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Bala na Cesta

Com números, análise sobre a fase final da LDB

Fábio Balassiano

06/01/2014 03h49

Flamengo1Como vocês sabem, na última semana do ano passado aconteceu aqui no Rio de Janeiro a fase final da Liga de Desenvolvimento de Basquete reunindo as oito melhores equipes Sub-22 do país (Flamengo campeão, com Minas como vice). Estive na Gávea em quase todos os dias, e o nível técnico não me agradou, não.

Como acontecem com os times de cima, que jogam o NBB, as equipes correm demais com a bola, têm leitura de jogo deficiente, pecam muito em fundamentos (gerando erros bobos), defendem muito pouco (intensidade baixíssima) e pontuam pouco, muito pouco. Isso poderia ser algo subjetivo, empírico, pensado da minha cabeça e contestável.

Mas aí eu fui, loucamente, fazer uma análise mais fria, com os 20 jogos da fase final disputada entre 26 e 30 de dezembro de 2013 (usando as estatísticas presentes no site da Liga Nacional – e tive que "confiar" nelas para seguir adiante). Vamos lá:

NumerosLDB1

Alguns dados chamam a atenção (as fotos são apenas ilustrativas, pois as estatísticas foram de TODOS, ok):

Minas11) Antes de entrar nos números em dia, há quatro fatores que merecem ser levados em consideração na análise: a) foram jogos em dias seguidos; b) havia muito nervosismo por se tratar de uma fase final; c) o calor no Rio de Janeiro estava um absurdo e acaba influenciando no rendimento dos atletas; e d) a quadra, em alguns jogos, esteve longe de suas condições ideais (os atletas escorregaram bastante).

2) A média de pontos por equipe (62,8) foi muito, muito baixa (os jogos, portanto, tiveram pontuação total de 125,8). Apenas três (Minas, Flamengo e Pinheiros) chegaram, em uma partida, a marca de 80 pontos, sendo que os rubro-negros só atingiram isso no duelo contra Bauru na prorrogação (fez 68 no tempo normal).

3) Os times jogaram para mais de 90 posses de bola por jogo (ao todo foram 91,2, com a média por jogo de 20,3 bolas de 3, 42,9 de dois, 19,1 desperdícios de bola e 9 lances-livres no ponderado). Ou seja: em média, 22,2% das posses terminaram em arremessos de três pontos, 47% de dois, 20,9% em erros e 9,9% em lances-livres, o que demonstra uma ausência de agressividade também. Para se pensar: a cada 5 posses de bola, uma terminava em desperdício (erro). Muita coisa, não?

4) A média de pontos por 40 minutos ficou em 1,55 ponto/minuto, com 0,68 ponto por posse de bola. Os dois índices estão longe de serem razoáveis.

bc15) Pior do que a média de pontos por equipe só mesmo a relação de pontos tentados (163,1 por partida) e convertidos (62,8), o que dá a conversão de 38,8%. E estou colocando aqui os lances-livres, que fazem subir bastante este índice. No adulto, o que se espera é algo em torno de 50, 55%.

6) Ao contrário dos jogos adultos, não houve o decantado vício por bolas de três pontos nas finais da LDB. Foram 20,3 arremessos longos tentados por time, com 42,9 de dois pontos de cada equipe por jogo. A relação é de mais de 2 pra 1, o que é bacana e merece ser notado.

7) Nem tudo, porém, são flores neste sentido. Os índices de acerto nos arremessos foram pavorosos. Nas bolas de três pontos, 4,7 acertos por 20,3 tentativas (23,3%). Nas bolas de dois pontos, 19 conversões para 42,9 tentativas (44,8%).

brasilia18) Sobre as bolas de três pontos, apenas três times conseguiram superar os 40% de aproveitamento nas bolas de fora em uma partida. Brasília (duas vezes, ambas com 5/12 ou 41,7%), Pinheiros (8/19 ou 42,1%) e Minas (9/16 ou 56,3%) tiveram ótimo índice de acerto. Há um dado interessante (e estarrecedor aqui): nas 20 partidas disputadas, 18 times tiveram índice de acerto pior que 20% (ou seja: em praticamente toda partida houve alguma agremiação amassando o aro com gosto). Apenas como exemplos: na segunda rodada, o Basquete Cearense chutou 1/15 (6,7%) de fora e 20/50 (40%) de dois pontos; no mesmo dia, Brasília teve 1/12 nos tiros longos (8,3%) e 23/47 (48,9%) em bolas de dois pontos. No geral, NENHUMA equipe superou os 27% de aproveitamento em bolas de fora (na média final).

