Topo

Bala na Cesta

Érika explica saída da seleção e exalta seu momento: 'Melhor da minha vida'

Fábio Balassiano

18/09/2013 01h28

Como disse aqui ontem, a saída de Érika de Souza da seleção brasileira feminina que inicia a caminhada na Copa América do México a partir de sábado era esperada. Peça fundamental no Atlanta Dream nos playoffs da WNBA a partir de quinta-feira, a pivô de 31 anos, que está entre as melhores do mundo e teve as excelentes médias de 12,9 pontos, 9,9 rebotes, 1,3 assistência, 1,8 toco e 55,3%, não foi liberada pela equipe e conversou com o blog ontem à tarde sobre todos os acontecimentos que acabaram levando ao seu esperado pedido de dispensa (mais do que justificado).

BALA NA CESTA: Para não deixar qualquer dúvida, poderia esclarecer como foi este processo todo que envolveu a sua convocação e a oficialização do pedido de dispensa da seleção ontem à tarde? Você chegou a conversar com o Zanon neste tempo todo, não? Imagino como está seu coração neste dia…
ÉRIKA DE SOUZA: Falei com o Zanon, pelo o que eu me lembre umas 3 vezes. Ele sempre foi muito flexível com tudo, claro que sempre puxando para que eu fosse pra seleção, mas sabendo que seria muito difícil. Havia falado com ele dias atrás, mas ele esperou até o último minuto para ver se encontraríamos uma saída, o que infelizmente não aconteceu.

BNC: Para quem não sabe, em 2011 você deixou seu time no meio dos playoffs da WNBA e foi jogar o Pré-Olímpico de Neiva, na Colômbia. Por que desta vez não foi possível? Imagino que seu contrato ter sido renovado há pouco tempo e a ótima temporada que você tem feito influenciaram muito, não?
ÉRIKA: Neiva, não me esquecerei nunca desse lugar (risos). E não foi só isso. No ano passado conseguimos com que eu me apresentasse somente depois das Olimpíadas. Sempre dei total prioridade a seleção. Mas Neiva me fez ver que é muito ruim sair daqui dos Estados Unidos, que tem um nível de jogo particular, uma estratégia diferente, uma participação minha diferente dentro da equipe, para ir direto a seleção e jogar de imediato. Para quem está de fora talvez não fique muito claro, mas fiquei com muito medo de me machucar da última vez por todas essas diferenças dos dois campeonatos e de uma viagem longa, que nunca é fácil. Em Neiva tive além do voo uma viagem de carro de 6 horas. Sei que fui a MVP daquele campeonato, mas o desgaste foi incrível. Além disso quando isso acontece tenho que voltar correndo para jogar direto os playoffs. É uma loucura. Além desses fatores, o time do Atlanta teve muitas lesões nesse ano e a minha importância pesou mais ainda. Quero que minha participação com a seleção e com o Zanon seja por inteiro e não dessa forma.

BNC: Falando sobre a sua temporada na WNBA, neste campeonato você conseguiu ser convocada pro All-Star Game, atingir pela primeira vez na carreira média de dígitos-duplos (no último jogo perdeu 0,1 em rebote) e ser a segunda cestinha do time. Este é o melhor momento de sua carreira?
ÉRIKA: Sem duvida nenhuma que sim. E queira o não, estar entre as melhores dentro da WNBA é algo que pesa mais do que tudo. Eu nem imaginava que algum dia passaria por essa situação, e por isso fiquei mais feliz ainda quando me vi dentro do All-Star e sendo cotada entre as dez melhores na corrida para a MVP. Me sinto bem dentro e fora de quadra e o sistema de jogo do Fred (Williams, técnico) me dá oportunidades de jogar. Sei que estou no meu melhor momento.

BNC: Para que você chegasse a este nível, houve algum tipo de conversa do seu técnico Fred Williams com você antes da temporada ou quando a Sancho Lyttle acabou se machucando? Você parece não ter sentido o peso de jogar praticamente por duas e está muito mais agressiva no ataque.
ÉRIKA: O Fred é um técnico muito aberto e me deu liberdade de sempre falar o que penso. Nos primeiros jogos a bola não chegava muito na minha mão, e conversamos muito claramente que eu precisava ser mais atuante na equipe senão seríamos mais uma equipe no campeonato. Não porque faço 50 pontos por jogo, mas porque consigo desequilibrar a marcação adversária para deixar minhas companheiras em melhor situação ou fazer o que tenho que fazer. Esse foi o grande momento do time no ano e a equipe respondeu à altura. A saída da Sancho não me influenciou. Não coloco esse tipo de peso nas costas. Sempre tento o meu melhor e já me sinto bem com isso.

