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Bala na Cesta

Sem medo, Barbosa ignora passado ruim da seleção feminina e mira pódio

Fábio Balassiano

01/04/2016 05h00

Antonio Carlos Barbosa está otimista. Está otimista que, aos 70 anos, conseguirá colocar o basquete feminino nos trilhos nesta nova passagem no comando técnico da seleção brasileira feminina adulta nas Olimpíadas do Rio de Janeiro. O blog conversou com ele sobre todos os aspectos dos Jogos de 2016, seu passado, sua chegada, o Evento-Teste que serviu muito pouco pra ele e como a equipe nacional tentará voltar a disputar uma competição como protagonista. O papo com Barbosa foi de uma sinceridade incrível, fluiu bastante e será dividido em duas partes. A segunda será divulgada amanhã.

barbosa1BALA NA CESTA: Os grupos olímpicos foram sorteados há duas semanas. O que você achou da chave do Brasil? Ainda faltam três seleções, mas já dá pra começar a pensar nos adversários, não?
ANTONIO CARLOS BARBOSA BARBOSA: Eu penso assim: em Olimpíada você não tem muita opção, escolha. Fugir dos Estados Unidos na primeira fase, como aconteceu conosco agora, pode significar, em caso de uma primeira fase ruim, encontrar com as americanas logo nas quartas-de-final. E isso é algo que ninguém quer, né? Isso pra mim não me passa pela cabeça. No nosso grupo ainda virão três times que serão sorteados. Podem cair Espanha ou França conosco. É um grupo bom com Japão e Austrália. A Austrália é um time com algumas jogadoras veteranas (Nota do Editor: a experiente Lauren Jackson anunciou ontem a sua aposentadoria). Nosso foco tem que ser estarmos preparados da melhor maneira possível, isso sim. Continuo confiante.

barbosa5BNC: Queria retornar um pouco, antes de começar a falar do seu time para a Olimpíada. Você esperava voltar a ser técnico da seleção brasileira feminina de basquete, cargo que exerceu até o Pan-Americano de 2007?
BARBOSA: Não, sendo bem sincero para você eu não esperava. Eu imaginava que poderiam me chamar para uma ajuda a seleção como Coordenador, Supervisor, algo que eu poderia colaborar. Aqui no Brasil comete-se um equívoco muito grande de pegar a experiência que o técnico adquire ao longo da sua vida e jogar no lixo. Tudo aquilo que o treinador aprendeu durante a sua carreira fica com ele. Mas de repente, principalmente quando acirrou aquela briga entre os clubes e a Confederação, eu imaginei, sim, que poderia voltar a ser lembrado para o cargo de técnico.

barbosa1BNC: Foi quando o Vanderlei, no meio daquela confusão toda entre clubes e CBB, te telefonou, certo?
BARBOSA: Quando o Vanderlei me ligou, eu estava em Bauru e ele me disse: "Eu preciso de você". Não entendi exatamente em que função, e respondi a ele: "OK, mas de mim exatamente em que posição?". No que ele disse: "De técnico". Acabei topando um dia depois, mas pedi alguns minutos para pensar e te explico o motivo. Não preciso provar mais nada pra ninguém, mas você tem que mensurar o que uma nova experiência pode te causar de dissabor. Estou numa idade que não quero mais aborrecimento. Aborrecimento, neste caso, é ouvir críticas de anônimos colocando bobagens a seu respeito, por exemplo. Não tenho mais saco pra isso. Só que acabei pesando tudo aquilo que eu já passei pelo basquete e pensei: "Preciso encarar essa". Já passei por tantas, e uma a mais ou uma a menos não faria tanta diferença no meu histórico. Acompanhei todos os jogos da seleção brasileira feminina desde que saí do cargo em 2008 e não acho, sinceramente, que o basquete feminino brasileiro seja uma causa perdida.

