa de basquete fortíssimo nos dois lados (masculino e feminino).

eua9Creio que dos Estados Unidos precisamos falar pouco, né? É um país excepcional esportivamente falando e que pra mim conjuga o que seria o ideal para todos – esporte e educação. Planta desde a base da pirâmide (escolas) e vai colhendo em todas as etapas do processo (faculdades, times, seleções, tudo mais). Possui uma liga fortíssima (a NBA), outra em formação (a WNBA) e um circuito universitário de dar inveja a todo mundo. Sua posição de liderança no quadro de medalhas desde sempre (e provavelmente para sempre) não surpreende de maneira alguma.

eua3Da Espanha vale relembrar como tudo começou a mudar para os ibéricos. Na Olimpíada de 1984 os espanhóis chegaram à final meio que por acaso. Não eram os favoritos, mas foram avançando. Quando perderam a decisão para Michael Jordan e pro técnico Bob Knight, a Federação Espanhola (FEB) começou a popularizar o esporte. Mais de trinta anos depois o que temos? A segunda melhor liga masculina de basquete nacional do planeta, inúmeros jogadores espanhóis na NBA (Pau Gasol é o melhor e mais conhecido deles), três pódios consecutivos entre os rapazes, um sólido trabalho de formação de jogadores e técnicos, e resultados consideráveis da base ao adulto. Entre as mulheres a situação começou a melhorar no começo de século. Com uma Liga Espanhola bem razoável (duas divisões – a primeira com 14 clubes e a segunda com 28), foi a vez, em 2016, de conquistar uma medalha olímpica pela primeira vez. A geração de Alba Torrens, Marta Xargay e Astou Ndour ainda terá muita coisa pela frente e ficar no topo aparentemente é o que veremos por muito tempo.

serbia1A Sérvia é considerada um dos países mais tradicionais do planeta. Não possui ligas fortíssimas, mas forma atletas e técnicos (o da masculina, o agitado Sasha Djordjevic, acabou de assinar com o Bayern de Munique, que passará a investir pesadamente a partir de agora) constantemente e acaba sendo um país exportador de talentos também por não ter uma economia tão pulsante. Se no masculino os sérvios sempre se colocaram entre os melhores, de dois, três anos pra cá a equipe das mulheres encontrou o equilíbrio entre jogar rápido e com inteligência. Venceram o europeu 2015 e retornam a Europa com a medalha de bronze olímpica na bagagem. Um feito e tanto para um país de (atenção) pouco mais de 7 milhões de habitantes, quase 30x menos que o Brasil.

france1A França volta pra casa sem medalha, mas nada que tire o mérito do trabalho da Federação local. O time feminino ficou com a prata em 2012, deu muito trabalho aos EUA na semifinal do Rio-2016, por pouco não ganhou o bronze da Sérvia e tem ótimas jogadoras jovens para conduzir a seleção no futuro. Destaco a ala Marine Johannes (21 anos – na foto) e a armadora Olivia Époupa (22). No masculino, mais uma vez o talentoso time de Vincent Collet ficou pelo caminho, mas a quase dezena de atletas na NBA e outro punhado em times fortes das principais ligas da Europa provam que a Federação tem feito muito bem o seu papel. São três divisões com 12 clubes por lá, inúmeros centros formativos e títulos e mais títulos sendo ganhos da base ao adulto na Europa. A França estima, em seu site, que mais de 70% da população entre 12 e 18 anos teve ou terá contato com o basquete em algum momento da vida – seja jogando, torcendo ou interagindo com os atletas. É muita coisa e impacta positiva e decisivamente no futuro da modalidade.

cambageA Austrália, por sua vez, ficou no quase no masculino ao perder para a Sérvia na semifinal atuando de maneira irreconhecível e para a Espanha no jogo do bronze em uma decisão polêmica da arbitragem. No masculino creio que a frustração exista por não conseguir a medalha inédita tão sonhada, mas o país deve lamentar mesmo o resultado das meninas, que fizeram uma primeira fase brilhante (5-0) antes de cair para a Sérvia nas quartas-de-final em um jogo de difícil compreensão (foi mal jogado por parte das australianas). De todo modo, quem conhece o trabalho do Instituto Australiano de Esporte (o AIS) sabe que dias melhores virão. Mais e mais atletas serão desenvolvidos, os clubes serão abastecidos com novas fornadas destes jovens jogadores e cada vez mais desembarcarão em NBA e Europa "produtos" australianos de muito talento. Por lá são duas divisões com 16 clubes tanto no masculino quanto no feminino. A média de público da Liga Nacional dos rapazes foi de 4 mil pessoas/jogo. Na Feminina, fortíssima, 3,4 mil/jogo, número excelente para o basquete feminino.

NENE2Será que o Brasil, através da Confederação Brasileira e de suas Ligas Nacionais (NBB e LBF), não tem mesmo nada a aprender com os cinco países semifinalistas do Rio-2016? São todos (EUA, Espanha, Sérvia, França e Austrália) muito diferentes em suas estruturas, mas que carregam ensinamentos importantes para quem deseja crescer no basquete.

Como está muito claro, não adianta focar tudo em um lado só, tal qual o Brasil fez com os rapazes nos últimos 20 anos. O fundamental para se conseguir resultados no esporte mais competitivo do planeta (com exceção do futebol) é mesmo ter uma massificação forte e constante na modalidade toda (e não de um time). O programa de basquete no país precisa ser planejado, estruturado, organizado, dele resultando campeonatos fortes, equipes com identidade (interna e perante o público), técnicos capacitados, atletas bem formados, público fidelizado e tudo mais. Quem sabe um dia a gente chega lá…

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