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Bala na Cesta

Raio-X do Basquete Feminino: da base ao adulto, técnicos 'ajudam' a diminuir qualidade

Fábio Balassiano

25/08/2012 12h17

Ontem acabou que não consegui dar prosseguimento ao Raio-X sobre o basquete feminino deste país, que, é bom dizer, acaba de terminar a participação no Mundial Sub-17 da Holanda vencendo a Turquia por 66-61 para ficar na décima-primeira e penúltima colocação. Pois bem, hoje é dia de continuar a dissecar o que se passa na modalidade. Falo, neste sábado, dos técnicos deste país.

NO POST QUE ABRIU A SÉRIE, ANÁLISE SOBRE A CBB

Este, aliás, é um post que poderia ser estendido ao masculino também, mas em menor escala evidentemente. No feminino o buraco, como se vê, é bem mais embaixo. Quem acompanha qualquer circuito de base (eu, por proximidade, ouço e vejo o do Rio de Janeiro e converso e tento acompanhar ao máximo o de São Paulo, o melhor e mais forte do país) sabe que há problemas gravíssimos desde a formação. Por conta da estrutura dos clubes e de uma mentalidade retrógrada de desenvolvimento de atletas (os dois juntos, misturados mesmo), treinadores acabam pensando em ganhar campeonato ao invés de formar atletas.

AQUI FALEI DE HORTÊNCIA

Não é raro, portanto, vermos meninas de 1,80m jogando apenas de pivô com 13, 14 anos, alas-pivôs de 1,75m sendo "educadas" desde muito cedo a "só" jogar de costas pra cesta e meninas com potencial técnico absurdo sendo "obrigadas" a decidir todos os jogos com mais de 15, 20 pontos desde a base. Exemplos não faltam, e quem acompanha as divisões de base do país sabe disso. Com isso, fundamentos básicos acabam sendo perdidos e conceitos essenciais para o basquete acabam sequer existindo (espírito coletivo, domínio completo de TODAS as técnicas do esporte e raciocinar/ler o jogo). As distorções, técnicas, de fundamento e comportamentais surgem, e é quase impossível corrigir isso quando a menina já é adulta (ou juvenil). E os resultados em torneios classe A nos últimos anos confirmam tudo isso, com micos bizarros (o Mundial Sub-19 de 2011 é a exceção que confirma a regra).

POR AQUI, UM POUCO SOBRE A LBF

Portanto, o nível técnico que vemos na LBF, principal campeonato adulto do país, nada mais é do que produto do que os técnicos da base fazem (ou não fazem) desde a formação. Há trabalhos bons, consistentes no país, mas a grande maioria do que se vê por aí é quase uma linha de montagem produzindo atleta da mesma maneira que se fazia há 20, 30 anos. E o basquete mudou, a forma de se entender e ensinar basquete mudou, e parece que os técnicos, principalmente os de formação, não entenderam isso. Some-se a isso tudo dirigentes ruins, que só pensam em títulos desde as categorias menores, e pais que despejam as suas frustrações de atletas nos filhos, exigindo dos rebentos desempenhos lebronianos ou bryantianos desde sempre. O resultado, obviamente, é catastrófico (insisto) técnicamente, taticamente comportamentalmente.

E TAMBÉM ABORDEI A QUESTÃO DOS CLUBES

Por isso não é de se estranhar quando se olha Luiz Cláudio Tarallo como técnico da seleção brasileira. Ele é o microcosmo, uma redução, de quase todos os técnicos do país. Conformado, passivo, achando que tudo que se faz aqui está de bom tamanho, Tarallo representa muito bem o estado das coisas em sua classe. Ele treinou sempre na base (lembremos: sua primeira equipe adulta em torneios que não regionais foi justamente a seleção brasileira em uma Olimpíada – e isso é surreal, sabemos), algumas das meninas com graves problemas de formação técnica passaram pela sua mão (não vou nem citar nomes) e métodos de ensino que ele utiliza não são mais aproveitados no jogo de alto nível (é só rever os jogos da seleção feminina em Londres ou checar as colocações dele, Tarallo, em Mundiais de base). Falhas constantes de raciocínio de jogo, entendimento do que se passa em quadra e técnica completamente mal treinada são constantes quando se olha para quase todos os times femininos deste país – da base ao adulto.

Antes da conclusão, um fator importante merece ser destacado. Se não há muita renovação nas pranchetas (também um fato), nomes experientes e que poderiam contribuir muito para o basquete feminino foram solenemente e inacreditavelmente descartados da modalidade de tempos pra cá. Gente boa, gente inteligente, que fez a modalidade crescer neste país acabaram ficando no limbo, na memória apenas. Por que não usar Sergio Maronezes, dínamo que ajudou demais na seleção campeã mundial de 1994? Por que não utilizar Maria Helena Cardoso (foto) como uma espécie de consultora-técnica? Onde estão Antonio Carlos Vendramini, Miguel Angelo da Luz, Eleninha, Mila Rondon, Paulo Bassul e tantos outros capacitados que não em uma quadra de basquete para ensinar a essa garotada?

É triste demais, mas o basquete feminino atual lembra um pouco do Mito da Caverna, de Platão (aqui). Se esconde em suas próprias trincheiras, com medo do novo e dando as costas aos que já fizeram tanto pela modalidade. Técnicos são professores, educadores, e hoje em dia eles certamente não passam, ou não sabem passar, corretamente o dever de casa para as meninas que começam no esporte. Como num dominó, os buracos se acentuam com o tempo e as falhas ficam ainda mais gritantes. Lembremos: resultados esportivos são meramente reflexos do que se produz nas categorias de base de um país.

Que tal os técnicos discutirem um pouco sobre isso também? Já passou da hora, não?

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