barbosa4BNC: Você falou sobre a questão do dissabor. Não preciso falar do seu currículo, mas no barato do barato você tem uma medalha de bronze na Olimpíada de 2000, na Austrália, e isso já é coisa pra cacete. Você está preparado para o caso do Brasil não ir bem na Olimpíada de 2016, algo que é extremamente possível?
BARBOSA: Vou dizer uma coisa pra você com toda sinceridade do mundo. Eu sou do interior. Sou de Bauru, vivo em Bauru e não creio que sairei daqui. E o cara do interior não pincela, não enrola muito, vai direto ao ponto. Duro pra mim foi assumir a seleção no lugar do Miguel Ângelo da Luz em 1996. Ali foi difícil, porque estava no topo, no auge. Ali foi fogo. Nós fomos quarto colocados no Mundial de 1998 na Alemanha, perdendo por cinco pontos sem Hortência e Marta e as pessoas ficaram insatisfeitas – no que estavam certas porque tinham se acostumado com medalhas recentes. Agora, hoje em dia, como diz o Tiririca, pior do que está não fica, não. Então eu não posso ter dissabor. Se melhorei, ótimo. Se não for bem, só não consegui tirar do lugar em que se encontra. Então minha responsabilidade é relativa. Se quisesse me esconder atrás do meu passado eu não assumiria. O que nunca tive em minha vida foi medo de correr atrás de resultados. Estou voltando a seleção para tentar levar essas meninas ao pódio olímpico. Simples.

trio1BNC: Bacana também a frase e você dizer que não acha o feminino uma causa perdida. Mas aí te faço uma pergunta: o basquete feminino não é uma causa perdida, a seleção não é uma causa perdida ou os dois não são uma causa perdida?
BARBOSA: Olha, eu vou contar uma história. Com a idade que eu cheguei, você armazena muita experiência e tem muita coisa pra passar a jovens como você. Quando o Brasil foi campeão do mundo em 1994, o campeonato paulista tinha cinco equipes. A CBB fazia uma Taça, na época, que era a Taça Brasil. Vou utilizar o termo "catação", que era o que a Confederação fazia na equipe para agregar times femininos ao torneio. Juntava-se o que era possível nos Estados para se fazer a competição. E fomos campeões do mundo. No ano seguinte o campeonato paulista teve 10 equipes. O primeiro nacional feminino, em 1998, tinham oito equipes, mas a Confederação bancava quase tudo. Os resultados positivos da seleção é que proporcionaram o crescimento da modalidade. É tudo muito cíclico e instável, não há dúvida disso.

trio1BNC: Mas não te deixa assustado o atual momento da modalidade? Antes tinham Paula, Hortência e Janeth, né? Por pior que fosse a estrutura as craques salvavam…
BARBOSA: Preocupa muito, mas não me assusta, sinceramente falando a você. Seria leviano dizer que a situação é confortável. Estou vendo, é verdade, que de uns tempos pra cá o feminino está muito dependente do poder público. Poder público é prefeitura, que ajuda a manter a maioria dos times. No masculino alguns times já conseguiram se libertar disso. Essa dependência de prefeitura me preocupa no feminino. A prefeitura vai tirando o pé e a equipe acaba sofrendo as consequências. Aconteceu lá em Americana, em Santo André, São Caetano, São Bernardo, um monte de cidade. Agora, em termos de seleção, eu não vejo esse cenário de terra arrasada, não. Ao contrário de alguns colegas meus, que quando estava na seleção pegavam o microfone para tacar pedra em mim, nunca fiz isso quando os outros estavam lá. Eu não posso te dizer o que os outros fizeram ou deixaram de fazer, mas te falo o seguinte: não éramos para ficar onde acabamos ficando em Mundiais e Olimpíadas. Não mesmo. Este não é o nosso lugar no cenário do basquete feminino.

barbosa6BNC: Desde 2006 é nono pra baixo, você sabe disso, né?
BARBOSA: Sim. Eu saí em 2007 no Pan-Americano do Rio de Janeiro e depois não aconteceu mais nada. O que acho que atrapalhou muito foi uma falta imensa de sequência de trabalho. Um ano era um técnico, no outro era outro. Nenhum treinador conseguiu dar uma cara. Porque por mais que seja uma cara feia, quando você fica por algum tempo em um time você acaba moldando a equipe de alguma maneira. E ninguém conseguiu isso. Então eu acho assim: nós temos sete jogadoras que ou estão ou que já passaram pela WNBA. E a WNBA, você sabe, Bala, é a nata total do esporte, um círculo mais fechado até do que a NBA. Então não é possível que em um elenco de 12 atletas, com sete deste nível a gente fique tão lá embaixo.

CONTINUA AMANHÃ

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