9) Nada, porém, me chama mais a atenção do que os números de assistências (baixos) e erros (altos). Em média, cada time teve 10,8 assistências por jogo, com 19,1 desperdícios de bola atrelados. A relação assistência por arremesso convertido ficou em 0,45. A relação assistência/erro, em pavorosos 0,56.

10) Há um dado bem interessante aqui. Em apenas dois jogos um time conseguiu ter mais assistências do que erros. Os que atingiram tal feito foram o Ginástico na terceira rodada contra Brasília (13 passes, 8 erros, índice de 1,63) e São José na disputa do sétimo lugar contra Bauru (17 assistências, 16 erros, índice de 1,06).

reflexao1Conclusão: Acho que está bem claro que o nível técnico apresentado na fase final da LDB foi baixo, muito baixo. Não há uma única maneira de se jogar basquete no planeta (se mais travada, se mais acelerada ou um meio termo), mas para mim é muito óbvio que o basquete que se pratica no Brasil precisa ser repensado desde a sua formação, desde a base da pirâmide.

O que vi na LDB, com raríssimas exceções, foi um punhado de até certo ponto talentosos jovens de até 22 anos chegando ao último degrau das categorias de base sem os fundamentos razoavelmente formados, treinados, coordenados. De todo modo, como sempre gosto de frisar, a Liga chegou há pouco tempo, antes o cenário era bem pior, e ela, a Liga, veio para oferecer uma carga de jogos que atletas desta faixa de idade nunca tiveram – e esse é o primeiro passo para modificar o quadro ruim. O ideal, obviamente, é que tivéssemos LDB's Sub-15, Sub-17, Sub-19 e Sub-21, existindo, assim, uma escadinha saudável de desenvolvimento de jogadores no país. Como temos apenas a Sub-22, a competição acaba por expor todas as deficiências formativas que precisavam ser sanadas antes.

Está bem claro que o país precisa melhorar o trabalho de formação para que os atletas cheguem na faixa etária da LDB atual (Sub-22) apresentando um nível mais alto de fundamentos e também de leitura de jogo, possibilitando uma melhor execução dos sistemas táticos propostos pelos treinadores. Do jeito que estamos hoje não há, portanto, como falar de tática ou sistema de jogo porque os jogadores não conseguem executar suas funções devido a problemas formativos (de fundamentos) muito graves e que ainda não foram corrigidos.

reflexao2E os atletas, que se mataram em quadra em TODAS as partidas, são os menos culpados, é bom que se diga. Se eles não sabem o QUE, COMO e QUANDO fazer, é porque ainda não lhes foi ensinado, transmitido, passado, treinado (palavrinha mágica essa, hein – 'treinamento'). Só com treinamento apropriado desde as primeiras categorias formativas os atletas passam a saber O QUE, COMO e QUANDO fazer em uma quadra de basquete. É preciso abrir os olhos para essa necessidade, pois não falta talento e principalmente vontade para estes jovens evoluírem.

Este pode ser um texto duro, bem duro, mas acho importante que se faça uma grande análise/reflexão sobre o que foi visto na LDB. A Liga de Desenvolvimento nasceu há 3 anos e todo mundo sabe que o cenário do basquete brasileiro, principalmente na base, era de terra arrasada devido a anos de esquecimento por parte de quem deveria cuidar dela com mais carinhos (a CBB e as Federações). Longe de mim, portanto, apontá-la como culpada. Pelo contrário (e vocês sabem que é o campeonato que mais gosto de acompanhar). A competição certamente é uma das melhores notícias da modalidade nos últimos anos, tê-la é uma grande novidade e quanto mais esses jogadores atuarem mais eles vão evoluir. Mas é fundamental não fecharmos os olhos para o nível técnico apresentado, e o que isso representa para a formação de atletas no país (principalmente com as correções de rota que precisam ser feitas).

Quem precisar dos dados completos por partida é só clicar no link aqui ou aqui. Vale um grande debate, não?

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