BNC: Desde que você chegou ao Atlanta foram duas finais e nenhuma vitória na decisão (dois 3-0 contra Seattle e Minnesota). Chegou a hora de voltar à final da WNBA e tentar algo maior? A Angel está cotada pra ser a MVP e você certamente estará em um dos quintetos ideais da liga.
ÉRIKA: Se lembrarmos que Atlanta teve a pior campanha de toda a historia no esporte americano em seu primeiro ano (4-30 em 2008), ter conseguido nos anos seguintes estar sempre nos playoffs e fazer final já seria algo que nos deixaria muito felizes. Pensando agora, talvez este possa ter sido este o fator decisivo para ter acontecido o que você citou. Mas esse ano o sonho é maior, é ser campeã. Aqui tudo é muito nivelado, mas ainda vejo Minnesota como sendo um time acima dos demais. De todo modo, ganhamos delas esse ano pela primeira vez na história do time. Logo, não existe ninguém imbatível.

BNC: Há cerca de dois anos eu escrevo no blog que você está entre as 3 melhores pivôs do mundo. Talvez seja difícil você mesma falar a respeito, mas jogando na melhor liga do mundo você enfrenta Tina Charles, Sylvia Fowles, Brittney Griner e Lauren Jackson (agora machucada). Em que patamar você se coloca entre as pivôs do planeta?
ÉRIKA: Cada pessoa tem a sua história, os seus problemas e as suas oportunidades. Ninguém sabe o que eu passei nesses anos, o quanto lutei e treinei. Essas jogadoras que você citou são, na minha opinião, pessoas que admiro mas que não têm nada a mais do que eu. Temos estilos de jogo diferentes, umas com mais força, outras com mais experiência, outras que enterram, mas no conjunto sei que estamos parelhas, somos iguais. Não sou pior nem melhor do que elas. Nesse nível técnico, o momento, os detalhes acabam fazendo a diferença.

BNC: Antes da temporada muito se comentou sobre as três meninas que vieram do Draft – Elena Delle Donne, Brittney Griner e Skylar Diggins. Destas, você enfrentou todas e provavelmente medirá forças com a Delle Donne na final do Leste caso o Atlanta e o Chicago avancem. O que pode nos dizer sobre elas? O impacto delas fora de quadra teve um aumento de popularidade do basquete por aí?
ÉRIKA: E incrível o que a WNBA criou com o marketing em cima dessas jogadoras. É uma aula de como promover uma jogadora e rejuvenescer uma liga que perde jogadoras como Tina Thompson e Katie Smith, como acontecerá este ano. Eles pegaram o melhor dessas 3 meninas e venderam como o trio fantástico. Muito bom pra eles. Dentro de quadra eu destaco a Elena Delle Done. Essa sim é uma jogadora completa e incrível. Não a conhecia antes e quando joguei contra fiquei impressionada com a facilidade que ela joga. Caso façamos a final será um dos nossos problemas sem dúvida alguma.

BNC: Por fim, uma pergunta delicada: já passou pela sua cabeça que, aos 31 anos, você é uma das melhores jogadoras do mundo justamente em um momento em que o basquete brasileiro não está tão bem? Como isso fica na sua cabeça de atleta?
ÉRIKA: Fábio, o dentro de quadra eu controlo, e sei o que faço. O fora de quadra tenho muita ajuda do Fabio Jardine, meu agente, e deixo para ele me orientar no que pode ser mais proveitoso para mim e a melhor forma que posso ajudar o nosso basquete. Sei da situação do basquete no Brasil mas sempre vou lutar para que melhore. Existem pessoas maravilhosas dentro do nosso esporte, como Roberto Dornelas, Hortência, Macau, Maria Helena, Eleninha, Samuel (Mangueira) e tantos outros que eu poderia citar aqui. Sei que todos fazendo um pouco estamos conseguindo coisas, trabalhar categoria de base, melhorar a LBF e espero que um dia seja refletido na seleção. Estou muito feliz de poder jogar pelo Sport/Recife e ter jogadoras de ponta da seleção e da WNBA do meu lado, porque o Sport/Recife é parte do Brasil hoje e não só um projeto de Pernambuco – tal qual acontece com Americana, um centro que fica mais forte a cada ano, ou Osasco na base. Prefiro olhar para esse lado e fazer o que puder, do que ficar me guiando pelos resultados negativos que temos dentro e fora de quadra. Espero conseguir muita coisa no Brasil ainda.

Sobre o blog

Por aqui você verá a análise crítica sobre tudo o que acontece no basquete mundial (NBB, NBA, seleções, Euroliga e feminino), entrevistas, vídeos, bate-papo e muito mais.